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CFP castiga Açores e elogia evolução da Madeira

O CFP alerta que o acentuar dos passivos contingentes dos Açores aliado ao "sucessivo agravamento" da dívida financeira possa elevar risco de sustentabilidade. No caso da Madeira preocupa a exposição ao turismo.

O Conselho de Finanças Públicas (CFP) levantou um conjunto de alarmes relativos ao estado das finanças dos Açores, com enfoque na dívida, no relatório publicado na passada quarta-feira sobre a evolução orçamental das regiões autónomas em 2022. No caso da Madeira o tom foi mais de elogio embora tenha chamado à atenção para a grande exposição que a Região tem ao turismo.

Os Açores levantaram um conjunto de preocupações junto do CFP a começar pela "crescente expressão" de passivos contingentes que se acentuam 2015.

O CFP teme que este fator aliado ao "sucessivo agravamento" da dívida financeira e consequentes necessidades de refinanciamento, possa gerar um 'cocktail' explosivo aos Açores, na medida em que "contribuem para elevar o risco de sustentabilidade" das finanças desta Região Autónoma.

Mas mesmo entre elogios aparecem reparos. Se a redução do défice orçamental açoriano foi positivo por outro lado o CFP refere que este "está aquém" dos níveis da pré-pandemia.

"Em 2022, os Açores apresentaram um défice de 7,7% do PIB da região, uma diminuição de 0,7 pontos percentuais (p.p) face a 2021, não obstante a quebra em 1,1 p.p. das transferências ao abrigo da Lei das Finanças das Regiões Autónomas LFRA. Para esta evolução muito contribuiu a dissipação parcial do efeito das medidas adotadas no contexto da pandemia (1,6 p.p. do PIB). Esse efeito foi contrariado pelo novo apoio financeiro do Governo Regional do Açores à SATA Air Açores, S.A que em 2022 ampliou o seu impacto nas necessidades de financiamento dos Açores (1,2 p.p. do PIB) condicionando a recuperação da situação orçamental. Removendo o impacto absoluto destes efeitos, ainda assim a região apresentaria um défice de 3,1% do PIBR, quase o dobro do verificado em 2019", diz o relatório do CFP.

O CFP acrescentou que estes desenvolvimentos levaram a que o rácio da dívida, na definição de Maastricht, atinge-se um novo máximo. "Em 2022, este indicador ascendeu a 3,064 milhões de euros, o equivalente 60% do PIB da região, um aumento de 0,6 p.p. face ao verificado em 2021", diz o relatório.

Este organismo refere que em termos absolutos, o stock da dívida aumentou 13,1%, "alimentado" por um défice orçamental que em 2022 "contribuiu para elevar" a dívida da região para 3,064 milhões de euros. "O elevado endividamento financeiro dos Açores permanece exposto aos riscos de refinanciamento da dívida", disse o CFP.

Relatório alerta para reembolsos da dívida

Outro dos avisos lançados pelo CFP esteve ligado ao perfil de reembolsos da dívida açoriana. No entender do organismo o plano de amortizações delineado pelos Açores implicam riscos elevados que no entender do CFP deveriam ser mitigados.

“O perfil de reembolsos da dívida regional (excluindo as entidades fora do perímetro orçamental) mostra que mais de três quartos desses reembolsos a realizar ao longo dos próximos 15 anos ocorrerão na totalidade na data de vencimento do respetivo instrumento (e não de forma regular ao longo do tempo). Esta situação resulta da modalidade de financiamento privilegiada assentar num único período de reembolso. Esta modalidade conduz a uma concentração excessiva de amortizações em determinados períodos, o que eleva o risco de refinanciamento da dívida em períodos de maior volatilidade nos mercados financeiros. O plano de amortização da dívida mostra que nos próximos 15 anos apenas em cinco (2031, 2033, 2034, 2035 e 2037) as necessidades de financiamento serão residuais, totalizando 35 milhões de euros (1,2% do total). Nos restantes 10 anos, o montante de reembolsos previstos somará 2,794 milhões de euros (98,8% do total). Uma situação igualmente notada no recente parecer do Tribunal de Contas à Conta dos Açores 2022, no qual sugere a necessidade de serem adotadas medidas que promovam o alisamento do perfil de maturidades da dívida, com o propósito de mitigar os riscos de refinanciamento e os custos associados”, alerta o CFP.

O impacto da SATA foi outro ponto de alerta levantado pelo relatório. Aqui é referido que a dívida global, que inclui também a dívida comercial, "aumentou para 3,108 milhões de euros (60,8% do PIB), refletindo principalmente o financiamento do défice, a assunção de dívida financeira de algumas empresas públicas regionais e a realização da operação de aumento de capital social da SATA Air Açores S.A.", referiu o CFP.

O relatório chama a atenção para um novo aumento das responsabilidades contingentes para os 2,439 milhões de euros, em 2022, (47,7% do PIB), "em resultado sobretudo das responsabilidades assumidas perante entidades públicas fora do perímetro orçamental, muito em particular as relacionadas com empresas do Grupo SATA, em processo de reestruturação".

Crescimento não anula crescimento da dívida

E a toada de elogio seguido de novos reparos continuou na questão do PIB.

Se por um lado foi destacou o crescimento mais elevado (12%), desde 1995, no PIB nominal dos Açores, por outro lado o CFP sublinhou que essa variação foi "insuficiente para infletir a trajetória de agravamento sucessivo do rácio da dívida" da região verificada nos últimos catorze anos.

O CFP referiu que aproximadamente três quartos (72%) da redução da despesa efetiva dos Açores em 2022 deveu-se à "dissipação parcial do efeito" das medidas de emergência da Covid-19 (de 112,5 milhões de euros em 2021 para 42,3 milhões de euros em 2022).

O relatório deixou ainda outros apontamentos sobre as finanças dos Açores. "Os encargos com juros interromperam a tendência de quebra que se verificava desde 2017. Em 2022, os encargos da dívida pública regional totalizaram 41,6 milhões de euros, mais 2,1 milhões de euros do que em 2021. A receita observou um decréscimo de 6,9% motivado pela quebra das transferências provenientes do Estado e do Resto do Mundo. No seu segundo ano de implementação, o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) continuou a apresentar uma execução abaixo do previsto", salienta o CFP.

CFP destaca redução do défice da Madeira

Para o lado da Região Autónoma da Madeira o CFP teve uma postura mais elogiosa apesar de ter tecido alguns reparos ao desempenho desta Região, entre o quais a exposição ao turismo e uma execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) abaixo do esperado.

"Em 2022, o défice da Região Autónoma da Madeira fixou-se em 2,4% do Produto Interno Bruto (PIB), um resultado inferior em 1,9 pontos percentuais (p.p.) ao verificado em 2021. A dissipação parcial do efeito das medidas de resposta à pandemia equivalente a três p.p. do PIB foi decisiva para a redução do défice orçamental, num ano em que as transferências ao abrigo da Lei das Finanças das Regiões Autónomas (LFRA) observaram uma diminuição equivalente a um p.p. do produto gerado na região. Excluindo o efeito transitório daquelas medidas de emergência, atingir-se-ia uma posição de equilíbrio orçamental em 2022, ainda assim, abaixo do excedente alcançado em 2019 (0,8% do PIBR)", diz o CFP.

O relatório referiu que apesar da evolução positiva do saldo orçamental, "só dois terços daquele efeito de dissipação foi aproveitado" para a diminuição do desequilíbrio orçamental, num ano em que a receita fiscal observou o crescimento mais elevado desde 2014 (15,8%, ou 138,2 milhões de euros ), inferior contudo ao verificado para o PIB nominal da região (19,8%)".

Outro dos elogios prendeu-se com o "crescimento económico robusto" da Madeira, em 2022, ao atingir um máximo de 15,4%, depois do crescimento de 9,2% do ano anterior, que surgiu depois de uma quebra de 15,4% em 2020.

"A variação do Valor Acrescentado Bruto (VAB) em volume dos ramos do comércio, transportes, alojamento e restauração em 33,4% e dos serviços prestados às empresas em 27,5% – que incluem em particular os ligados à atividade turística, como as atividades de aluguer, agências de viagem – foram determinantes para este comportamento, confirmando as estimativas preliminares que apontavam para novos máximos históricos em praticamente todos os indicadores relacionados com o turismo", explica o CFP.

Contudo o relatório alerta que as quebras no PIB verificadas em 2020, e depois a recuperação em 2022, que ficaram acima do todo nacional, traduzem "a forte dependência da economia madeirense" ao sector do turismo.

Descida da dívida

A descida da dívida foi outro dos elogios deixados pelo CFP à Madeira.

O relatório salienta que pelo segundo ano consecutivo o rácio da dívida na definição de Maastricht registou uma redução (de 17,8 p.p. do PIB), "consolidando a trajetória descendente" que se verificava desde 2016.

"Em 2022, o peso da dívida no PIB da região fixou-se em 83,2%, abaixo do verificado no ano da pré-pandemia, correspondendo ao rácio da dívida mais baixo desde 2010", acrescentou o organismo.

O relatório sublinhou que as responsabilidades contingentes "mantiveram a tendência decrescente" dos últimos anos, ascendendo no final de 2022 a 1,272 milhões de euros (21,1% do PIB).

"A redução de 76 milhões de euros face a 2021 reflete o menor valor atual dos encargos futuros com Parcerias Público-Privadas (PPP), que mais do que compensou o aumento da dívida de empresas públicas regionais fora do perímetro orçamental", acrescentou o CFP.

Em 2022, a execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) ficou aquém do previsto, à semelhança do verificado no primeiro ano de implementação. A dívida global da Região praticamente estabilizou evidenciando um crescimento marginal de 0,7%. Mantem-se a ausência de quantificação de responsabilidades efetivas totais com contratos de cooperação técnica e financeira com as autarquias locais da Região", diz o documento do CFP.