Os negócios de venda direta ao público, que abrangem os suplementos alimentares da Herbalife ou os cremes da Oriflame, tiveram um ímpeto no primeiro ano da pandemia, registando um crescimento de 13,9% na faturação em Portugal, em termos homólogos, para 238 milhões de euros. Impelido pela vaga de despedimentos e de estabelecimentos comerciais encerrados, o número de revendedores (empresários em nome individual que fazem a distribuição dos produtos) também aumentou: 12% entre 2019 e 2020 para 230.900.
A presidente do Instituto Português de Venda Direta (IPVD) explica que, curiosamente, os produtos de bem-estar tiveram maior procura no primeiro ano da pandemia e, como as reuniões caseiras para vendas passaram a livestreaming nas redes sociais e demonstrações online, este tipo de empresas ganhou outra projeção - o que aliás é comum em períodos de crise económica. Perante um cenário de recuperação, Gertrudes Soares antecipa um 2022 mais “desafiante” e, provavelmente, com “abrandamento”.
“Por norma sou muito otimista, mas ao ver este final de ano, como abrandou um pouco mais, 2022 talvez vá exigir-nos ainda mais reinvenção. Nalgumas empresas vemos que estão a entrar no modelo híbrido, com eventos presenciais e vendas online para aproveitar o melhor dos dois mundos. O online tem uma abrangência que é impossível alcançar com o presencial, mas o presencial é muito importante, porque as pessoas continuam a querer - acho que neste momento até querem mais – estar umas com as outras”, afirmou, em entrevista ao Jornal Económico (JE). “O sector da venda direita é muito pouco compreendido. Ainda há, sobretudo, muita falta de informação, que leva as pessoas a terem uma má imagem.
Eu sei que estas coisas de, muitas vezes, confundirem a venda direta com [o esquema de] pirâmide é por falta de informação. Não tem nada a ver. Nós somos, obviamente, um método de venda legítimo”, defende a presidente do IPVD.
A primeira empresa de venda direta no mundo foi a Avon, no final do século XIX. Desde então, a venda através de catálogos – que caem nas mãos dos consumidores por causa de familiares, amigos ou conhecidos – tem sido cíclica, recebido críticas, sentido adesão e entendimento, em parte porque surgiram empresas em Portugal com a mesma estrutura laboral que ajudaram à perceção, como a Uber ou a Glovo, com os seus motoristas e estafetas independentes.
“Tenho vindo a observar que há uma maior compreensão. Já não há aquele bicho-papão de: «O que é isso? O que é que vocês fazem? Os distribuidores são empregados das empresas?». Percebo que seja confuso porque são vendedores mas não são empregados das empresas. Critica-se que uns ganham sobre os outros mas em qualquer sistema temos sempre uma hierarquia e aqui não deixa de ser diferente. As pessoas só ganham se fizerem alguma coisa, portanto, não há parasitismo, como costumo dizer. Para ganhar alguma comissão sobre as pessoas que fazem parte da organização (se for distribuidor) tenho de estar ativo, fazer vendas. Nunca há aproveitamento do trabalho dos outros sem ter que fazer nada”, afirma Gertrudes Soares.
Fundado em 2001, o IPVD é constituído por cinco empresas - Herbalife, Oriflame, Mary Kay, Amway e R HealthandBeauty (a Tupperware e a Avon também fizeram parte da fundação, mas afastaram-se por motivos de estratégia global) – e faz parte da Federação Europeia de Associações de Venda Direta (SELDIA) e da Federação Mundial de Associações de Venda Direta (WFDSA). Segundo os dados europeus, à frente de Portugal, só o Reino Unido (45%), a Irlanda (23,3%) e a Eslovénia (16,4%) tiveram um crescimento superior no volume de negócios destas empresas no ano passado. Além da questão dos trabalhadores independentes no marketing de rede – onde se inserem estas vendas - ser hoje mais compreendida, Gertrudes Soares acredita que por trás está também a mudança de mentalidade da geração Y, que cada vez mais querem ter o seu próprio emprego e serem os seus próprios patrões. “Isto é uma maneira excelente de o fazer. Ainda por cima tem um investimento baixo. Quando se entra num negócio de venda direta tem de adquirir alguma informação, um pacote para experimentar o produto da empresa, mas não são mais de 50 euros de investimento médio inicial”, diz a líder do IPVD.