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Augusto Mateus: "Não pode haver crescimento sem investimento"

"Somos a única economia europeia que sempre investiu menos no século XII do que investiu no século XX", disse hoje o economista.

Augusto Mateus defende a necessidade de aumentar o investimento para fomentar o crescimento económico.

"No contexto europeu, com a Grécia e Itália, fazemos parte das 3 economias que menos cresceram", começou por dizer ontem o ex-ministro da Economia de António Guterres durante a Conferência Orçamento do Estado 2024 organizada pelo Jornal Económico e pela EY.

"Portugal tem um crescimento avariado, mas não há grande discussão sobre a natureza da avaria. É um sinal de que na condução da política económica em Portugal tem que se prestar mais atenção ao crescimento económico. Não pode haver crescimento sem investimento", afirmou.

"Somos a única economia europeia que sempre investiu menos no século XII do que investiu no século XX. Temos que relançar o investimento em Portugal, não há crescimento sem investimento. Há aumento da taxa de utilização da capacidade instalada quando há mais procura, mas isso não é crescimento económico, mas sim o que faz aumentar a capacidade de produzir bens e serviços de forma competitiva", sublinhou o economista.

"Há uma redução muito significativa do investimento público. Neste OE, o investimento vai permitir alcançar os 2% que contrasta com os 3,7% que tínhamos antes da crise financeira internacional. Sabemos hoje que um dos principais sacrificados da crise da divida soberana foi o investimento público", rematou o também consultor da EY.

"Temos uma inflação acumulada de 20%. Acabou o tempo da inflação zero"

Augusto Mateus alertou ainda para os riscos de desvalorizar a inflação que tem subido acentuadamente desde 2020, que arrancou com a pandemia.

"Desde 2020, quando descobrimos a SARS-CoV-2  [Covid-19] e 2024, temos uma inflação acumulada de 20%", começou por dizer hoje o antigo ministro da Economia. "Não desvalorizem, não pensem que a inflação é uma dorzinha de cabeça. 20% neste período e bastante significativo porque a capacidade de ajustar é bastante diferente, consoante as economias, atividades, os grupos sociais", afirmou alertando que o "cenário de convergência no final de 2023 é demasiado otimista: não vamos ter uma redução tão significativa em 2024, vamos ter redução significativa.

"Vamos enfrentar um período de crescimento diminuído. 2024 vai ter menos crescimento do que 2023, e vamos ter uma inflação ligeiramente menor", acrescentou o economista.

Sobre a inflação destacou que, "não é a subida dos preços, mas uma doença económica que, no essencial, reduz o poder de compra da moeda que utilizamos, retirando poder de compra às empresas e famílias".

"Acabou o tempo da inflação zero, acabou o ciclo de longo prazo de inflação irrelevante, de tal maneira que para as gerações mais novas é difícil falar de inflação. Na minha opinião, vamos entrar num planalto ligeiramente bem definido, vamos ter a inflação duradoura, mas não alarmante", sublinhou.

"Vamos pagar um preço em termos de crescimento diminuído, umas economias europeias vão ter recessão, outras vão escapar. Umas vão pagar em crescimento diminuído, e outras vão pagar em recessão, as que têm menos controlo sobre instrumentos da politica económica, as que têm maiores desafios sobre opções na economia internacional, as que tem uma especialização de atividades mais contestadas pelas fortíssimas transições em curso na economia mundial", afirmou durante a conferência.

Como explicou, a inflação tem quatro fatores: pressões pelos custos, pressões pela procura, pressões pelo estrangulamento, erros e omissões da politica monetária. E "pela primeira vez", os quatro fatores surtiram efeito ao mesmo tempo.

"Vivemos o terceiro período de criação monetária excessiva", depois dos EUA no tempo da guerra do Vietname e do período da reunificação da Alemanha.  Agora, este período foi criado depois de o Banco Central Europeu (BCE) ter injetado "cinco triliões e meio de euros com o programa de compra de divida publica, para tentar resolver o que não tinha sido resolvido da crise de 2008 e da crise de divida soberana e pressão da pandemia".

"Acumulou-se uma liquidez impressionante [durante a pandemia]: os governos despejaram dinheiro por todo o lado. Cinco triliões e meio é um valor colossalmente importante. As pessoas não podiam sair de casa, o problema não era falta de dinheiro. Este excesso de liquidez gerou uma inflação, em janeiro de 2022 com o fim do confinamento, depois com a guerra da Ucrânia e acelerada pelos alimentos, e a concertação dos produtores de petróleo para fazer subir os preços do crude", explicou.

O consultor da EY destacou que 86% da economia nacional é produção de serviços e que seu preço é "decisivo para a nossa economia. Temos uma inflação relativamente elevada em termos de serviços".