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Valor multiplica-se por 34 e Portugal entra no radar global

O ecosistema português está em expansão, mas ainda tem caminho para fazer. Precisa de captar mais investimento internacional e capacidade de iniciativa para cumprir o seu desígnio, que vem da história.

O valor de mercado das startups portuguesas da economia azul cresceu de forma exponencial entre 2020 e 2025: passou de 47 milhões de euros para 1,6 mil milhões, um salto de 3.400% que ilustra a transformação acelerada de um setor ainda incipiente há meia década. O crescimento é, em grande parte, explicado pela ascensão da Tekever, empresa tornada famosa pelos drones, mas que desenvolve tecnologia dual-use aplicada ao oceano, que sozinha concentra 1,2 mil milhões de euros da avaliação. Mesmo descontando este “outlier”, o ecossistema regista um avanço de dez vezes, para 400 milhões de euros — um ritmo de expansão inédito na economia portuguesa.
O mar pode tornar-se um motor de crescimento económico sustentável, comparável ao turismo ou à indústria exportadora. Como? “Criando-se uma nova geração empresarial que use o mar como um ativo territorial essencial para a sustentabilidade e autonomia estratégica da nossa segurança alimentar, energética e comercial, e que ao mesmo tempo regenere a capacidade da sua função como regulador climático do nosso planeta”, diz ao Jornal Económico Ruben Eiras, secretário-geral do Fórum Oceano.
O país conta hoje com 76 startups listadas no Hub Azul Dealroom, uma base de dados criada pelo Fórum Oceano, cluster do mar reconhecido pelo Governo português como entidade gestora da economia azul. É uma rede de 173 membros, que representa mais de 13 mil empregos e um volume de negócios de cinco mil milhões de euros. 70% dos associados são empresas, o que confirma a vocação empresarial e privada do cluster, embora apoiada por fundos europeus, nomeadamente o Fundo Europeu de Investimento, em conjunto com players como a Indico Capital Partners, a Faber ou a Ocean 14 Capital.
As cadeias de valor que mais impulsionam este crescimento são a Bluetech & Observação do Oceano (robótica, digital e aplicações de duplo uso), a aquacultura, as energias renováveis oceânicas e a biotecnologia azul. No primeiro trimestre de 2025, só a fileira Bluetech duplicou de 600 para 1.200 milhões de euros, tornando-se a locomotiva da transformação. A construção e transformação naval ultrapassou a barreira do milhar de milhão, enquanto a gestão da água e os portos & shipping seguem com investimentos próximos de mil milhões de euros, muito apoiados em soluções de descarbonização e digitalização logística.
O setor beneficia também da dinâmica de internacionalização: o Porto de Sines está a desenvolver corredores de green shipping com Roterdão, Duisburgo, Pecém, Tete e Halifax, enquanto Leixões investe em energia a partir de ondas e em soluções de quebra-mar regenerativo. O estaleiro da Lisnave posiciona-se como o primeiro “green shipyard” europeu, apostando em tecnologias de eficiência energética e velas rígidas. Empresas emergentes como a Sun Concept exportam 80% da produção de embarcações solares, ao passo que casos mais tradicionais, como a Comur, atingem 10 milhões de euros de vendas apenas com a loja em Nova Iorque.
“Todos têm muito potencial de crescimento, como mostram os últimos dados do Hub Azul Dealroom sobre o nosso ecossistema de startups – têm é de ter o modelo de negócio certo e o posicionamento bem definido na cadeia de valor”, diz Ruben Eiras. Mas aponta que, dada a periferia de Portugal nos mercados de capitais, “o ideal é focar em soluções de ciclo de inovação curto, como o digital (drones e sensores aquáticos, por exemplo), em biotecnologia aplicada a produtos agrícolas (fertilizante produzido a partir de algas) ou soluções de eficiência energética e descarbonização (velas rígidas para navios de transporte de mercadorias)”.
O capital estrangeiro tem desempenhado papel determinante. A japonesa Tokyo Gas investiu no projeto Windfloat Atlantic, que já ultrapassou metas de produção e atraiu 20% de financiamento desta gigante energética. Na aquacultura, a Oceano Fresco obteve um empréstimo de 25 milhões do Banco Europeu de Investimento, e a Seantia captou 24 milhões para sistemas RAS multitróficos. Estes exemplos revelam como a economia azul portuguesa está a ser integrada em cadeias globais de valor.
No entanto, a atração de mais investimento estrangeiro para a economia azul continua a ser um desafio. “O Estado tem de simplificar os licenciamentos nos diversos setores do mar, criar instrumentos de capital paciente para as startups e PME, e ser previsível na gestão dos fundos comunitários”, defende Eiras.

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