Há uma guerra aberta em Espanha entre o BBVA (que lançou uma Oferta Pública de Aquisição hostil) e o banco visado Sabadell. A operação anunciada nesta quinta-feira não agrada à administração do Sabadell nem ao Ministro da Economia espanhol. Mas é uma operação de mercado e por isso a resposta cabe aos acionistas e aos reguladores bancários, de mercado (ambos os bancos são cotados) e concorrência.
Porque lançou o BBVA uma OPA hostil ao Sabadell?
O banco espanhol BBVA lançou esta quinta-feira uma oferta pública de aquisição (OPA) sobre o Banco Sabadell no valor de 12 mil milhões de euros, que é dirigida diretamente aos acionistas, depois de o Conselho de Administração do Sabadell ter rejeitado a proposta de fusão.
Quais os argumentos do Sabadell?
O Banco Sabadell rejeitou uma abordagem do Banco Bilbao Vizcaya Argentaria para iniciar negociações sobre uma aquisição, porque com base na avaliação detalhada da proposta, "o Conselho de Administração concluiu que ela não atende aos melhores interesses do Banco Sabadell e de seus acionistas e, portanto, rejeitou a proposta do BBVA”, disse Sabadell num documento oficial,
Isto é, a administração liderada por Josep Oliu considera que a proposta subavalia significativamente o projeto do Banco Sabadell e as suas perspectivas de crescimento como entidade independente.
O Banco Bilbao Vizcaya Argentaria já disse que não tem margem para melhorar os termos financeiros da sua proposta de fusão com o Banco de Sabadell.
Há diferenças entre a proposta de fusão amigável e a OPA?
Os termos da oferta hostil são praticamente os mesmos da oferta que foi apresentada e rejeitada pelo Conselho de Administração do Sabadell.
O segundo maior banco espanhol em valor de mercado está a oferecer uma relação de troca de uma ação BBVA recém-emitida por cada 4,83 ações Sabadell, o que traduz um prémio de 30% sobre os preços de fecho de 29 de abril.
Há uma exceção importante, que o facto dos três lugares no conselho de administração oferecidos pelo BBVA já não fazerem parte da oferta, o que significa que não haverá membros do conselho de administração do Sabadell na nova entidade.
Com quanto ficam os acionistas do Sabadell se a OPA tiver sucesso?
Se a operação se concretizar como previsto, os acionistas do Sabadell terão uma participação de 16% na instituição resultante da fusão.
Qual o calendário da operação?
O BBVA, assessorado na operação pelo JP Morgan SE, UBS Europe SE, Rothschild & Co, Garrigues e a DWP, prevê apresentar à CNMV o pedido de registo da OPA, acompanhado de um projeto de exposição de motivos e dos restantes documentos complementares. O prazo previsto é “a primeira metade” de um prazo máximo de um mês a contar da data em que a decisão de formulação da oferta tenha sido tornada pública.
Os próximos movimentos desta operação envolvem o facto de no próximo mês o próprio BBVA ter de oficializar a apresentação da oferta pública de aquisição perante a CNMV, que deverá aceitá-la e autorizá-la, e para isso necessita da aprovação do Banco Central Europeu ( BCE). Além disso, o BBVA deverá notificar previamente a Comissão Nacional de Mercados e Concorrência (CNMC) de que irá avançar com esta oferta pública de aquisição.
Uma vez autorizada pela CNMV, esta oferta pública de aquisição decorrerá em paralelo com os relatórios e análises a efetuar pela CNMC no que se refere ao grau de concentração desta operação.
Os jornais espanhóis dizem que seria precisamente neste ponto que o Governo poderia intervir para vetar a operação hostil do BBVA para a aquisição do Banco Sabadell.
O banco de origem basca terá de iniciar este processo que provavelmente durará mais de seis meses e, como consequência, poderá prolongar-se até ao próximo ano de 2025.
O que é preciso para que a OPA tenha sucesso?
A oferta está condicionada à obtenção de mais de 50,01% do capital social do Banco Sabadell. O BBVA procura agora que os acionistas do banco de raiz catalã vendam a sua posição
Muitos dos acionistas do Sabadell coincidem com a presença no capital do BBVA. São, por exemplo, fundos de investimento como o BackRock e o Vanguard. A gestora de ativos americana BlackRock, com 3,6%, é a principal acionista.
Quem está contra a operação?
Para além da administração do Banco Sabadell, também o Ministro da Economia espanhol, Carlos Cuerpo, alertou que a união de ambos os bancos significaria um aumento do nível de concentração “que poderia ter um impacto negativo no emprego e na prestação de serviços financeiros”.
O Ministério da Economia disse que “um nível excessivo de concentração introduziria um risco potencial adicional para a estabilidade financeira”, citando declarações do governador do Banco de Espanha.
Além disso, o Governo entende que a operação afetaria também a coesão territorial devido à presença destas entidades financeiras no território.
“Espanha tem atualmente um sistema financeiro forte e solvente” que deve ser mantido “sólido” para que “continue a contribuir para o crescimento da nossa economia e para a agenda de inclusão financeira e proteção do cliente”, defende o governante espanhol.
Segundo os media espanhóis também vários governos regionais, os sindicatos e o Foment del Treball estão contra. Enquanto o BBVA fala de uma oferta "extraordinariamente atrativa", a associação patronal catalã afirma que os grandes prejudicados seriam as PME.
O Governo opõe-se “tanto na forma como no conteúdo” e considera que a operação “introduz potenciais efeitos nocivos no sistema financeiro espanhol”.
O ministro da Economia garantiu que o Governo “tem a última palavra ao autorizá-lo”, enquanto a Primeira Vice-Presidente e Ministra das Finanças, María Jesús Montero, já anunciou esta quinta-feira que o vetaria.
Mas é realmente assim? Pode o Governo impedir a OPA?
Não. Porque é uma operação de mercado. Então em que momento entra o Governo em jogo? De acordo com a Lei da Supervisão Bancária espanhola, a intervenção do Executivo ocorreria quando o BBVA decidisse fundir o Banco Sabadell após a sua aquisição.
Segundo a lei espanhola, “caberá ao Ministro da Economia e Competitividade autorizar a fusão, cisão ou transferência global ou parcial de ativos e passivos em que intervenha um banco, ou qualquer acordo que tenha efeitos económicos ou jurídicos análogos”.
A reforma legislativa da Lei de Supervisão Bancária introduzida pelo Governo introduziu um mecanismo de supervisão das operações estratégicas entre instituições financeiras que, atualmente, se traduz na atribuição da última palavra ao Ministério da Economia. Concretamente, a décima segunda disposição adicional desta lei (Lei n.º 10/2014, de 26 de junho, relativa à regulação, supervisão e solvabilidade das instituições de crédito) estabelece que "compete ao Ministro da Economia e da Competitividade autorizar as operações de fusão, cisão ou transferência global ou parcial de ativos e passivos que envolvam uma instituição bancária, ou qualquer acordo que produza efeitos económicos ou jurídicos semelhantes aos referidos".
A mesma disposição acrescenta que "para estes efeitos, e previamente à concessão da autorização", será solicitado um relatório ao Banco de Espanha, ao Serviço Executivo da Comissão de Prevenção do Branqueamento de Capitais e Delitos Monetários, à Comissão Nacional do Mercado de Valores e à Direção-Geral de Seguros e Fundos de Pensões.
Pode o BBVA comprar o Sabadell sem autorização do Governo?
Pode ocorrer o BBVA adquirir o Banco Sabadell, mas sem o poder fundir, e assim mantê-lo como entidade independente, como subsidiária do banco-mãe. É um procedimento que já ocorreu noutras ocasiões, como o caso do Santander e do Banesto ou o do Bankia e do Liberbank.
Mas esta é uma operação pública de troca de ações, o que parece encaminhar uma integração, pelo que não deverá ter interesse a operação sem a autorização para a fundir.
Quem tem de autorizar a OPA?
Tal como está estipulado na lei, é o Banco Central Europeu (BCE) quem toma a decisão sobre a compra de participações qualificadas em bancos da zona euro, mas fá-lo não só com base na avaliação da proposta de aquisição, mas também com base no projeto de decisão do banco central nacional, ou seja, o Banco de Espanha.
Mas também Comissão Nacional de Mercados e Competências (CNMC), a Comissão Nacional do Mercado de Valores (CNMV), e a Autoridade de Regulação Prudencial (PRA) do Reino Unido, pois o Banco Sabadell tem aqui a filial TSB.
A responsável pela autoridade da concorrência do país vizinho disse que caso o BBVA e o Sabadell retomem as negociações para uma eventual fusão, terão de assumir compromissos, conhecidos como “remédios” e admitiu que “as partes tiveram um contacto de cortesia com a CNMC na semana passada” para explicar os termos da operação, caso esta viesse finalmente a ser realizada, salientando, no entanto, que “uma fusão não significa necessariamente que haverá menos concorrência”.
Para a OPA ter sucesso é ainda preciso que pelo menos 50,01% dos acionistas do Sabadell aceitem trocar as ações, assim como terá de haver a aprovação do aumento do capital pela Junta Geral de Acionistas do BBVA (Assembleia Geral).