Novo ano, novo governo, mais dinheiro vindo do Plano de Recuperação e Resiliência, subida da inflação (previsões apontam para 1,8% em 2022), subida dos juros e possível aumento do malparado. É neste contexto que a banca portuguesa vai operar em 2022.
Na agenda para 2022 os bancos têm muitos desafios pela frente, desde logo a necessária diminuição da pegada carbónica e os testes de stress verdes do BCE que podem vir a ter impacto no rating e nos ativos ponderados pelo risco. O BCE realizará, entre março e julho, o primeiro stress test de supervisão sobre os riscos relacionados com o clima e uma revisão temática das práticas de gestão de risco ambiental e climático das instituições sob a sua supervisão, cujos resultados poderão vir a ser incorporados no SREP - processo de análise e avaliação para fins de supervisão.
Depois há o potencial impacto negativo na carteira de ativos dos bancos da esperada subida do custo da dívida pública (quando a taxa de juro sobe o preço de mercado dos títulos de renda fixa cai), e é preciso ver que os bancos tinham 16% do seu ativo aplicado em títulos de dívida, segundo dados recentes. A mitigar, parcialmente, este risco está o facto de os bancos terem boa parte da dívida soberana no seu balanço ao custo amortizado.
Há a ter em conta também uma potencial subida do malparado (NPL - Non Performing Loans) decorrente de uma esperada subida dos juros – perante uma inflação que poderá ser menos temporária do que o previsto e da esperada degradação das condições económicas dos clientes dos sectores mais afectados pela pandemia. “A incerteza na vertente sanitária e a acumulação de vulnerabilidades podem traduzir-se na materialização de riscos no médio-prazo”, alertou o Banco de Portugal (BdP) no último Relatório de Estabilidade Financeira.
A mesma opinião tem António Ramalho, CEO do Novobanco, que, em entrevista ao Jornal Económico, disse que, “neste momento, as taxas de juro não contribuem nada para a sinistralidade do crédito, mas se forem mais altas poderão passar a contribuir”. Isto embora a subida das taxas de juro tenha necessariamente um impacto positivo na margem financeira dos bancos, que há dez anos acomodam juros baixos ou mesmo negativos.
Em 2022 os bancos vão também sentir o aumento da concorrência, com a entrada de “novos bancos” à semelhança do Revolut Bank. A digitalização e a evolução tecnológica vão continuar na agenda. Os bancos deverão, então, ser chamados à adoção de modelos colaborativos, suportados no estabelecimento de parcerias em face da tendência de fragmentação da cadeia de valor.
A consultora Roland Berger, no seu mais recente “Executive Retail Banking Survey” concluiu que o modelo de organização bancário é ainda muito tradicional. “A pandemia Covid-19 foi um acelerador da mudança no setor bancário português, mas não alterou estruturalmente os modelos de negócio – os clientes continuam a adaptar-se a um ritmo mais rápido do que os bancos, criando espaço a novos operadores de mercado”, diz a Roland Berger.
Por sua vez, a Mckinsey salientou recentemente que “os bancos continuam a apresentar valorizações pouco atrativas para os investidores e rentabilidades abaixo do custo de capital”. A baixa rentabilidade continua a ser um grande desafio dos bancos, até porque se tiverem de aumentar o capital, em face da conjuntura, vai ser difícil atraírem investidores. A consultora defende que o aumento da rentabilidade depende do modelo de negócio que os bancos adoptarem.
Na agenda da banca em 2022 está outro desafio e que é especialmente importante para os bancos que têm rácios de capital com menos folgas, como é o caso do Banco Montepio, do Novobanco e até do BCP, segundo uma análise recente da Fitch. Trata-se da recomposição das almofadas de capital regulatório que foram flexibilizadas pelo BCE na resposta à pandemia. No entanto é também de notar que, tal como anunciado pelo BCE, não será exigido aos bancos que comecem a reconstituir as reservas de capital, que tenham sido ou venham a ser entretanto utilizadas, pelo menos antes do final de 2022, e segundo o BdP, até à data, os bancos portugueses não necessitaram, em geral, desta flexibilização temporária. Aliás, o governador do BdP, Mário Centeno, disse recentemente que “não se antecipam dificuldades” aos bancos na reposição do seu capital regulatório.
Para 2022 é também esperado que o novo Código da Atividade Bancária seja finalmente aprovado e implementado. Será a nova “bíblia” da banca portuguesa, já que substitui o atual Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras. Ao Expresso, o vice-governador Luís Máximo dos Santos, explicou que a atual legislação da banca é uma “manta de retalhos” e “a sua modernização é indispensável”. O novo Código vai reforçar os poderes de supervisão do BdP. Uma das coisas que está no anteprojecto consiste no poder do BdP para forçar os maiores acionistas dos bancos a venderem as suas participações, parcial ou totalmente, caso a solidez da instituição esteja em risco ou se existirem suspeitas de lavagem de dinheiro. Por falar em vendas de bancos, é expectável que 2022 traga finalmente os desfechos dos vários processos de venda de bancos pequenos, nomeadamente do EuroBic. Mas também do Banco Atlântico Europa (há um acordo de venda ao grupo de Hong-Kong Well Link Group), do Banco Português de Gestão (BPG), do BNI Europa, e finalmente é esperada uma decisão quanto ao futuro do estatal Banco Efisa (ex-grupo BPN), que sem comprador arrisca um cenário de liquidação.
Os bancos terão ainda de cumprir os objetivos intermédios do requisito mínimo de fundos próprios e créditos elegíveis (MREL) que se iniciam a partir de janeiro de 2022. Estamos a falar de títulos que são emitidos para criar uma camada de capital para responder em caso de Resolução (bail-in). O sistema bancário português emitiu instrumentos elegíveis de cerca de 3,5 mil milhões de euros, em particular dívida sénior preferencial e não preferencial. Essas emissões deverão continuar em 2022 e os juros a que os bancos conseguem colocar essas emissões não são displicentes para a conta de resultados.