Rui Costa e João Noronha Lopes preparam-se para o dia B (de Benfica), naquela que será a primeira vez que o clube elege o próximo presidente numa segunda volta. Aos 59 anos, o gestor que ocupou vários lugares de topo na McDonald's desafia o antigo internacional português de 53 anos.
O atual presidente do SL Benfica ganhou as eleições do clube encarnado, que aconteceram a 25 de outubro, mas ficou longe do resultado que precisava para ser eleito à primeira volta. O atual líder das águias acabou o escrutínio com 42,13% dos votos (32.898 votantes e 744.655 votos) enquanto o gestor João Noronha Lopes (27.109 votantes e 534.818 votos), com quem irá à segunda volta, terminou a votação com 30,26%.
Contradição: "Receitas recorde, passivo a aumentar"
Um clube que "vive em contradição evidente: é um clube que gera receitas recorde, mas que, mesmo assim, vê o seu passivo aumentar e os capitais próprios diminuir". Em entrevista ao JE, o gestor João Noronha Lopes resume nesta frase aquela que considera ser uma das principais lacunas na gestão da Benfica SAD.
Nas épocas em que foi o principal responsável pelos destinos das "águias", a direção liderada por Rui Costa contratou 49 jogadores (praticamente uma média de dez futebolistas por temporada) e gastou um total de 434 milhões de euros: uma média de 86 milhões por época. Nas receitas com jogadores, e no mesmo período, esta administração da SAD fez 710 milhões de euros em vendas mas até aí a oposição lhe aponta o dedo quando acusa Rui Costa de ter vendido, de forma prematura, o médio João Neves (que saiu para o PSG por 66 milhões de euros).
Para Noronha Lopes, "isto significa que há um problema estrutural na forma como o clube está a ser gerido: falta de controlo de custos, ausência de planeamento financeiro e decisões tomadas sem visão de médio prazo".
"Nos últimos anos, o Benfica teve os maiores encaixes da sua história com as vendas de jogadores e os prémios da Liga dos Campeões (por via do aumento dos prémios e de mudanças na forma de distribuição feita pela UEFA), mas o passivo aumentou em cerca de 100 milhões de euros. Isso não é normal nem sustentável", destaca.
E o que sugere o gestor? "A prioridade tem de ser devolver equilíbrio às contas, reduzir a dependência de receitas variáveis, como vendas e prémios europeus, e estabilizar o modelo de gestão, profissionalizando as áreas críticas. O Benfica precisa de uma estrutura financeira moderna, transparente e com reporting regular aos sócios".
Noronha Lopes quer garantir que "cada euro gasto é um investimento e não um custo. E isso faz-se com rigor, com uma estrutura executiva profissionalizada e com um Conselho Fiscal verdadeiramente independente. O clube constrói-se com o aumento de receitas". E se no entender deste empresário, o clube tem sido "gerido de forma reativa, sem responsabilização nem método, Noronha Lopes propõe três planos: "um plano financeiro para estabilizar as contas; um plano desportivo de longo prazo, sustentado e mensurável e um plano institucional para devolver ao Benfica influência e prestígio no futebol português e europeu".
Dos 500 milhões de receita à redução de 100 milhões no passivo
O antigo camisola dez das "águias" defendeu, em entrevista ao JE, que há um caminho para fazer, sobretudo no que diz respeito às receitas e à redução do passivo. Para isso, será necessária uma presença constante na Champions League.
"Há um caminho que queremos concluir: fazer do Benfica uma potência europeia consolidada, com 500 milhões de euros de receita anual, redução de 100 milhões de euros de passivo e presença permanente nas fases finais da Champions", realçou Rui Costa em entrevista.
E concretiza: "As metas de 500 milhões de receita e de menos 100 milhões de passivo resultam da conjugação de vários fatores: expansão internacional da marca e novos contratos de patrocínio globais (Emirates, Pepsi, EA Sports); crescimento do “matchday” com mais 80 mil lugares no Estádio; exploração do Benfica District, Hotel 1904 e eventos no estádio; gestão eficiente de custos (receitas a crescer 10,8% contra um crescimento de 5,6% dos custos, no anterior exercício)".
Sobre as vendas, Rui Costa realça que "o Benfica não depende de alienar os seus melhores jogadores para sobreviver, mas faz parte de um modelo responsável equilibrar desporto e economia. Vender com inteligência e reinvestir com critério é o que tem permitido manter o clube forte, competitivo e sustentável".
"O futuro mandato será o da consolidação e da execução — do Benfica District à nova BTV em sinal aberto, nos termos dos compromissos assumidos no interesse do Clube, da expansão internacional da marca à modernização total das infraestruturas", avançou Rui Costa ao JE.
Centralização: Não perder autonomia nem valor
Um dos temas mais prementes e com que Rui Costa vai ter que lidar, se for eleito, está relacionado com o dossier da centralização dos direitos televisivos: "A nossa posição é inequívoca: defender sempre os interesses do Benfica. Temos já propostas vantajosas garantidas para 2026-2028, superiores às atuais, e estamos preparados para a centralização sem perder autonomia nem valor".
Rui Costa defende que o Benfica "lidera o mercado televisivo português — representa mais de 40% das audiências e receitas do futebol nacional" e que "isso tem de ser respeitado". Assim, defenderá que qualquer modelo de centralização "assegure valorização proporcional à dimensão e impacto do Benfica, com transparência, critérios objetivos e salvaguarda dos direitos históricos do Clube".
"Se os critérios forem justos, o Benfica sairá a ganhar. Se não forem, não aceitaremos acordos que desvalorizem a nossa marca ou comprometam o futuro financeiro", conclui.
Noronha Lopes não está muito longe desta posição: "O Benfica, como maior clube português e um dos maiores da Europa, tem de liderar o processo, mas não pode ser refém dele. A minha posição é clara: a centralização só faz sentido se valorizar o todo, mas reconhecendo quem cria mais valor".
"Não podemos permitir que o Benfica, que representa mais de metade da audiência televisiva do futebol nacional, seja colocado no mesmo patamar de quem pouco contribui para o produto", conclui.