Quando a ideia de criar o primeiro Time Out Market começou a ganhar forma, no início da década passada, foi preciso bater a muitas portas para que pudesse tornar-se numa realidade. O grupo fundador — uma empresa portuguesa de media e um franchisado do grupo Time Out, em Londres — do qual Ana Alcobia faz parte, ouviu muitas recusas, mas logo que o primeiro “sim” chegou... o negócio nunca mais parou de crescer. “Nessa altura, a aposta numa zona como a do Cais do Sodré era de tal forma louca que houve muita gente que nos aconselhou a desistir. Pela dimensão do investimento necessário – sete milhões de euros –, mas essencialmente por ser uma zona quase abandonada da cidade”, recorda Ana Alcobia.
A distinção como Personalidade do Prémio Nacional de Turismo 2025, a única categoria proposta exclusivamente por nomeação do júri, anunciado esta semana, confirma o plano inicial: uma visão arriscada pode ser certa e transformar bairros inteiros.
O Time Out Market Lisboa, o primeiro de todos, inaugurado em 2014 no mercado da Ribeira, um edifício classificado como Imóvel de Interesse Público, deu um novo fôlego àquela zona de Lisboa.
“Transformou-se no bairro onde ninguém queria morar para passar a ser uma das localizações com o metro quadrado mais caro da cidade. Agora, todos os novos restaurantes querem abrir na rua de São Paulo que era nada mais nada menos que a rua dos novos ‘loucos de Lisboa’ quando aqui chegámos.”
Pelo mercado passam cerca de quatro milhões de visitantes por ano, “por limitações de espaço e por respeito pelo edifício que preservamos como uma ourivesaria”, sublinha a diretora-geral do Time Out Market – 70% são estrangeiros e 30% são portugueses, a maioria residente em Lisboa. Entre marcas, restaurantes e espaços comerciais são mais de trinta, incluindo chefs com estrelas Michelin. “Tudo é bom... são os melhores de Lisboa que ali estão e é esse o segredo que nos mantém cheios”, diz,
Um ano depois da abertura, o Time Out Market foi comprado pelo grupo Time Out. “Foi essa aposta do grupo internacional que nos permitiu ir tão longe. Nunca teria sido possível sem eles.” Desde então, já abriram mercados em 13 cidades pelo mundo — EUA, Dubai, África do Sul, Espanha, e outras estão previstas, como para o Canadá e Hungria — e mais um em Portugal, em maio de 2024, no Porto. “É uma relação de enorme respeito pelo trabalho que foi cá desenvolvido e com o aproveitamento de empresas portuguesas que trabalham connosco passaram a fazer parte do Time Out Market abertos pelo mundo inteiro. Em praticamente todos os mercados há mesas e cadeiras de Paços de Ferreira, algodões e azulejos portugueses.”
O mercado do Porto, que fica na ala sul da Estação de São Bento, um edifício classificado, inserido numa zona património da UNESCO, demorou por esse motivo oito anos a ficar concluído. O projeto de recuperação é do arquitecto Eduardo Souto Moura, que já valeu dois prémios nacionais de reabilitação e reconstrução de comércio. “O Time Out Market Porto abriu já numa fase diferente da cidade, mas com o maior número de estrelas Michelin no interior de um food hall em todo o mundo. Mas houve a preocupação de ir buscar clássicos como a Inês Diniz, da Casa Aleixo, ao mesmo tempo que temos menus Michelin à sexta-feira a 35€.”
Os reconhecimentos que o Time Out Market tem recebido colocam também uma responsabilidade para o futuro, desde logo para garantir o equilíbrio entre turismo e qualidade de vida para quem vive nas cidades. “Foi muitas vezes o dinheiro internacional que revitalizou a baixa das nossas grandes cidades, que estavam amplamente abandonadas. Foi, aliás, de algumas visitas como turistas que alguns investidores fizeram investimentos em Portugal. O que não pode acontecer é perdermos a nossa autenticidade com isso. E aí há muito a fazer, na questão da habitação, um problema muito complexo.”
Ana Alcobia é a rainha do turismo em Portugal
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O Turismo de Portugal escolheu a líder do Time Out Market como a figura mais destacada do ano. Só em Lisboa recebe quatro milhões de visitantes; quatro vezes mais do que os Jerónimos.