Responde a perguntas, é a aplicação digital com o crescimento mais rápido de sempre, porque atingiu os 100 milhões de utilizadores em apenas dois meses, e colocou o tema da Inteligência Artificial (IA) generativa na agenda mediática, no quotidiano das empresas e, para mal dos pecados de muitos pais, nos trabalhos dos alunos. Já sabe a “quem” nos referimos? O ChatGPT, a criação mais badalada da OpenAI.
Faz esta quinta-feira, dia 30 de novembro, um ano desde que a plataforma chegou ao grande público, de forma gratuita, e alterou vários padrões de atuação dos cidadãos, sobretudo na rotina de trabalho das pessoas, processos de criação, como ideias para campanhas de marketing, ou tarefas de distribuição de turnos enfadonhas. O mais notório: fez com que, nos últimos doze meses, ou para sermos mais fidedignos dez, as organizações começassem a falar de IA generativa enquanto elemento estratégico ou plano de investimento.
Perguntámos ao ChatGPT como ele (ela?) se caracteriza à data de hoje e começou logo por apresentar-se com um simpático “olá!”. “Sou o ChatGPT, um produto da OpenAI e sou baseado na arquitetura GPT-3.5. GPT significa “Generative Pre-trained Transformer” e é um tipo de modelo de linguagem de IA. Fui projetado para compreender e gerar texto semelhante ao humano com base nas informações que recebo”, caracteriza-se.
“O meu treino envolve a exposição a uma ampla variedade de textos da Internet, o que me permite responder a uma ampla variedade de solicitações e perguntas. Estou aqui para ajudá-lo com informações, responder a perguntas e participar em conversas sobre uma ampla variedade de tópicos. No entanto, é importante observar que, embora eu possa dar informações e gerar respostas, não tenho experiências ou opiniões pessoais”, ressalva. Ou seja, transmite a informação essencial: o que é, em termos tecnológicos, e que sabe conversar, mas não têm experiência de vida, portanto não pode opinar.
Os problemas surgem também no facto de recorrer “a uma ampla variedade de textos da Internet”. É este o principal ponto de discórdia para não ser uma ferramenta consensual, além do facto de a versão gratuita ainda dar muitos erros, de acordo com alguns testes feitos pelo Jornal Económico (JE). Poderá também esta a razão pela qual a maioria das empresas cotadas no PSI se recusar a comentar o assunto, após tentativas de contacto do JE. ChatGP… Quê?
Funcionários da Jerónimo Martins têm de ler manual sobre IA
A Jerónimo Martins é uma das grandes empresas em Portugal que pretende tirar proveito da tecnologia, mas impôs regras à utilização desta ferramenta por parte dos seus colaboradores. “Por reconhecer que as plataformas de IA podem ser relevantes para o trabalho em algumas funções, o grupo partilhou com os colaboradores a informação necessária para o uso correto destas ferramentas, através dos seus canais de comunicação interna. Adicionalmente, foi criada uma página com boas práticas, regras para a utilização destas plataformas e sugestões para tirar o melhor partido do seu uso, que é de leitura obrigatória em cada utilização”, esclarece fonte oficial do grupo de retalho ao JE.
“O desafio é: utilizar a tecnologia de IA com propósito. Ninguém na Europa e em Portugal está interessado em não explorar a inovação que vem da IA ou da blockchain ou da analítica de dados. Queremos é preservar que algumas das utilizações, quando são contrárias à dimensão social e aos valores europeus, não são feitas”, explicou o secretário de Estado da Digitalização e da Modernização Administrativa ao JE, Rádio Renascença e Lusa, à margem da Web Summit 2023.
“Por exemplo, se utilizarmos a IA para identificação maciça de populações e catalogá-las? Na Europa não queremos. Queremos que, mesmo quando temos um avatar ou uma assistente virtual para guiar as pessoas com um propósito, essas pessoas sabem que não estão a falar com outra pessoa, mas com uma imagem gerada por IA generativa. E que na saúde e segurança haja sempre o chamado oversight dos humanos”, defendeu Mário Campolargo.
Chatbot dos médicos respondeu a mais de 300 mil perguntas
Na saúde, a startup Tonic App criou o primeiro ChatGPT para médicos em Portugal, “Dr. Tonic”, no final de março deste ano. Nos últimos oito meses, foram feitas cerca de 336 mil perguntas por 21 mil médicos, o que leva a empresa a preparar-se para lançar uma nova ferramenta que permite transcrever e estruturar dados de consultas em segundos a fim de serem utilizados para registos clínicos ou científicos, avançou a CEO ao JE.
Daniela Seixas diz que estes profissionais têm uma “visão positiva” da aplicação da IA na saúde, embora estejam “bastante preocupados” a ética e deontologia, em particular com mais risco de desumanização da medicina.
“Os primeiros a adotar foram os médicos do género masculino e, entre as diferentes especialidades médicas, a saúde pública e a radiologia. Os médicos olham para a IA generativa como uma tecnologia promissora, que, além de ser um recurso útil para obter informação, lhes permite ser mais eficientes no seu dia-a-dia, por exemplo reduzindo a sua carga administrativa, seja a facilitar os registos clínicos, a estruturar dados para a tomada de decisões ou a automatizar a marcação de consultas”, refere ainda a fundadora da Tonic App.
O secretário de Estado da Digitalização e da Modernização Administrativa lembrou ainda que, na semana da famosa cimeira tecnológica, houve um encontro do Digital Nations, um grupo de dez países com serviços públicos modernos, no qual foi assinada uma declaração ministerial sobre “better data better society”, que envolve dados mais inclusivos e éticos.
“Quanto melhores forem os dados que conseguimos garantir melhor será a sociedade. Temos de ter aspetos éticos na recolha e no tratamento de dados, privacidade e segurança e olhar para a sua utilização para dar mais à sociedade quer na vertente administrativa quer na privada. Temos de ter os dados abertos para que a própria Administração Pública os possa pôr à disposição do público, da sociedade civil, que os utilizará para desenvolver novos serviços ou tirar conclusões”, afirmou o governante com a pasta do Digital.
É também por esse motivo que sem setembro a associação Data Science Portuguese Association (DSPA), de capacitação de pessoas e empresas na área dos dados, criou a primeira certificação em IA generativa made in Portugal, em parceria com a Microsoft. Ao JE, a organização liderada por Fernando Matos adianta que, das 139 inscrições, já foram emitidos 20 certificados, sendo que o rácio é este porque existe um período entre o registo, o resgate do voucher, e o exame que confere o certificado.
A OpenAI tem feito correr muita tinta na última semana, porque o fundador e CEO foi despedido pelo conselho de administração da tecnológica, dois dias depois foi recrutado para um novo departamento de investigação avançada em IA da Microsoft – a gigante investiu 10 mil milhões de dólares na OpenAI no início do ano – e cerca de 24 horas, regressou à casa que fundou, mantendo a posição na presidência executiva. A seguir, veio a público que um grupo de investigadores enviou uma carta aos administradores da OpenAI a alertar para uma descoberta que poria em risco a Humanidade, o projeto Q* (“Q-Star”).
No verão, também diversos líderes de opinião, jornalistas, legisladores e gestores do sector tecnológico internacional assinou uma declaração conjunta a alertar que a IA pode levar à extinção da Humanidade. A principal ideia partilhada foi: mitigar esse risco de fim dos humanos como os conhecemos deve ser uma prioridade global, tal como o são outros riscos à escala social, como pandemias e guerras nucleares.