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Matéria preta

Foi há tanto tempo que já poucos se lembram. Quando a música punk inundou o Reino Unido com o seu rock adolescente e agreste, antecipando a chegada da senhora Thatcher ao poder, cada grupo tentava mostrar que tinha a pior reputação do mundo.

Foi há tanto tempo que já poucos se lembram. Quando a música punk inundou o Reino Unido com o seu rock adolescente e agreste, antecipando a chegada da senhora Thatcher ao poder, cada grupo tentava mostrar que tinha a pior reputação do mundo. Os Stranglers tentaram portar-se tão mal que acabaram por ser expulsos da Suécia duas vezes por polícias que usavam metralhadoras. Mas segundo Jean-Jacques Burnel, um dos seus membros, nesse final da década de 1970, o seu seu maior sacrilégio foi terem um teclista. Num mundo de guitarras, bateria e gritos, a melodia não era bem-vinda. Era contra a ética do punk e por isso os Stranglers foram vistos de lado pelas outras bandas. Não foi só isso, claro. Mas eles mostraram (lembre-se o tema “Golden Brown”, que a sua editora queria propagandear como “uma música de Natal”), o caminho para a pop electrónica. O responsável era Dave Greenfield, um teclista barroco, que se manteve durante 45 anos com o grupo e que faleceu em maio do ano passado com Covid. Mas ele ainda surge no novo álbum deste velhinho grupo, “Dark Matters” (CD Coursegood Records, 2021), que fala de depressões, velhice e, claro, da mortalidade. Como disse no ano passado Hugh Cornwell, o vocalista original, o teclado de Dave fez a diferença entre os Stranglers e todo o resto do punk. Contam-se histórias de confrontos físicos entre Greenfield e John Lydon dos Sex Pistols e mesmo com membros dos Clash e dos Ramones. A melodia estava reservada para as teclas.

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