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Christian Lindner: o fantasma de Schauble de regresso às Finanças

A cartilha da economia é a mesma do ministro de Merkel, o que já levou Joseph Stiglit, Nobel da Ecomonia em 2001, a considerar o seu nome um erro para a função de ministro das Finanças.

A Alemanha prepara-se para ser governada pelo seu primeiro executivo tripartido (social-democratas, verdes e liberais) e Christian Lindner é o líder destes últimos, tendo no dia 26 de setembro passado, à noite, prestado um inestimável serviço ao bom nome do Partido Democrático Liberal: até essa noite, a das últimas eleições alemãs, a sua formação sobreviveu no pacífico meio-ambiente político germânico como uma espécie de ‘noiva de aluguer’: o FDP prestava-se a cumprir a função de agregador de quórum (lugares no parlamento, o bundestag, para toda e qualquer coligação que estivesse em perspetiva. Mas, a 26 de setembro, Christian Lindner resolveu inovar – ou mesmo mudar o paradigma das coligações germânicas que, quer fossem lideradas pelos social-democratas do SPD quer tivessem no comando os democratas-cristãos da CDU, recorriam sempre à sua prestável, barata e mais ou menos insignificante contribuição. Para espanto dos analistas alemães e diversão dos estrangeiros, o líder do FDP disse, quando já se percebia que SPD e CDU estavam próximos do empate técnico, que o seu partido devia reunir-se com o Partido dos Verdes e decidirem a quem se ofereceriam em coligação.

Contra tudo o que antes tinha sucedido e contra todas as evidências, foi isso mesmo que aconteceu. E o FDP deixou de ser a ‘noiva de aluguer’ para passar a ser uma das cabeças do casal (a três) que vai tomar conta do destino dos germânicos. E Christian Lindner, tendo-se saído airosamente do seu atrevimento político, visou bem alto: quer ser o próximo ministro das Finanças – cargo mantido desde sempre sob a alçada do partido que lidera as coligações.
A empreitada não é pequena: para chegar ao cargo – com notórias implicações no andamento das opções de política financeira e de investimentos da União Europeia em geral do Euro Grupo em particular – terá de convencer o líder da coligação, o social-democrata Olaf Scholz, a aceitar o seu nome, e o co-líder dos Verdes, Robert Habeck, a desistir de querer o mesmo.

Como se o cargo já fosse seu, Lindner, de 42 anos, já explanou em traços largos aquilo ao que vai: conservador do ponto de vista fiscal, rejeita qualquer aumento de impostos e, ortodoxo no que tem a ver com os orçamentos (será que vai concorrer com o ‘velho’ Wolfgang Schauble, um dos ‘vilões’ mais odiados pela Europa do sul?), considera o endividamento uma praga. A ver pelo histórico, Lindner pode bem ser uma versão mais nova de Schauble: há uns anos, no centro da crise das dívidas soberanas de 2008, o líder dos liberais defendeu a expulsão temporária da Grécia da Zona Euro como forma – com certeza pedagógica – de impor restrições aos desmesurados gastos do país. Como Schauble, Lindner é radicalmente contra o financiamento da dívida de países terceiros com dinheiro alemão e abomina as teorias segundo as quais uma maior integração europeia deve implicar um acréscimo de bondade da parte dos germânicos.

Do ponto de vista externo, Lindner alinha com muito gosto com os chamados países frugais da Europa do norte e do central (Suécia, Dinamarca, Áustria e Holanda, país que, apesar de o Bairro Vermelho de Amsterdão ser um dos principais cartões de visita do país, abomina os gastos em vinho e mulheres, tão ao gosto, diz, dos selvagens do sul). Ora, essa posição será importante quando (e se Lindner chegar a ser ministro das Finanças) vier a ser discutida a reforma do Pacto de Estabilidade e Crescimento, que estabelece limites estritos ao endividamento dos governos. E essa discussão vai mesmo ter de acontecer, para mal dos pecados que os portugueses vão acumulando, iludidos pelos juros pagos pela dívida externa nos últimos anos.

Está-se mesmo a ver: França, Itália e Espanha (com Portugal e a Grécia com certeza apoiando sem grande comprometimento) hão-de defender que é hora de mudar o pacto e libertar os países da rigidez dos gastos públicos; do outro lado, pode vir a estar Lindner e os seus frugais amigos a pressionarem para o regresso à austeridade.
Seria um desastre pré-anunciado. E já sinalizado: os economistas Joseph Stiglitz (norte-americano e Prémio Nobel da Economia em 2001) e Adam Tooze (britânico e professor da Columbia University) escreveram um artigo publicado na imprensa alemã em que diziam que “seria um erro conceder-lhe o seu desejo”, tendo-o remetido para uma qualquer pasta mais ‘irresponsável’, estilo modernização ou digitalização.

Com a aproximação de dezembro, mês em que haverá um novo Governo na Alemanha, os europeus logo ficarão a saber o que lhes saiu na sorte.

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