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Escolas de condução reclamam de carga fiscal "injusta" e lamentam "desinteresse político"

António Reis, presidente da maior associação de escolas de condução do país, defende em entrevista ao JE que o Governo deve ajudar sector a combater o "dumping". Mudanças na fiscalidade e regresso do estatuto de entidade pública são essenciais para estimular rentabilidade destas empresas.

O Governo deve olhar para o sector das escolas de condução em Portugal e ajudar a resolver vários problemas que afetam a rentabilidade deste sector como é o caso do dumping, da fiscalidade (alterações no IVA e IUC) e o estatuto de utilidade pública. Esta é a convicção deixada por António Reis, presidente da ANIECA (Associação Nacional de Escolas de Condução Automóvel), a maior e mais antiga associação do sector em Portugal, em entrevista ao JE.

Atualmente, a ANIECA conta com mais de 600 associados, representando mais de 730 escolas de condução em todo o país. Conta ainda com uma vertente de formação de profissionais para o setor, tendo formado e atualizado mais de 1000 instrutores e dirigentes em 2024.

Relativamente à situação conjuntural do sector, note-se que entre 2019 e 2023 abriram falência 148 empresas: em 2020 e 2021 fecharam 38 escolas de condução em cada um destes anos pós-Covid; esse número registou uma descida em 2022 mas voltou a subir em 2023 para 32 falências no sector. Atualmente, e de acordo com números de 2023 (não estão disponíveis dados de 2024), estão em atividade 880 empresas no sector das escolas de condução.

No que diz respeito ao volume de negócio destas empresas, note-se que os anos em que se registaram mais falências no sector também coincidiram com os períodos em que a faturação desceu abaixo dos 100 milhões de euros: 2020 (93,9 milhões) e 2021 (98,4 milhões). Em 2022 assistiu-se a uma recuperação notável deste indicador para 131,4 milhões de euros sendo que, em 2023, a faturação das escolas de condução em Portugal chegou perto dos 150 milhões de euros. Não foram disponibilizados dados relativos a 2024.

Para António Reis, o ensino da condução em Portugal carece de mudanças conjunturais e estruturais já que os custos fixos para as empresas do sector são muito elevados: “Temos custos fixos muito elevados já que 86% da receita vai para o pagamento de vencimentos e fornecedores. Logo aí temos um défice e um enorme desafio”. Depois, refere este dirigente, este é um sector de microempresas e por isso, existe um “acumular de várias tarefas o que acaba por degradar a gestão destas entidades”.

Apesar de um exponencial aumento dos automóveis em circulação na via pública, o presidente da ANIECA lamenta que Portugal ainda disponha de uma estrutura “que se pode comparar com 1954”. Lamenta ainda que cerca de 20% das maiores empresas que exploram escolas de condução concentrem 78% dos ativos e 64% das vendas, um desequilíbrio no sector. Nesse aspeto, António Reis sublinha os empresários deste sector acabem por se sujeitar à pressão dos preços “entregando de mão beijada o ensino da condução aos grandes grupos”.

Depois, acusa António Reis, há o problema político, ou seja, a forma como o Governo pode ajudar um sector que é absolutamente fundamental para combater a sinistralidade rodoviária que é apelidada pelo dirigente como uma “epidemia silenciosa” (dados corroborados pelas estatísticas da Autoridade Nacional para a Segurança Rodoviária). Para este responsável, há um “desinteresse político sucessivo” no que concerne às escolas de condução: “O ensino da condução era considerado de utilidade pública mas em 1998, foi retirado esse interesse público. Isso fez grande mossa na sinistralidade rodoviária em Portugal. Temos uma injusta e elevada carga fiscal, a começar pelo IUC; no IVA, o nosso equipamento básico não é considerado (num restaurante, por exemplo, os equipamentos básicos são todos considerados). E o automóvel não é considerado em matéria fiscal”, lamenta o dirigente.

A ANIECA tem procurado sensibilizar o poder político no sentido de reestruturar a mobilidade verde: “Conduzir um veículo que presta ajuda ao condutor para iniciar a marcha, deve implicar formação. Andar com um veículo de duas rodas e uma mochila grande às costas, é algo que acarreta riscos. Conduzir em Portugal, aparentemente, não necessita de atualização”.

Com o PRR em execução, António Reis considera muito importante que o sector possa ser elegível para ter acesso aos fundos europeus, apesar das exigências legais que determinam que as empresas elegíveis devam ter uma componente de exportação: “Precisamos que o Governo estabeleça critérios de licenças de escolas de condução para não desregular o mercado e que nos ajude a acabar com o “dumping” no sector e crie o Observatório de Preços para que haja um preço indicador. No IVA dos combustíveis em que temos apenas 50% de dedução do IVA no gasóleo, ou seja se quisermos mudar de combustíveis não temos ajudas fiscais”.

De acordo com dados da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, referentes aos cinco primeiros meses de 2024, todos os indicadores agravaram em comparação com 2014: mais oito vítimas mortais (+4,7%); mais 161 feridos graves (+20,3%); mais 2.552 feridos leves (+18,5%) e mais 2.474 acidentes (+21,4%). Entre janeiro a maio de 2024, foram registados 14.658 acidentes com vítimas, 182 vítimas mortais, 1.020 feridos graves e 17.006 feridos leves no Continente e nas Regiões Autónomas.