Apesar dos riscos criados pela situação demográfica e pela reduzida produtividade, o Conselho de Finanças Públicas (CFP) projeta que Portugal mantenha a trajetória de redução da dívida pública nos próximos 15 anos, ainda que chegando a níveis ainda acima do limite imposto pelo Tratado de Maastricht. A projeção do organismo é que o indicador chegue a 82,7% do PIB em 2037, ou seja, ainda acima de 60%, e, embora o ritmo de redução deva abrandar na segunda metade deste horizonte, existem condições para manter esta tendência caso os legisladores assim entendam.
No relatório publicado esta terça-feira pelo CFP intitulado “Riscos Orçamentais e Sustentabilidade das Finanças Públicas”, a instituição liderada por Nazaré da Costa Cabral realça os desafios estruturais da economia nacional, com a demografia e a produtividade à cabeça, mas ressalvando que “existem condições de sustentabilidade das finanças públicas portuguesas, assim os decisores políticos continuem a tomar as medidas necessárias para obter um suficiente excedente primário”.
“Como o período após o final do programa de ajustamento em 2014 demonstra, as condições de financiamento favoráveis que se verificaram, aliadas à disciplina orçamental, criaram uma dinâmica favorável para a redução da dívida, que se reforçam mutuamente, via ganhos de credibilidade refletidos em spreads reduzidos face à dívida alemã”, lê-se no relatório. O CFP estima para 2037, o fim do horizonte temporal do exercício de projeções, um rácio de dívida de 82,7%.
Em caso contrário, uma “rutura” com esta política recente “conduziria a um perfil ascendente para o rácio da dívida a partir de 2027, situando-se acima de 110% do PIB no final do horizonte de projeção”.
Estes avisos ficam em linha com as palavras recentes de Nazaré da Costa Cabral à Antena 1 e aos ‘Jornal de Negócios’, quando pediu “responsabilidade” aos partidos neste período eleitoral, relembrando que as promessas aos portugueses terão custos futuros.
O documento divulgado esta terça-feira relembra precisamente que “países cujos governos optem por prosseguir uma política orçamental que descure de forma reiterada e persistente a obtenção de um saldo primário suficiente para permitir uma redução do rácio da dívida poderão enfrentar riscos consideráveis, devido, em parte, ao potencial ciclo de feedback entre a elevada dívida pública e o prémio de risco, especialmente no caso de países com saldos de dívida já relativamente elevados”. Como tal, e apesar das melhorias recentes, Portugal continua numa situação “vulnerável” que requer responsabilidade orçamental.
Apesar de manter a trajetória de redução nos próximos anos, o ritmo não será semelhante ao registado desde o pico de 2020, ressalva o relatório. Após as quedas expressivas deste ano e do próximo, o indicador deve cair 0,9 p.p. por ano, em média.
Por outro lado, e apesar da redução assinalável dos últimos anos e da expectativa que esta se mantenha, “Portugal detém um stock de endividamento que requer uma consistente persecução de políticas de consolidação orçamental”, mantendo uma “posição vulnerável” neste aspeto.
Do lado do crescimento, a expectativa é que a economia nacional avance, em média, 1,2% por ano no intervalo 2023-2037, com uma evolução mais forte no início deste período. Ainda assim, persistem dois desafios estruturais que podem ameaçar este resultado: a demografia e a baixa produtividade.
Esta tendência de “redução esperada do contributo do emprego para o crescimento em qualquer dos cenários demográficos considerados reforça a importância da produtividade total dos fatores enquanto principal determinante do crescimento económico de longo prazo”, avisa o CFP, o que coloca mais foco na questão da produtividade do trabalho. Como tal, o organismo presidido por Nazaré da Costa Cabral pede “medidas estruturantes que possibilitem que a produtividade total dos fatores supere de forma sustentada a sua média histórica permitiria melhorar as perspetivas de crescimento e reforçar as condições de sustentabilidade a prazo das finanças públicas”.
Por outro lado, uma população mais envelhecida também significará mais pressão do lado da despesa, por via, sobretudo, das pensões a pagar e dos gastos com cuidados de saúde. Isto reforça ainda mais o papel da produtividade como fonte de crescimento e promoção da sustentabilidade das cotas públicas, mas também acresce à necessidade de um sistema de gestão da despesa efetivo.