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Indústria da Defesa “tem de ser ouvida” antes da assinatura de contratos, realça presidente do AED

José Neves, responsável pelo cluster da Defesa, considerou, na conferência do JE e da EY, que os investimentos previstos no setor pelo OE2026 são essenciais e vinculam uma verdadeira alteração do paradigma. Mas há procedimentos que é preciso evitar para que os objetivos sejam atingidos.

José Neves, presidente do AED, Cluster Português da Aeronáutica, Espaço e Defesa, está convicto que o Orçamento do Estado para 2026 tem todas as condições para ser aquilo que o setor da Defesa precisa não só para se desenvolver, mas também para atingir os objetivos que assumiu internacionalmente – desde logo no quadro da NATO.

Mas, antes de comentar essas condições, quis deixar um testemunho, que se surgiu de uma viagem recente aos Estados Unidos: o mundo está bem mais próximo de uma guerra de largo espectro “que aquilo que se pensa na Europa”, não apenas devido à invasão da Ucrânia por parte da Rússia, mas também porque as autoridades norte-americanas estão convencidas que a China acabará por intervir militarmente em Taiwan – e até já têm uma data. “A situação é mais grave que aquilo que se pensa em Lisboa. Não é uma questão circunstancial” – o que implica uma urgência nos investimentos em Defesa. Mas, ressalvou, “mais que o dinheiro aplicado na Defesa é a forma como ele é aplicado” que importa.

José Neves tem consciência de que “60% dos gastos em Defesa são salários. A primeira prioridade foi atrair pessoas para o exército. Há pouca atratividade, mas, uma vez ultrapassada essa prioridade e estabelecido um programa de rearmamento à escala europeia, os investimentos têm de seguir outro curso. “Há um cliente que é o Estado, há uma lei de programação militar que foi feita em 2020-23 que não tinha o objetivo dos 3,5%” do PIB em investimento na Defesa. Ora, o novo quadro de prioridades implica uma nova visão que é preciso colocar no ativo.

Até porque, recordou, “Portugal requisitou o mecanismo SAFE – que sai fora do défice orçamental – e está a negociar 5,8 mil milhões para aquisições, investimento e manutenção”, recordou José Neves – um nível de investimento que o ministro da Defesa, Nuno Melo, já havia comentado numa conferência anterior do JE.

Num contexto em que “não existe capacidade de defesa” na Europa – como cerca de 80% do que se gasta a vir principalmente dos Estados Unidos – é preciso ter em conta que, apesar de tudo, disse, “a Indústria portuguesa é muito diferente de 2004, quando se compraram os submarinos”. “Neste momento estamos a fazer uma aeronave – tem foco nas exportações, o target é global – estamos a desenvolver satélites, drones” e toda uma capacidade tecnológica bem diferente do que sucedia há duas décadas atrás, altura em que pouco mais havia que uma fábrica de munições. Não é por acaso, disse, que “existindo esta capacidade industrial, os aviões da Boeing, da Embraer, da Airbus, todos têm componentes fabricados em Portugal. E é essa vertente, a participação em cadeias de abastecimento robustas e competitivas – mesmo que evidentemente não lideradas pela indústria portuguesa – que o OE2026, ao fazer crescer substancialmente o financiamento do Ministério da Defesa, vai induzir.

Mas José Neves lembrou os diversos impedimentos que podem colocar em causa o projeto em termo da Defesa. Nomeadamente os concursos públicos que são lançados entre fornecedores e que acabam quase invariavelmente em providências cautelares que bloqueiam todo o sistema. A hipótese é a venda à NATO (que tem uma espécie de central de compras) mas as propostas vencedoras dos concursos lançados são invariavelmente as que oferecem melhor preço. As empresas portuguesas não têm dimensão para competir nesse segmento.

E, nesse quadro, deixou um recado ao Governo: “é imprescindível que, antes da assinatura dos contratos, seja obrigatório a cadeia de fornecimento das empresas portuguesas ser ouvida”.