Visões diferentes, mas a mesma leitura: nem os patrões, nem a intersindical compreendem o impasse criado em torno da aprovação do Orçamento do Estado para 2025 (OE2025) por duas medidas, considerando que tal se resume a jogos políticos, deixa o país em suspenso e afasta a discussão de assuntos mais relevantes.
Ao JE, tanto o presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal, como o secretário-geral da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP) mostraram a sua apreensão com o foco colocado quase exclusivamente nas questões do IRS Jovem e do IRC, embora com interpretações diferentes: se as empresas apontam à necessidade de tomar medidas que atraiam investimento, a intersindical lembra os outros temas importantes que figurarão na proposta orçamental e sobre os quais tem havido pouco debate.
“Nunca imaginei que o meu país iria ter como ponto fraturante entre os dois partidos que têm sido o esteio da governação a questão em torno de dois pontos do IRC”, afirma Armindo Monteiro, presidente da CIP, classificando a discussão pública entre Governo e PS como “uma coreografia política”.
O representante dos patrões não esconde a “perplexidade” em torno da insistência sobre um ponto percentual de IRC, lembrando que há um consenso nacional sobre as taxas demasiado elevadas que incidem sobre as empresas. Esta situação é ainda pior quando vivemos um momento “em que os países estão a lutar para atrair investimento direto estrangeiro”, numa lógica de relocalização industrial global.
“Cavaram trincheira à volta deste tema”, acusa, e “todo o tecido produtivo do país sofrerá as consequências” desta incerteza.
Do lado da CGTP, o secretário-geral Tiago Oliveira considera igualmente que o IRS Jovem e o IRC não são “a questão fundamental”, falando numa estratégia deliberada para focar a discussão em apenas dois temas.
“Há aqui uma estratégia que está a ser seguida que pretende afunilar a discussão do OE em duas matérias, quando o OE é muito mais que isto”, atira, apontando às questões ligadas ao sistema de saúde, aos serviços públicos, à habitação ou aos salários e pensões e que estão a ser remetidas para um papel secundário.
“Vemos com preocupação o caminho que está a ser trilhado de colocar esta discussão em duas vertentes que em nada vão alterar as dificuldades que os portugueses sentem no seu dia-a-dia”, resumiu.
Recorde-se que Luís Montenegro prometeu uma contraproposta “irrecusável” e apresentou a Pedro Nuno Santos a modelação do IRS Jovem com custos de 600 milhões, em vez dos 1,2 mil milhões inicialmente previstos. E propôs a redução do IRC de 21% para 20%, insistindo nas linhas vermelhas definidas pelo PS.
O primeiro-ministro sinalizou um corte de um ponto percentual (pp) no imposto que recai sobre as empresas, contra os dois pp pretendidos inicialmente pelo Executivo e que chegaram a constar do primeiro rascunho do acordo de rendimentos. A versão final assinada entre parceiros sociais e Governo acabou por ser suavizada para redução progressiva do IRC até 2028 sem qualquer indicação do corte.
A dimensão desta descida foi agora apresentada ao líder do PS com o Governo a manter o corte transversal deste imposto, apontada como linha vermelha nestas negociações.