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Tecnologia, energia e infraestruturas dominarão fusões e aquisições em 2022

Bison Bank diz que “agora que o vírus é um fator conhecido, parece improvável um segundo abrandamento da magnitude do que aconteceu entre o segundo trimestre de 2020 e o primeiro de 2021” neste mercado.

Mais negócios, mas com empresas mais pequenas. É esta a antevisão que advogados, assessores financeiros e consultores financeiros fazem para o próximo ano no mercado de fusões e aquisições. Ao contrário de 2020, em que houve valores recorde, será mais uma vez o segmento de middle-market - empresas de média dimensão - a brilhar e a impulsionar mais compras e vendas de empresas portuguesas, sobretudo nos sectores de infraestruturas, energia e agricultura, além dos habituais tecnológico e de imobiliário, que têm estado no trono e dificilmente o abandonarão. Os especialistas contactados pelo Jornal Económico (JE) demonstram um otimismo cauteloso, devido às transações que estão em pipeline, e esperam algumas reestruturações no sector hoteleiro, que continua a ser penalizado pelas medidas de contenção do coronavírus.

“As perspetivas para 2022 são, no nosso entender, bastante animadoras. Apostaria mais nos sectores da energia, infraestruturas e concessões, telecomunicações e empresas tecnológicas. Portugal continua no radar de muitos fundos internacionais com grande poder financeiro e, por isso, é expectável que o ritmo de investimentos continue a acelerar. A crise pandémica, embora tenha prejudicado alguns sectores, não põe em causa a maior parte dos investimentos. Por outro lado, será expectável que após o período do inverno a situação melhore rapidamente e possamos voltar a um cenário de normalidade”, antecipa o advogado Tomás Vaz Pinto, sócio coordenador do departamento de Corporate da Morais Leitão, em declarações ao JE.
A par com o Lazard, o Banco Santander encabeça o ranking de assessores financeiros em número operações, com três negócios em território nacional. O banco fez assessoria à Teak Capital e à Tangor Capital na aquisição da Cerealis, à Atlantia na venda de uma participação minoritária na Lusoponte e à FSI/Finerge na compra das participações detidas pela EDF Renováveis em dois portefólios eólicos em Portugal. Segundo Acácio Matoso Rego, responsável de Corporate Finance do Santander em Portugal, o acelerar das operações de M&A no próximo ano será motivado pelo avanço do programa de vacinação (doses de reforço) e pela chegada da bazuca europeia. “Perspetivamos que os empresários portugueses poderão estar agora mais recetivos a parcerias com financial sponsors ou a operações de consolidação como forma alternativa de facilitar a capitalização e crescimento das suas empresas. Para 2022 antecipamos uma atividade importante em Portugal nos sectores de telecomunicações, infraestruturas de transportes e saúde, assim como a continuação de algumas rotações de ativos na área de energia e renováveis, embora em menor grau do que no passado recente. Esperamos também a continuação de atividade relevante em outros sectores beneficiados pela pandemia”, afirmou ao JE.

No acumulado deste ano, os assessores financeiros que se destacaram pelo valor de operações foram o Credit Suisse (1.755,40 milhões de euros), o Goldman Sachs (1.683,40 milhões de euros) e o Barclays (1.155,40 milhões de euros). Já a EY Portugal lidera no ranking de consultoras (assessoria financeira e due diligence), com 22 operações e 1.546,07 milhões de euros. Segue-se a PwC Portugal nesta tabela, com doze operações e 1.119,80 milhões de euros. O terceiro lugar é dividido entre a Deloitte Portugal em valor (528 milhões de euros) e a KPMG Portugal em número (duas operações).

Para o consultor Miguel Farinha, sócio e líder de Serviços de Assessoria a Transações da EY, o país irá continuar a assistir a uma “procura acentuada” por parte das infraestruturas, das energias renováveis, das tecnologias de informação e do agroalimentar. “Além do aumento nas operações de M&A e do renascimento de sectores tão afetados como o turismo ou a restauração, ambos intrinsecamente ligados e nos quais é expectável assistir a alterações profundas nas estruturas acionistas, o fim anunciado das medidas de apoio governamentais irá, seguramente, dar origem a outro tipo de operações de M&A, com a venda de carteiras de NPL’s (non-performing loans) ou de single names”, refere. “Os principais protagonistas destas operações serão seguramente os fundos de capital de risco, nacionais e internacionais, que estão bastante capitalizados e com poder de fogo para responder a qualquer dimensão de operação que ocorra no mercado português”, defende ao JE.

O advogado Gustavo Ordonhas Oliveira, sócio da SRS, acredita que se manterá a tendência de crescimento, mas provavelmente haverá poucas transações de grande dimensão e um número mais elevado de operações de mid-market, que envolvem mais PME. Na sua opinião, o mercado deverá manter-se com custo de financiamento baixo e elevada liquidez (dry powder), além de que os fundos europeus do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) - cuja primeira tranche (de 13% do valor global de subvenções e empréstimos previstos, 2,2 mil milhões de euros) foi recebida no verão – terão um papel importante na dinamização da economia portuguesa. Ainda assim, o jurista destaca que a pandemia, que se irá manter por tempo indeterminado, tem um efeito assimétrico na economia. “Por um lado, acelera o crescimento de empresas de base tecnológica em sectores como retalho, mobilidade, logística, energia e ciências da vida, criando necessidades de financiamento e investimento geradoras de oportunidades para fundos de private equity e venture capital e empresas tecnológicas em processos de consolidação. Por outro, tem um efeito negativo na atividade de empresas em sectores como hotelaria e turismo ou empresas industriais expostas às dificuldades geradas pela crise da cadeia de abastecimento, criando situações de distress potencialmente conducentes a processos de reestruturação e venda de ativos”, explica.

De facto, nos primeiros onze meses do ano (últimos dados disponíveis) houve 35 transações de private equity em Portugal, em linha com o ano anterior, com um total de 2,1 mil milhões de euros, e em venture capital foram realizadas 103 rondas de investimentos com um total de 1,5 mil milhões, o que significou um aumento exponencial de 87% no número de negócios relacionados com capital de risco.

“A tendência deve continuar em 2022. Há razões para se ser otimista, porque muitos dos fatores subjacentes ao crescimento da atividade de M&A – por exemplo, o dry powder, o imperativo da digitalização e o peso do dinheiro SPAC [empresa de aquisição com propósito específico] - não se estão a dissipar”, argumenta Gladstone Siqueira, diretor executivo sénior no Bison Bank. “Agora que o vírus é um fator conhecido, um segundo abrandamento da magnitude do que aconteceu entre o segundo trimestre de 2020 e o primeiro de 2021, parece improvável, mas novas ondas da pandemia, confinamentos e variantes têm o potencial de causar grandes problemas. Alguns empresários e investidores preocupar-se-ão”, alerta ao JE o responsável de Banca de Investimento no Bison Bank, sublinhando que a consolidação do teletrabalho e a digitalização serão prioridades nas empresas, pelo que gerarão mais atividade no sector tecnológico. Aliás, a tecnologia esteve este ano todo na liderança de transações, com mais de 90.

Um dos negócios que também envolve tecnologia e que deverá ficar a conhecer o seu desfecho é a potencial venda da Altice Portugal, que, segundo a “Bloomberg”, tem cinco interessados: Blackstone, CVC Capital Partners, Apollo Global Management, EQT e MásMovil.

Ainda assim, o advogado José Maria Corrêa de Sampaio enumera três grandes focos de investimento em 2022: os grandes grupos nacionais, “sendo de realçar as líderes dos consórcios constituídos para concorrer ao PRR, os titulares de concessões ou de parcerias público-privadas nas áreas dos transportes e saúde”, as empresas exportadoras, “que poderão aproveitar as oportunidades do PRR para ganhar escala” e as tecnológicas. O sócio da Abreu detalha ainda que as empresas de infraestruturas irão beneficiar da operacionalização do Plano Ferroviário Nacional - cuja proposta ser apresentada pelo Governo e colocada à discussão pública no segundo trimestre de 2022 - como alternativa ao transporte aéreo de curta distância e ao transporte rodoviário, ao passo que as companhias de agricultura verão mais oportunidades devido “ao aumento da produção de alimentos, seja em projetos agroindustriais com vocação para a exportação, seja projetos de produção artesanal e uma maior promoção das cadeias de abastecimento curtas”.

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