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China desacelera e tem margem reduzida para estímulos

Apesar dos dados desapontantes do lado macro, Pequim deve manter a prioridade económica na redução da dívida, sendo duvidoso que avance com estímulos orçamentais generalizados. Já do lado monetário é expectável novo corte das taxas de juro, sobretudo dada a queda do investimento.

Os dados macro divulgados pela China esta segunda-feira geravam bastante expectativa, dados os sinais negativos que vinham surgindo da segunda maior economia mundial, e acabaram por desiludir. A possibilidade de novos estímulos monetários era quase certa e, desta feita, podem ser acompanhados de medidas orçamentais para garantir que o país não regista novo ano de crescimento abaixo do esperado e da sua média histórica. Mas nem todos os analistas antecipam um cenário do género, apontando antes à necessidade de reduzir o elevado endividamento da economia.

A China registou um crescimento de 0,8% em cadeia no segundo trimestre, o que corresponde a 6,3% em termos homólogos, dados que ficam abaixo das projeções dos mercados e analistas, dando mais motivos para preocupação quanto à sua performance este ano.

O gigante asiático estava em linha para crescer 7,3% em comparação com igual período do ano passado, mas a possibilidade de um valor mais baixo vinha a crescer com a série de dados desapontantes que vinham sendo conhecidos nas últimas semanas.

No primeiro trimestre do ano, a China havia crescido 4,5%, ou 2,2% em cadeia, beneficiando da reabertura após os trimestres mais complicados da Covid-19. Comparando o resultado em cadeia com o agora divulgado, o decréscimo no crescimento é claro.

A reabertura da segunda maior economia mundial após a pesada política de contenção pandémica gerou bastante expectativa quanto ao seu impacto interno e externo, mas o fulgor tem-se vindo a perder, com o país a braços com consumo interno em queda, exportações a recuar ao nível mais rápido dos últimos oito anos e um mercado imobiliário que continua a dar dores de cabeça.

Assim, os fracos números em cadeia refletem um consumo interno em queda, com os chineses a adiarem compras mais substanciais e a constituírem poupanças, ao passo que o investimento sofre ainda mais com a incerteza e a crise de confiança. No primeiro semestre deste ano, os depósitos chineses cresceram 18% em comparação com igual período do ano passado.

Em termos homólogos, o resultado no PIB até foi melhor do que o esperado, mas é de salientar que se regista um forte efeito base decorrente da paragem quase total da atividade na China no segundo trimestre de 2022, quando as principais cidades do país caíram num longo e musculado confinamento.

Em sentido contrário, a produção industrial até avançou mais do que o esperado, crescendo 4,4% em junho quando comparando com o mês anterior. Em cadeia, o indicador subiu 3,8%. Já no retalho, um barómetro para o consumo interno, o avanço homólogo de 3,1% ficou marginalmente abaixo dos 3,2% previstos.

Do lado do mercado laboral, a taxa de desemprego urbano até se manteve invariável, em 5,2%, mas o desemprego jovem continua a subir. A leitura de junho trouxe mesmo um recorde de 21,3%, fruto de seis meses consecutivos de subidas neste subindicador.

Prioridade à dívida

O primeiro efeito destes dados foi a queda do petróleo nos mercados internacionais, o que mostra a expectativa dos investidores: com os problemas na China, a procura global por energia irá ser impactada negativamente, levando a preços mais baixos.

No entanto, as consequências menos imediatas serão igualmente importantes: por um lado, Pequim terá de avançar com mais estímulos à economia, depois da recente descida de 10 pontos base (p.b.) das taxas de juro. Isso mesmo foi sinalizado por Luo Guoqiang, governador interino do banco central chinês, que falou em “medidas contracíclicas” em breve, sem especificar.

“Temos de estar cientes que o contexto político e económico internacional é bastante complicado, pelo que as fundações para uma recuperação sustentada doméstica ainda não estão colocadas”, afirmou Fu Linghui, porta-voz do gabinete de estatísticas chinês.

A expectativa passa, portanto, por estímulos do Governo central para colocar a economia em linha para cumprir os objetivos de crescimento este ano, que Pequim cifra em 5%. Os principais bancos norte-americanos de investimento cortaram recentemente as suas projeções para o crescimento chinês este ano, com o Bank of America a liderar no otimismo, apontando a 5,7%.

No entanto, o Governo de Xi Jinping parece ter outras ideias. Na vertente monetária, novos cortes nos juros estarão em cima da mesa, face a uma inflação nula em junho; ainda assim, as palavras de ordem são contenção e redução da dívida, depois de o rácio da dívida total chinesa (pública e privada) em função do PIB ter chegado a quase 300% no início deste ano, segundo dados da Bloomberg.

O investimento também sofre, embora só do lado dos particulares: enquanto o investimento público até cresceu 8,1% no primeiro semestre, o investimento privado em ativos fixos caiu 0,2%. Na construção, o indicador homólogo recuou 7,9%, um sinal de contínuos problemas no mercado imobiliário chinês, um foco de preocupação pelo possível contágio ao sistema financeiro.

Na semana passada, um think-tank chinês havia pedido ao Governo que avançasse com medidas avaliadas em 180 mil milhões de euros para estimular a economia. Estas incluíam vales alimentares para as famílias mais carenciadas, mutualização da dívida das regiões autónoma e províncias do país (onde se verificam rácios asfixiantes de dívida), mais cortes dos juros e mais apoio aos promotores imobiliários. Assim, uma parte dos analistas não espera medidas orçamentais por enquanto, com Pequim a colocar a tónica na redução do endividamento.