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Ajuda climática no contexto do colonialismo

A ajuda às ex-colónias portuguesas pode ser feita de muitas maneiras, uma delas é ter uma política de desenvolvimento ativa em temas emergentes e relevantes para esses países. Coisa que Portugal não tem, ao contrário da França e Inglaterra que, através das suas agências de desenvolvimento, conseguem ter uma presença e utilidade significativas nas suas ex-colónias.

Portugal poderia hoje ajudar as suas ex-colónias a resolver problemas reais, como: a criação de infraestruturas; resiliência às alterações climáticas; a criação de mecanismos que promovessem o acesso destes países aos fundos climáticos existentes; a capacitação de trabalhadores das instituições públicas, universidades, empresas e ONG em técnicas de construção, agricultura, saneamento resilientes às alterações climáticas; implementação de unidades de gestão de resíduos, entre muitos outros.

Estas ajudas podem também ser dadas através do perdão da dívida que se tem desse país: em vez do país africano estar a pagar juros e capital da sua dívida a outro estado, este estado pode optar por não receber esse valor, desde que tal seja usado em medidas concretas de mitigação ou adaptação climática pelo país, e com a monitorização do estado doador.

Existem alguns casos destes pelo mundo fora, mas são poucos. Um desses bons exemplos é português. Quando, em 2023, Portugal acordou com Cabo Verde em trocar parte da dívida do país a Portugal por investimentos que permitam a Cabo Verde uma melhor adaptação às alterações climáticas e um aumento da sua capacidade de autossuficiência energética (tão importante para a balança de pagamentos).

Se esta argumentação pode parecer utópica para muitos, a realidade diz-nos que esta é uma das conversas mais acesas e prementes que atualmente existe em algumas esferas de influência, que defendem a ideia de que o modelo de financiamento existente entre o Norte e o Sul deve ser completamente transformado, uma vez que este sistema não está a conseguir realizar o que inicialmente pretendia: promover o desenvolvimento das economias mais frágeis.

Esta fragilidade aumenta quando tomamos consciência de que África é o continente que mais vai sofrer com os impactes das alterações climáticas, sendo o continente que menos contribui para as emissões de carbono.

Parece, assim, absolutamente injusto que África não receba a ajuda necessária daqueles que estiveram na causa do problema, e que ainda lhe sejam pedidos juros por empréstimos concessionários que se destinam a fazer face a catástrofes ambientais ou a criar resiliência climática nas aldeias e cidades.

Refira-se , a propósito, que nos últimos anos os apoios na forma de Grants (donativos, subvenções) têm diminuído, e os empréstimos aumentado...

Esta necessidade de se mudar a forma como o Norte financia o Sul é reconhecida pelo Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, que afirma ser “evidente que o Quadro Comum do G20 para o tratamento da dívida falhou” e que “os últimos quatro anos foram, nada mais nada menos, do que um desastre da dívida. É imoral. É errado. Isto tem de mudar”.

Assim, e no contexto das quentes conversas acerca da importância de Portugal compensar as suas ex-colónias pelos impactes negativos que tenha gerado, seria importante olhar para o futuro e não para o passado. África precisa de soluções para o futuro, e precisa que essas soluções e esse apoio sejam dados urgentemente.

As cheias, os deslizamentos de terras, as chuvas extremas, as secas extremas são eventos que estão a aumentar a sua intensidade em Moçambique e em Angola, por exemplo. Estes eventos têm consequências imediatas na inflação, uma vez que a agricultura é destruída, as estradas ficam danificadas, os camiões demoram mais tempo a chegar ao destino, os alimentos são escassos e o preço aumenta.

Tudo isto provoca ainda mais pobreza e desigualdades sociais. E tudo isto é agravado pelo facto do Norte se ter desenvolvido numa economia baseada nos combustíveis fósseis, que provocou um aumento exacerbado de CO2 na atmosfera, alterando o equilíbrio do planeta, dando origem à existência recente de ciclones violentos no Quénia.

Deixo assim um apelo a quem tem o poder de definir a estratégia de desenvolvimento internacional de Portugal no contexto dos PALOP: identifique-se o investimento mais que merecido e que deve ser aplicado nos PALOP, para ajudar estes países a estarem mais bem preparados para fazer face aos inevitáveis desafios climáticos.

Olhemos para o futuro, olhemos para o que os outros europeus fazem, e tenhamos alguma ambição.

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