As demoras nos pagamentos a fornecedores são dos maiores entraves a condicionar a atividade das empresas europeias, contribuindo para um em cada quatro falências e gerando custos anuais estimados em 275 mil milhões de euros. Um quadro que precipitou a discussão de alterações na legislação sobre estas relações comerciais. As reações dos empresários não são, para já, as mais favoráveis.
As mudanças no novo regulamento, propostas pelo Parlamento Europeu, reduzem o prazo para liquidação de faturas entre empresas de 60 para 30 dias, embora este prazo seja extensível caso ambas as partes concordem. No caso de sectores específicos considerados ‘sazonais’ ou de ‘bens de baixa rotatividade’, como o dos livros, por exemplo, o prazo pode chegar a 120 dias. Caso a regulamentação seja aprovada (o assunto será revisitado na próxima legislatura europeia), as microempresas terão um ano adicional para se adaptarem a esta legislação.
Estas alterações surgem depois de anos de avisos e apelos, com a Plataforma Multissectorial contra os Atrasos de Pagamento (PMcM) a desempenhar um papel chave na pressão a Bruxelas.
A flexibilidade, contudo, termina aqui. Nas relações entre Estado e empresas, o prazo de 30 dias é absoluto e não-negociável. No caso de Portugal, por exemplo, o ano passado fechou com uma dívida do Estado a fornecedores de 479,8 milhões de euros, uma redução de 820,1 milhões de euros em dezembro face ao mês anterior conseguida sobretudo à custa do sector da saúde – onde se registaram prazos médios de pagamentos de 178 dias, quase o triplo do limite.
Para transações entre empresas em que o prazo seja violado, haverá lugar automaticamente a juros de mora, que serão calculados com base na taxa diretora do Banco Central Europeu (BCE) acrescida de um spread de 8 pontos percentuais (p.p.); além disto, serão criados mecanismos de reporte e acompanhamento como o Observatório Europeu para os Pagamentos Tardios, de forma a assegurar o cumprimento da legislação. Os juros passam agora a ser obrigatórios, outra mudança em relação ao atual paradigma, em que o fornecedor pode dispensar esta compensação ou renegociar o juro com o devedor.
Segundo a Comissão Europeia, a constituição de mecanismos nacionais de monitorização e reporte pode representar encargos entre 70 milhões e 105 milhões de euros anuais. Lembram os críticos que estes valores deixam de estar disponíveis para investimento em áreas críticas como o clima ou a digitalização, em linha com as prioridades de Bruxelas. Por outro lado, a competitividade sairá reforçada, argumenta, dado que as empresas terão mais fluxo de caixa disponível, maior previsibilidade e custos financeiros menores.
Já o Conselho da Europa defende-se sugerindo que as coimas geradas com as alterações podem ajudar a financiar a criação destas instituições.
Para Jorge Pisco, presidente da Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas (CPPME), esta era uma realidade que necessitava de resolução há já algum tempo.
“Os prazos têm de ser rigorosos. As empresas estarem a endividar-se para suportarem encargos e a sua atividade, para darem resposta e fornecer serviços a terceiros é uma situação que não é viável”, aponta, lembrando a importância destes fluxos na tesouraria das PME. A confederação apela sobretudo à simplificação das regras, temendo um acréscimo de complicações com a proposta de alteração.