Skip to main content

Como as sociedades de advogados em Portugal tiram proveito do potencial da Lusofonia

Globalização: O JE analisou a presença dos vários escritórios nos países lusófonos e explica-lhe onde têm parcerias e como fazem as assessorias, normalmente numa ótica muldisciplinar e multijurisdicional.

O espaço lusófono, do Brasil a Timor, é visto como um oceano de oportunidades para as sociedades de advogados presentes em Portugal por várias razões, como a língua, a tradição jurídica comum - sobretudo entre Portugal e os PALOP - e o potencial do nosso país como centro de arbitragem e plataforma para o investimento na Lusofonia. Seja através de parcerias com escritórios locais ou presença direta, as principais sociedades de advogados em Portugal veem as outros oito jurisdições da Lusofonia como mercados a explorar.


No entanto, as estratégias divergem também em função da origem dessas sociedades, quer se trate de escritórios 100% portugueses, ibéricas ou anglo-saxónicas. De igual modo, a realidade difere quer se trate do mercado brasileiro (que tem uma tradição jurídica inspirada na dos Estados Unidos e conta com reputadas sociedades de grande dimensão) quer se trate de outros países desta comunidade, nomeadamente Angola e Moçambique, onde os laços com Portugal são mais fortes.


A Miranda & Associados foi uma das primeiras sociedades portuguesas a apostar fortemente na África, com uma presença que abrange também países francófonos e outros. Através da Miranda Alliance, destaca-se por representar clientes nos países lusófonos há mais de 20 anos. Atualmente, são mais de 60 advogados e estagiários e outros 30 colaboradores com funções diferentes. Em declarações ao Jornal Económico (JE), o managing partner fala em relações “exclusivas, sólidas e de longa duração”, construídas na base da proximidade.


Questionado sobre se fazem esse apoio através de Portugal, Diogo Xavier da Cunha clarifica que a “dimensão das operações da Miranda Alliance na África lusófona – ou em qualquer outra jurisdição que não Portugal [15] - é tal que seria impossível”. “Há muitos anos que nos habituámos a trabalhar num registo multigeografia com colegas dos vários escritórios da Miranda Alliance (…). Com clientes norte-americanos é bastante comum termos o nosso escritório de Houston, nos Estados Unidos, também na equipa”, diz.


A Abreu divide esses mercados por seis desks: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e Timor-Leste. Em Luanda, está desde 2007 a trabalhar com a FBL. Logo três anos depois, na era da expansão internacional das sociedades portuguesas, assina acordo com a JLA em Maputo e de seguida com a brasileira Siqueira Castro Advogados (2012). Para os mercados cabo-verdiano e macaense, entra em campo a C&C Advogados, com a qual tem igualmente uma parceria joint office em Díli (Timor-Leste). Em relação à Guiné-Bissau, é a Armindo Serqueira desde a pandemia. Normalmente, os advogados de contacto para estes projetos são Inês Sequeira Mendes (managing partner), sócios como Manuel Santos Vitor e Duarte d’Athayde (chairman).


A PLMJ conta também com histórico nesta área. Por exemplo, tem assessorado o Estado de Cabo Verde, inclusive na redação do seu primeiro Código dos Contratos Públicos. Em Moçambique, assessorou em maio a Galp na venda de 10% da concessão na bacia do Rovuma, por 600 milhões de euros, e participou no project finance de um parque solar na maior mina de grafite do mundo.


“Para cada projeto, juntamos o conhecimento local com equipas altamente especializadas nos sectores e enquadramentos regulatórios locais que trabalham a partir de Portugal [Lisboa, Porto e Faro] de forma completamente integrada (…). O apoio aos nossos clientes que têm projetos ou procuram entrar nos países da lusofonia combina talento local com talento português”, diz ao JE fonte oficial da PLMJ, referindo-se à colaboração em Angola (RVA), Guiné-Bissau (Armindo Serqueira), Moçambique (TTA), São Tomé e Príncipe, (SNVF) e Timor-Leste (CBMS).


Quanto à Vieira de Almeida (VdA), opera através da VdA Legal Partners, que compreende Angola (ASP), Moçambique (GDA), São Tomé e Príncipe (VNA), Cabo Verde (SSA), Timor-Leste ou Guiné Equatorial num total também de seis jurisdições além de Portugal. A ideia é também trabalhar em parceria com os seus 330 advogados.


Já a Morais Leitão tem escritórios em Angola (ALC Advogados), em Moçambique (MDR Advogados) e em Cabo Verde (VPQ Advogados) e presta serviços também no Brasil, Guiné-Bissau, Macau, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, até porque a rede Morais Leitão Legal Circle age sob o lema “uma sociedade com uma cultura comum”. Há exatamente três anos, investiu na contratação de Bruno Xavier de Pina, ex-sócio coordenador do Grupo Internacional Angola (Angola Desk e BCSA) na PLMJ.


Outras sociedades portuguesas, como a SRS (que tem desks para Angola, Brasil e Moçambique e uma parceria com um escritório macaense) e a Telles (com uma Brazilian Desk” para apoiar clientes brasileiros), encaram igualmente o mundo lusófono como uma oportunidade.

 

Sociedades internacionais entram na Lusofonia através de Portugal
A CMS Portugal, escritório liderado por José Luís Arnaut, que está inserido na rede internacional CMS, de origem anglo-saxónica, avançou para a entrada nos mercados brasileiro e moçambicano em 2023, contando com uma área de prática de África Lusófona, encabeçada pelo sócio Alberto Galhardo Simões.


Ao JE, advogado diz que, apesar dos “inúmeros desafios e variáveis”, há perspetivas “otimistas” para as economias que compõem os PALOP,énomeadamente ao nível do investimento no segundo semestre. Em “Angola, o crescimento deverá centrar-se na produção petrolífera e nas inúmeras reformas levadas a cabo para diversificar a economia e atrair investimento estrangeiro, com destaque para o programa de privatizações (PROPRIV) e para os investimentos em infraestruturas, nomeadamente nas energias renováveis e no sector dos transportes”, defende o sócio da CMS.


“Já Moçambique conta com a retoma dos investimentos no sector do gás natural, cuja dimensão implicará um impacto transversal muito positivo em toda a economia. Cabo Verde deverá continuar a sua aposta no turismo e serviços e em São Tomé assiste-se a um esforço grande no sentido de fortalecer as suas infraestruturas energéticas, principalmente no domínio da renováveis”, explica Alberto Galhardo Simões, responsável por esta equipa que assessora clientes em Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e, pontualmente, Timor-Leste.


Dos 31 escritórios da Linklaters, 28 já trabalharam em temas ligados a projetos em África com um total de 620 advogados, sendo que o número alocado varia consoante da complexidade e dimensão da assessoria. “No escritório de Lisboa temos advogados que se dedicam preferencialmente a estes mercados, com um foco especial nas áreas de energia e infraestruturas, fusões e aquisições e arbitragem. São mercados muito importantes para a Linklaters a nível global e a nossa rede permite-nos ter uma abordagem integrada dos vários mercados e sectores em África”, disseram ao JE os sócios Diogo Plantier Santos e Francisco Ferraz de Carvalho.


Outra sociedade de origem anglo-saxónica, a DLA Piper (que em Portugal integrou a ABBC), tem presença direta em Angola e Moçambique, além dos parceiros locais para os demais PALOP. “Cada projeto é analisado individualmente, numa lógica de one stop shop, por forma a juntar o conhecimento local, com as experiências internacionais que sejam mais adequadas às necessidades e sejam capazes de gerar mais valor aos clientes. Temos equipas multidisciplinares localmente, apoiadas em função das necessidades específicas e da nacionalidade do investidor”, conta o managing partner da DLA Piper ABBC, Nuno Azevedo Neves.


Por sua vez, a Pérez-Llorca, a mais recente firma espanhola a instalar-se em Portugal, aborda o mercado lusófono a partir do escritório de Lisboa, tal como a Cuatrecasas ou a Uría Menéndez. “Temos vários sócios com larga experiência transacional e de regulação local. Em financiamentos cross-border, contamos também com o apoio dos nossos sócios nos escritórios de Londres e Nova Iorque. Por último, o nosso escritório de Singapura tem sido instrumental no aumento de trabalho relacionado com o investimento asiático na região”, assinala ao JE o sócio Gonçalo Capela Godinho.

 

Boutiques também olham para a Lusofonia
A boutique portuguesa Melo Alves tem estado a apostar significativamente nesta vertente lusófona. Depois de, em abril, ter contratado a advogada angolana Ana Major, ex-presidente do conselho de administração da companhia aérea TAAG, para o cargo de consultora internacional sénior, prepara-se para anunciar uma parceria com uma sociedade Macau. A informação foi avançada ao JE por Bruno Melo Alves, responsável pela Angola Desk. “O nosso posicionamento internacional desenvolveu-se a partir da necessidade de assistir vários clientes de matriz internacional em alguns países de língua oficial portuguesa”, esclareceu o sócio, enaltecendo ainda o trabalho de Rui Andrade a sua experiência em matérias de contencioso, arbitragem e laboral em Angola, Moçambique, Timor-Leste, Guiné Equatorial, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau e Cabo Verde, sobretudo com petrolíferas. O apoio em Macau segue-se ao da angolana Eckaley.


“No início de 2024, a economia angolana revelou uma dinâmica de revitalização pelo lançamento de infraestruturas de grande importância em termos logísticos - o novo aeroporto de Luanda e o Corredor do Lobito - bem como pelo anúncio público, no final de 2023, do reforço da cooperação estratégica entre Angola e os Estados Unidos. Não obstante, as previsões otimistas do FMI para o nível de crescimento económico de Angola ao longo deste ano deverão, a nosso ver, ser analisadas com cautela”, comenta Bruno Melo Alves.