O Banco Central Europeu (BCE) reconhece o abrandamento da economia europeia no final do ano passado e projeta que a situação seja difícil de inverter nos próximos meses, dado o peso do ciclo monetário e a fraca procura, tanto interna, como externa. Dois dos vice-presidentes do organismo admitiram esta semana as dificuldades que envolvem a zona euro e o Boletim Económico de janeiro explora as perturbações na atividade industrial e dos serviços, resultando numa provável recessão a fechar 2023.
O ciclo de subidas dos juros teve um impacto negativo sobre a atividade económica durante o ano passado, sobretudo na segunda metade, dados os atrasos com que a política monetária se faz sentir na economia real, lê-se no Boletim Económico de janeiro divulgado ontem. Este abrandamento fez-se sentir com magnitudes e timings distintos no sector industrial e dos serviços, com este último a resistir melhor inicialmente, mas com ambos a fechar o ano numa situação de clara contração.
Segundo a análise dos técnicos do BCE, o sector industrial respondeu mais rapidamente às subidas de juros, um cenário consistente com a literatura económica clássica. Explica o banco, a “maior dependência da procura externa através do comércio e competitividade, as cadeias de fornecimento mais longas e a maior necessidade de capital produtivo” na indústria significa uma maior transmissão da política monetária às empresas neste ramo, que depois também impacta os serviços.
“As ligações entre produto e input entre os dois sectores tendem a induzir efeitos de spillover que, em média, vão sobretudo da indústria para os serviços. Isto significa que a atividade industrial tipicamente reage mais rápido e intensamente a certos choques económicos como mudanças nos juros”, lê-se no boletim.
Esta análise fica em linha com os comentários recentes do vice-presidente do BCE, Luis de Guindos, e da representante do Conselho Executivo do banco, Isabel Schnabel, a reconhecerem um abrandamento da economia europeia.
O vice-presidente do organismo falou numa quebra generalizada da atividade na zona euro, admitindo que uma recessão técnica a fechar o ano era um cenário provável. Os indicadores sectoriais têm sido desapontantes, prosseguiu, não deixando antever grandes avanços do lado do crescimento; já quanto à inflação, apesar de esta estar numa trajetória de recuo, os próximos meses poderão trazer uma inversão temporária.
“Vão-se fazer sentir efeitos base positivos na energia e as medidas de apoio na questão energética vão expirar, levando a uma subida transitória da inflação”, afirmou de Guindos em Madrid esta quarta-feira.
Isabel Schnabel mostra-se mais otimista quanto à pressão nos preços, afirmando numa sessão de perguntas e respostas na rede social X, antigo Twitter, que a zona euro “estava em linha” para ver o indicador voltar a 2%. Ainda assim, e apesar de vários indicadores de confiança estarem “a bater no fundo”, as projeções “de curto-prazo mantêm-se fracas”.
Schnabel procurou ainda afastar a noção de que os cortes de juros devem estar prestes a arrancar, contrariando a visão de Mário Centeno, governador do Banco de Portugal (BdP), e François Villeroy de Galhau, governador do Banco de França, que se haviam mostrado mais confiantes em descidas das taxas em breve no dia anterior.