A rentrée política está à porta e o Orçamento do Estado para 2025 (OE2025) será um dos tópicos quentes das próximas semanas, com o Governo obrigado a negociar com a Assembleia a aprovação do documento, dada a sua maioria relativa. Várias medidas para o próximo ano foram já aprovadas, uma boa parte contra a vontade do Executivo, o que reduz a margem de manobra de um exercício que, consideram os analistas ouvidos pelo JE, não poderá deixar de colocar no topo das prioridades a disciplina orçamental e a redução da dívida.
A apresentação do OE2025 no Parlamento será só em outubro, mas o debate em torno do que constará no documento já arrancou – bem como as negociações entre os partidos com assento parlamentar. Com uma maioria não-absoluta, o Governo terá de encontrar consensos com o hemiciclo, precisando do contributo à esquerda, com o PS, ou à direita, com o Chega (e a IL, embora sem poder para sozinha viabilizar o documento). Esta será, para Luís Leon, fiscalista e cofundador da ILYA, a grande prioridade do Executivo, embora este não tenha feito, até à altura, “qualquer esforço no sentido de ter uma coligação ou apoio parlamentar para a legislatura”.
“[PSD e CDS-PP] sempre disseram que negociavam medida a medida. No OE2025, não me parece que seja possível. É preciso ser pragmático”, começa por referir.
No plano económico e fiscal, o cenário “não é muito diferente do que tem sido desde 2011 e 2012”, com o principal objetivo fixado no “equilíbrio orçamental, que continue a reduzir o rácio da dívida”, projeta Luís Leon. No entanto, a antecipação de parte do efeito da redução do IRS no próximo ano já para setembro e outubro “é uma forma de o Governo pressionar quer o PS, quer o Chega a aprovarem o OE”, argumenta.
Isso significa também que “o próximo ano já está um pouco determinado, tendo em consideração as opções que foram sendo anunciadas em relação ao IRS, IRC, às atualizações dos suplementos, dos salários [da função pública]”, acrescenta Carlos Lobo. O sócio fundador da Lobo, Carmona & Associados, também presidente do conselho geral da Associação Portuguesa de Contribuintes (APC), relembra as medidas já aprovadas e que representarão cerca de três mil milhões de euros de despesa acrescida ou perda de receita no próximo ano, argumentando que “a elasticidade potencial do OE está reduzida”.
Assim, frisa, o país corre o risco de “um ‘baldio orçamental’, com o Governo a desenvolver uma estratégia expansionista, o PS a desenvolver uma contrapolítica orçamental aprovando medidas no Parlamento […] e no final, em 2025, quando começarmos a gerar défices, ninguém vai ser culpado”. Isto é um perigo para Portugal, o quarto país da UE com menor taxa de juro, uma conquista “com sangue, suor e lágrimas, e era muito mau desperdiçarmos isso numa ótica de populismo orçamental”.
Reformas na gaveta
Por seu lado, Carlos Grenha, sócio-gerente na Oliveira, Reis & Associados, SROC, destaca a expectativa por uma “melhoria da competitividade das empresas através da revisão de taxas de tributação, aproximando-as mais dos níveis aplicáveis em outros países da EU, e o aumento do rendimento disponível para as pessoas singulares”, sem esquecer a “capitalização das empresas, em que se pretende apoiar o investimento empresarial e o emprego”.
“Estas prioridades estão em linha com a vontade de avançar com a reforma das finanças públicas, que tem sido uma das bandeiras do atual Ministério das Finanças”, completa, embora lamentando a falta de atenção dada à reforma da despesa.
“Atendendo ao contexto atual de avanços tecnológicos significativos, a melhoria da eficiência dos serviços públicos através do investimento em novas tecnologias é algo que não pode ser ignorado”, reforça Carlos Lobo, considerando que, não sendo os benefícios imediatos ou claramente mensuráveis no curto prazo, “é inegável que a inovação gera oportunidades para controlar a despesa sem sacrificar a qualidade dos serviços públicos”.Uma dimensão que tem sido alvo de recorrentes e repetidas críticas, dada a deterioração da sua qualidade nos últimos anos.
“Não estamos a fazer o trabalho de casa. Temos de melhorar o nosso modelo de gestão orçamental, colocar o sector público a criar riqueza, criar métricas de avaliação, saber o balanço do Estado”, acrescenta o ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. Carlos Lobo lembra que o país continua sem um cadastro territorial – o que nos deixa atrás de países como o Burkina Faso.
Por outro lado, e tendo em conta a dificuldade da fazer crescer a economia, cortar em impostos e reduzir a dívida em simultâneo, Carlos Lobo e Luís Leon convergem na identificação de algumas oportunidades desperdiçadas e que condicionam o universo de possibilidades de políticas orçamentais, como o lítio. Para o cofundador da ILYA, este negócio, juntamente com o dos data centers da SmartCampus, são um espelho das condicionantes ao crescimento na economia nacional.
“Não consigo ver como conseguiremos ter o crescimento económico significativo que nos permita compensar todas estas borlas orçamentais ao nível da despesa e da receita”, acrescenta Carlos Lobo.
Outro tema com relevância em 2025, mas que dificilmente entrará realmente nas discussões orçamentais é a defesa. Dado o contexto internacional de guerras próximas do continente europeu e a possibilidade de nova presidência de Trump nos EUA – que já disse que não continuará a pagar a defesa dos Estados europeus –, a pressão para reforçar os gastos neste segmento do Estado são agora maiores, mas o cabimento político em Portugal será difícil de alcançar, remata Luís Leon.