João André de Barros Teixeira iniciou a vivência internacional cedo, por ser filho de pais médicos que trabalhavam com a Organização Mundial de Saúde. Nasceu no Brasil, formou-se no Reino Unido, é cidadão belga e viveu e trabalhou em seis continentes. “Na natureza temos dois tipos de espécies, com raízes e com asas. Quem nasce com asas inevitavelmente tem de voar”, afirma o gestor, que integra a rede de advisors Bridgewhat, em entrevista ao Jornal Económico.
Os mais de 40 anos de carreira que leva em posições de administração, em diferentes mercados, permitiram-lhe construir a grelha de leitura da gestão humanística que defende no livro The Human MBA.
“Comecei a colecionar na minha carreira uma série de situações que não encontramos nos livros nem em cursos nas escolas de negócios. Por exemplo, a gestão de dilemas. Enquanto presidente de empresas, passei a maior parte da minha vida a gerir dilemas;se vou fazer isto ou aquilo, investir neste negócio, naquele outro”, explica. “Para cada tema fui buscar um livro clássico da literatura ou da filosofia que me trouxesse algumas respostas. E faço algumas propostas de reflexão ética sobre temas que nos afligem, para os quais não existem cursos nem livros específicos de negócios”, acrescenta.
Barros Teixeira considera que, no quadro atual, a gestão humanística tem maior importância. “Ficou muito claro que o que eu chamo de pragmatismo radical não solucionou os grandes problemas da humanidade. É claro que nós avançámos muitíssimo em várias áreas, conseguimos ter negócios modernos; hoje temos num dia de comércio mundial o equivalente a todo o comércio mundial de 1948. As tecnologias existentes que ajudam a pôr em prática todos estes negócios são realmente fantásticas”, diz, mas acrescenta que, apesar de todo o desenvolvimento, “os graves problemas da humanidade ainda continuam a necessitar de solução”. “O problema ambiental, o problema de estarmos a viver como se tivéssemos cinco planetas quando só temos um, a sustentabilidade, todos os aspetos humanos, o risco dos radicalismos”, enumera.
Defende como caminho uma gestão humanística, assente em três pilares: a reflexão ética, a centralidade da dignidade humana e o envolvimento de todas as partes interessadas.
“A gestão humanística propõe, não uma alternativa ao pragmatismo, mas propõe a humanização do negócio, a humanização do pragmatismo, de tal forma que consigamos continuar a ter o sucesso que temos economicamente, mas com uma componente humana essencial”, explica.
Para o gestor, esta é uma tendência visível e os CEO de hoje têm de ter em conta essa mudança. “Estão a dirigir um grupo de pessoas que estão muito mais preocupadas com outros temas, além só do financeiro”, avisa. “O CEO de hoje lida com pessoas que estão mais preocupadas com causas e temas humanos, temas planetários, que vão mais além do que simples progresso na carreira, aumento de salário, promoções, etc. Inevitavelmente, esse CEO tem de estar equipado com este aspeto humano, porque também os países, também as políticas, movem-se nesse sentido”, sublinha.
Apesar de persistirem diferenças entre países e blocos comerciais, que se encontram em diferentes estádios de desenvolvimento, André de Barros Teixeira considera que haverá um alinhamento. “Alguns países ainda não queimaram algumas das etapas necessárias, mas é uma questão de tempo”, diz. “Mesmo naqueles países que ainda não abriram os olhos para essa necessidade, já há movimentos, uma classe média que se forma na China e que começa a dizer que quer educar os seus filhos em escolas que escolham e não que o Estado escolha, que quer viajar, aprender línguas, etc. É uma questão de tempo e de evolução”, reforça.
Esta tendência nota-se, também, na consultoria, com os clientes a procurarem uma abordagem “mais holística, uma consultoria que procure resultados – porque nunca se abdicar da importância dos resultados –”, mas que procure o “crescimento como serviço e não só como objetivo final”.
“A consultoria baseada na escola em que o importante é ganhar dinheiro, o resto não tem nenhuma importância, essa ficou no passado”, sustenta.
IA sim, mas controlada
João André de Barros Teixeira é especialista em inovação e no interface entre a ciência e o marketing, numa altura em que vivemos a uma revolução tecnológica, primeiro pela digitalização de processos, depois pelo advento das soluções de inteligência artificial que, defende, tem de ser controlada.
“Parafraseando [Yuval Noah] Harari, o grande pensador, ele disse que não tem nenhum medo da inteligência artificial, tem muito mais medo da ignorância natural. E eu acho que é uma frase muito interessante porque nós temos de ter cuidado com a utilização da inteligência artificial, temos de estar de olhos abertos e não a abraçar como se fosse uma quimera maravilhosa. Temos de saber lidar com ela”, diz. “Ao saber lidar com ela, podemos fazer com que nós, seres humanos, os que trabalham inovação, por exemplo, fiquem focados e dedicados aquilo que é o mais importante, que é o poder das ideias. E o poder das ideias, esse conceito da centralidade das ideias na inovação, é essencial”, explica. “A máquina vai fazer uma série de coisas mais rapidamente do que nós podemos fazer, mas vai abrir-nos as portas para que nos dediquemos aquilo que nós somos melhores do que a máquina, que é na geração, na gestão e na propagação das ideias”, afirma.
Nesta revolução, perfilam-se três blocos concorrentes – a Europa, os Estados Unidos da América e a China –, que disputam a primazia das novas tecnologias. “Inevitavelmente, é uma corrida e sempre que há uma corrida há ganhadores e perdedores”, diz Barros Teixeira, mas considera que o principal desafio não é tecnológico, mas de adaptação. “Há um tema mais amplo, que é o facto de nós vivemos, nos dias de hoje, a três velocidades: temos sentimentos que são pré-históricos, como o amor, o ódio, o comportamento gregário, etc.; temos instituições que são medievais – basta ir a um cartório ou notário para ver quantos carimbos vão colocar nos nossos documentos; e vivemos numa tecnologia de ficção científica”, explica. “Conciliar estas três velocidades é o grande desafio e os blocos que forem mais rápidos nessa conciliação terão uma vantagem competitiva”, conclui.