A proposta social-democrata de reforço do complemento solidário para idosos (CSI) é positiva, na medida em que representa um reforço dos rendimentos e mais uma forma de combate à pobreza, mas insuficiente no universo abrangido, além de ter sido comunicada de forma pouco clara, minando a política. Maria do Rosário Gama, presidente da APRe - Associação de Reformados Pensionistas e Idosos, aproveita ainda para reforçar a necessidade de alteração das condições de acesso a esta prestação, argumentando que o rendimento dos filhos não deveria restringir a elegibilidade.
Apesar de medidas que combatam a pobreza serem vistas como positivas, a APRe salienta que a proposta social-democrata representa apenas “mais 20 euros do que seria expectável”, dada a evolução em relação aos 550 propostos no Orçamento do Estado para 2024 (OE2024), que colocaria o CSI em 800 euros em 2028. Como tal, é necessário questionar “se o salário mínimo em 2028 se manterá em 820 euros, uma vez que é referido por Luís Montenegro que [a pensão com complemento] ficará equivalente ao salário mínimo”.
Atualmente, o CSI beneficia 134.347 idosos e o valor atual é, no máximo, 488, 22 euros. No próximo ano terá um teto de 550,67 euros. Isto significa que todos os idosos reformados com rendimentos abaixo deste valor têm direito a receber o CSI no montante da diferença. Por exemplo, uma pensão de 490 euros receberá 60 euros de CSI em 2024, se o idoso cumprir os restantes critérios e não tiver outros rendimentos. O aumento para 820 euros reforçaria, assim, o valor de quem já recebe e permitiria que mais idosos passassem a beneficiar.
A representante dos reformados e pensionistas nacionais destacou ainda ao JE a injustiça da condição associada ao rendimento dos filhos no acesso ao CSI, lembrando que muitos nem têm relações de proximidade com os pais e, sobretudo, a dificuldade de inúmeras famílias com rendimentos acima do terceiro escalão em cumprirem com as suas próprias obrigações financeiras. Como tal, a associação defende que este complemento seja atribuído em função “unicamente dos bens do casal” reformado, o que abrange outras formas de rendimento que não a pensão.
“Um casal com pensões baixas mais com rendas de outras casas ou contas bancárias elevadas não se justifica que tenha acesso [ao CSI]; já ter em conta o salário dos filhos não é justo e torna o universo [de elegíveis] muito mais limitado”, afirma. Na realidade, e apesar dos rendimentos baixos da maioria dos pensionistas, “muitas vezes são os próprios pais e as pessoas mais velhas que ajudam os filhos”, esclarece.
Esta é uma reivindicação antiga da APRe, que vem alertando para a injustiça associada à mesma há alguns anos. Por outro lado, a associação pede também um maior esforço na divulgação desta prestação e das condições associadas, bem como uma política de maior acompanhamento das populações idosas e vulneráveis, projetando que o número de beneficiários possíveis seja substancialmente superior ao efetivo.
Relembre-se que, no atual desenho da medida, os rendimentos até ao terceiro escalão do IRS não contam para o apuramento da elegibilidade da medida, mas pensionistas com filhos que tenham rendimentos acima do terceiro escalão do IRS ficam excluídos de receberem CSI.
O universo reduzido de pensionistas que a alteração proposta pelo PSD abrange também é uma das críticas de Maria do Rosário Gama. Apesar de considerar medidas do género, que ajudem no combate à pobreza de populações vulneráveis, como positivas, a presidente da APRe ressalva que, segundo o líder parlamentar social-democrata, Joaquim Miranda Sarmento, apenas 170 mil pensionistas seriam elegíveis, “um universo bastante pequeno em relação aos dois milhões que recebem pensões muito baixas”.
Avanços e recuos minam proposta
O anúncio do líder do PSD gerou algumas dúvidas, dada a sensação que abrangeria todo o universo de pensionistas, e não apenas os beneficiários do CSI. Já após o congresso do partido, onde o presidente, Luís Montenegro, anunciou a medida, o líder parlamentar Joaquim Miranda Sarmento esclareceu que a proposta se referia à prestação social.
“A medida opera sobre o Complemento Solidário para Idosos, que é o tal complemento que faz o preenchimento da diferença até ao rendimento mínimo garantido”, reforçou o vice-presidente do partido, António Leitão Amaro.
Miranda Sarmento fala num acréscimo de despesa de dezenas de milhões de euros ou, no limite, pouco acima de uma centena. Para presidente da APRe, os avanços e recuos no anúncio acabam por minar a medida, ao gerar a expectativa junto de inúmeros pensionistas que seriam elegíveis, apenas para a verem contrariada no dia seguinte.
Apesar de discordar da condição de acesso relacionada com o rendimento dos filhos, Maria do Rosário Gama suspeita que os pensionistas que teriam direito a esta prestação social sejam mais do que os que efetivamente a recebem. Como tal, diz, urge um maior papel das autarquias no acompanhamento destas populações, esclarecendo-as dos seus direitos.
“Temos reforçado, junto do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, a necessidade de, em locais como as juntas de freguesia, terem o número de pessoas que vivem isoladas, com dificuldades, com pensões baixas, pessoas idosas, que vivem só ou em más condições. Esse levantamento deveria estar feito”, defende, argumentando que tal permitiria “uma atitude pedagógica das comissões locais de ação social, a informar as pessoas que poderiam recorrer” a este subsídio.
“Nas cidades, a situação é mais complicada. É preciso este trabalho de rua. O levantamento nas áreas rurais está feito pela GNR, mas nas cidades ainda é preciso”, remata.
O Complemento Solidário para Idosos é um apoio em dinheiro pago mensalmente aos idosos de baixos recursos, com mais de 66 anos e quatro meses e residentes em Portugal.