Em Portugal, existem cerca de 80 mil profissionais com formação superior fora do mercado de trabalho, dos quais 60 mil já desistiram de procurar emprego. Os números, referidos por João Castello Branco no mais recente episódio do Boa Governança, ilustram um paradoxo: numa economia que se queixa de falta de talento, o país “dá-se ao luxo de desperdiçar” experiência e conhecimento acumulado ao longo de décadas
Convidado do videocast do Jornal Económico e do Instituto Português de Corporate Governance, Castello Branco — gestor com larga experiência e hoje presidente da dNovo — alertou para o impacto económico, social e humano desta exclusão crescente. O segmento mais afetado são os profissionais a partir dos 45 anos, precisamente numa fase em que poderiam ser mais valiosos para empresas carentes de capacidade e maturidade organizacional.
A dNovo, uma associação que tem como missão apoiar quadro experientes na reintegração no mercado, já apoiou cerca de 600 pessoas. Dessas, 200 conseguiram recolocação, maioritariamente em pequenas e médias empresas que se confrontam com escassez de talento. Para João Castello Branco, isto demonstra que “há um coletivo de gente desaproveitado” e que o preconceito etário continua a impedir o aproveitamento da experiência disponível.
O gestor identificou esse preconceito — o idadismo — como um bloqueio estrutural, referindo que muitos currículos são descartados apenas pela idade. Defende, por isso, modelos flexíveis de integração: trabalho parcial, funções de mentoria, consultoria e enquadramentos progressivos. A economia portuguesa perde conhecimento quando elimina quadros mais velhos em nome de eficiência, substituindo-os por estruturas mais jovens, mas menos densas em experiência.
A transmissão de valores pelas “primeiras linhas” das organizações é decisiva. Cultura não se decreta: constrói-se diariamente, e a experiência sénior é uma das peças essenciais para consolidar essa identidade interna. Ao afastar quadros com décadas de conhecimento, as empresas aceleram processos e rejuvenescem equipas, mas perdem bases de decisão que levam tempo a formar.
Castello Branco recordou ainda que o custo do desperdício é duplo: para o Estado, que perde contribuições fiscais e financia prestações sociais, e para os indivíduos, cuja identidade profissional colapsa quando deixam de encontrar lugar. “Aquilo que fazemos é parte da definição do que somos”, assinalou, sublinhando que o impacto humano é tão relevante como o económico
O Boa Governança está disponível em jornaleconomico.pt e em podcast nas principais plataformas.
Portugal desperdiça talento ao desaproveitar quadros
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João Castello Branco preside à dNovo e regista que em Portugal existem 80 mil quadros experientes fora do mercado, por causa da idade, quando o país necessita de talento.