A ocupação de edifícios de escritórios vive um período turbulento, desde logo porque os dados do primeiro semestre revelaram uma quebra de 34% para 84 mil m2, em comparação com os 127 mil m2 do período homólogo, na cidade de Lisboa, segundo o relatório da consultora imobiliária Dils. Um dos fatores que pode estar na origem desta descida são os critérios ESG (Environmental, social and Governance), que provocam um aumento na renda, condicionando assim a mudança das empresas.
"Por muito que as empresas queiram associar-se aos critérios ESG tudo isso tem um custo. Neste momento darem o salto para um edifícios de escritórios de primeiríssima qualidade pode significar um aumento no custo de ocupação, que facilmente pode estar entre os 25% e 40%, face àquilo que estão a pagar agora, em termos de renda unitária", diz ao Jornal Económico, Fernando Ferreira, sócio da Dils em Portugal na área de imobiliário comercial.
Fernando Ferreira relembra que historicamente, a renda prime esteve um pouco acima dos 20 euros nos últimos dez anos e que atualmente, está na ordem dos 30 euros/m2, o que faz com que as empresas tenham alguma dificuldade em pagar esse valor. Como tal, sublinha que já estão a adotar vários modelos de adaptação a este cenário.
"O modelo vamos mudar para um sítio melhor, com um custo unitário por m2 mais alto, mas de maneira a que o custo global fique alinhado e onde vão ter que ocupar menos espaço e adotar medidas para promover o trabalho remoto e uma menor concentração de pessoas da empresa", afirma.
Contudo, realça que também existem empresas a querer trazer os seus colaboradores para o escritório, o que acaba por criar um problema ao nível da contratação, nomeadamente do talento mais jovem. "Se não é a primeira pergunta, é uma das primeiras. Qual é a política de trabalho de remoto da empresa? Para trazerem talento, algumas empresas têm que ceder nesse ponto", sublinha.
Perante todo este quadro Fernando Ferreira considera que os espaços de coworking estão a desempenhar um papel muito importante no setor dos escritórios. Isto porque, algumas empresas querem estar próximas desses espaços mesmo tendo a sua sede, porque o coworking permite-lhes ter uma "flexibilidade quase harmónica", de que caso sejam precisos mais m2 ou reduzirem o espaço haver essa possibilidade.
"É uma solução mais cara porque também dá flexibilidade às empresas de poderem fazer uma gestão do seu espaço de escritório de uma forma totalmente diferente", refere Fernando Ferreira.
Em relação ao investimento feito neste segmento, o sócio da Dils acredita que já se passou "a travessia do deserto", onde se dizia que os escritórios iam acabar um pouco por todo o mundo.
"Já há transações a acontecerem, há investidores interessados a analisar a aquisição de edifícios de escritórios, tanto nacionais como internacionais. Nos próximos 18 a 24 meses vamos ver muita atividade nesse setor em termos de transações", realça.
Sobre o segmento de retalho, Fernando Ferreira defende que há muita atividade no setor, em particular os centros comerciais, que demonstraram nos últimos anos ser o produto mais resiliente do mercado, o que levou a volumes de investimento significativos. "Os lojistas querem estar nos centros comerciais e os investidores querem comprar centros comerciais", refere.
Já no setor industrial logística, o sócio da Dils relembra que teve um momento em que a atratividade não esteve tão presente, quando houve a subida galopante da inflação e das taxas de juro. "Era um produto que tradicionalmente transacionava-se com yields mais baixas e quando a inflação e as taxas de juro começaram a subir, tornou-se muito difícil justificar aquisições a yields tão comprimidas", afirma.
De resto, Fernando Ferreira considera que o primeiro semestre ficou marcado, não só infelizmente, pelas guerras humanitárias, mas também por uma instabilidade criada pela guerra de tarifas. Ainda assim, assume que temos "de estar positivos", sabendo que esse positivismo pode obviamente estar altamente condicionado por qualquer movimento que possa surgir a qualquer altura.
"Qualquer coisa que tenha a ver com guerras de tarifas, significa que a vida fica mais cara para todos e há necessidade de contornar essa situação. A instabilidade para qualquer mercado, quer operacional, como investimento é o maior desafio que pode existir, porque gera desconfiança e faz com que as decisões, tanto operacionais como de investimento, possam demorar a serem tomadas", sublinha.
Escritórios são o "patinho feio" que podem gerar oportunidade a quem souber esperar
Em relação a qual dos segmentos tem um maior potencial de crescimento e investimento a curto-médio prazo, Fernando Ferreira, enfatiza que os escritórios são um produto que vai continuar a operar como no passado. "Acho que há oportunidades para quem estiver em condições de apostar e esperar que a valorização do edifício passe por uma subida das rendas e uma descida futura das rentabilidades. Neste momento, sendo o patinho feio, é natural que isso que isso aconteça", afirma.
Já no segmento de logística, Fernando Ferreira vê uma aposta muito mais de continuidade. "A logística era um setor que há dez anos não era tão sexy. Nos últimos anos, muito por força do online, passou a ser um refúgio para muitos investidores com um perfil core e conservador", salienta.
Por fim, o retalho, é visto pelo sócio da Dils, como o setor que admite ter uma rentabilidade mais alta neste momento. "Significa que poderá ser percecionado por haver mais espaço para se conseguir atingir rentabilidades mais interessantes", conclui.