A imprevisibilidade é uma variável a ter em conta em qualquer eleição, mas as autárquicas deste domingo são mesmo um grande ponto de interrogação. O grande culpado é o Chega, partido que, em maio, se tornou na segunda maior força nacional em número de deputados, e que agora almeja ter um resultado “na mesma linha”, “mapear o país com vitórias” e conquistar “dezenas” de autarquias.
Mas conseguirá o partido de André Ventura mudar também o jogo autárquico? Quantas presidências pode conquistar?
Alexandre Picoto, administrador da Pitagórica, lembra que, segundo as 34 sondagens autárquicas publicadas, o Chega surge em empate técnico em quatro municípios - Marinha Grande, Setúbal, Sintra e Nazaré - e, portanto, existe uma possibilidade “real” de ali vencer.
No resto do país, a incógnita é grande. O administrador da Pitagórica admite que é “natural” que o Chega dispute outros concelhos além dos quatro mencionados e que a ambição de André Ventura em conquistar cerca de 30 câmaras “tem origem em dados internos tangíveis”. Só que essas sondagens “não integram o espaço mediático nem podem ser analisadas com rigor”.
Em todo o caso, adverte Alexandre Picoto, mesmo que não vença em muitos municípios, o Chega “pode alterar equilíbrios locais, ao redistribuir votos entre PS e PSD - e , em alguns casos, também entre independentes”. Isto é, “em determinados municípios, poderá retirar votos ao PSD e favorecer o PS; noutros, desviar votos ao PS e abrir caminho à AD; e em alguns, ainda, reconfigurar equilíbrios onde há fortes candidaturas independentes”.
Nas últimas autárquicas, em 2021, o Chega elegeu 19 vereadores, e passou a marcar presença em sete distritos, mas falhou o objetivo de se tornar a terceira força autárquica e não conseguiu nenhuma presidência de câmara. De lá para cá, tudo mudou. Os 60 deputados conquistados em maio insuflaram o partido que vai agora a votos nos 308 municípios do país.
Sendo hoje um partido nacional, “é previsível é que a presença do Chega nas autarquias aumente bastante, em todos os órgãos autárquicos – assembleias, vereações e, provavelmente, nas presidências de câmara”, aponta ao JE José Almeida Ribeiro, da Aximage.
Contudo, e embora o sistema partidário seja agora constituído por três forças dominantes, o especialista avisa que é preciso cautela nas análises. Legislativas e autárquicas “não são comparáveis”. Por vários motivos. Desde logo, “porque os resultados estão muito dependentes de candidatos e de as pessoas conhecerem os candidatos”. E o Chega, sendo um partido recente, é o que maior número de outsiders tem. Além disso, é preciso recordar o caso do Bloco de Esquerda, que chegou a ter 19 deputados no Parlamento, na realidade, isso nunca se traduziu em implantação local.
Mas André Ventura segue confiante e diz ser “impensável” ficar com menos câmaras do que os comunistas, que atualmente presidem a 19 câmaras, ou do que o CDS, que tem seis. Sobre a CDU (PCP/Verdes), o responsável da Aximage recorda que o declínio nacional é uma coisa, a implantação local é outra. “Não prevejo que o PCP venha a ter resultados especialmente catastróficos”, opina, assinalando que estas eleições são aquelas em que “todos podem dizer que venceram”. “São 308 eleições. As autárquicas têm essa beleza”.
O politólogo José Palmeira frisa a mesma particularidade. Na noite de domingo, “todos poderão cantar vitória”.
“O PCP, se não descer muito, vai dizer que resistiu; o Chega, se conquistar uma câmara, vai dizer que passou de zero para uma; o PSD, se ganhar as grandes cidades, vai dizer que é uma grande vitória porque a população dos grandes centros está com o partido e com o Governo; e o PS, se continuar o partido com mais autarquias também vai dizer que é uma vitória”, antecipa o professor da Universidade do Minho.
Chega vai alterar equilíbrios locais, mas até que ponto?
André Ventura elevou a fasquia e quer um resultado “na mesma linha” do que teve há cinco meses. Num sistema partidário agora tripartido, poderá “alterar equilíbrios locais” e, de acordo com as sondagens publicadas, tem reais hipóteses de disputar quatro municípios - Marinha Grande, Nazaré, Sintra e Setúbal. Mas a ambição do Chega é muito maior.
