A acreditar no bondoso discurso do dr. António Costa, a bazuca é uma espécie do Milagre das Rosas versão 2.0. Em vez de pão ou rosas traz-nos transição digital e sustentabilidade. Algo semelhante à produção de framboesas e amoras de Odemira. É, claro, uma evolução empolgante face ao último grande saco de dinheiro que Bruxelas nos dispensou quando entrámos para a então CEE: cursos de formação profissional e auto-estradas em troca da implosão da nossa indústria e das pescas, ciclovias entre Lisboa e Porto, apps sobre como criar apps e cursos pós-modernos de formação profissional. Quanto a dinheiro para desenvolver um modelo económico para o país ou mesmo, piedosamente, uma indústria cultural a sério, zero. Agora que os Metallica celebram os 30 anos do seu mais celebrado disco (um pavor, convenhamos) com uma mega edição onde surgem 12 versões do tema “Nothing Else Matters”, nenhuma repetição de horrores assusta o incauto cidadão nacional. O que ocupa os neurónios da classe política é a “descentralização”, cujo marco seria a ida do Tribunal Constitucional da serenidade do Palácio Ratton para Coimbra. Nada disto tem a ver com a reposição da célebre “questão coimbrã” de 1865 entre românticos e os realistas que queriam renovar a literatura. Nesse tempo existiam alguns debates sérios. 100 pessoas, incluindo juízes, ao que parece, seriam deslocadas da pacatez lisboeta para a “província”, e assim se assistiria a uma revolução descentralizadora. Como é típico discute-se o acessório. Como mostrarão os dados dos Censos, o interior do país está cada vez mais desertificado. Nele não há rede do Estado e estrutura económica capaz de seduzir os mais jovens e competentes. A classe política confunde criar centros de riqueza criativa e económica com inventar departamentos espalhados pelo país para empregar assessores. E é aí, nessa “regionalização” bacoca, que querem gastar parte do dinheiro da bazuca.