Conta a autora no site da editora nova-iorquina New Directions que, enquanto trabalhava neste livro, a nave não tripulada Cassini ardeu ao entrar na atmosfera de Saturno; o templo de Baal, em Palmira, foi destruído pelo ISIS; um terramoto em Katmandu levou à derrocada, pela segunda vez, da Torre Dharahara; o lago guatemalteco de Atescatempa secou; um arquivista de uma biblioteca de Nova Iorque encontrou uma madeixa de cabelo grisalho de George Washington; descobriu-se o álbum “Both Directions at Once”, do saxofonista John Coltrane; foi identificado o mais antigo alfabeto do mundo, em tábuas de pedra com 3.800 anos; Mahendraparvata, a primeira capital khmer foi descoberta perto dos templos de Angkor Wat, no Camboja.
Misturando autobiografia e história, esta magnífica coleção de textos entre a ficção e o ensaio oferece ao leitor uma série de profundas reflexões sobre os fenómenos da decomposição e da perda. Em cada uma destas preciosas peças narrativas, Judith Schalansky apresenta uma realidade irremediavelmente perdida para o mundo, mas cujas fronteiras, entre a presença e a ausência, se tornaram tão ténues que se confundem entre si.
A paradisíaca ilha de Tuanaki, supostamente parte das ilhas Cook; o tigre-do-cáspio, ou tigre-persa, espécie dada como extinta nos anos 1960; a villa Saccetti, em Roma, desenhada por Hubert Robert, aficionado de Piranesi e de ruínas; os poemas de Safo – de que se conhecerão apenas 7% –, que a dado momento terá fugido de Lesbos para Siracusa, mas regressado sete ou oito anos depois; os pensamentos de uma Greta Garbo envelhecida, dividida entre trocar Nova Iorque pela Califórnia ou pela Europa; um quadro perdido de Caspar David Friedrich, no qual pintara o porto da sua cidade natal, Greifswald, nas margens do mar Báltico; e mais meia de dúzia de outras histórias sobre coisas desaparecidas, destruídas ou simplesmente esquecidas, que se perderam para sempre.
Animais, porções de terra, objetos e construções humanas que vivem agora uma espécie de não-existência, dependentes da imaginação ou da memória para serem resgatados de volta ao presente.
Tendo nascido na ex-RDA, não é de estranhar que a perda e as suas consequências sejam uma presença constante na escrita de Schalansky. Mas, como se refere no início deste texto, a autora, que agora trabalha numa prestigiada editora berlinense, também está atenta ao que vai sendo descoberto. A esta apreciável curiosidade intelectual acrescem a ironia, o estilo elegante, a intensidade, uma portentosa atenção aos pequenos detalhes e uma enorme capacidade de contar histórias.