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"Código dos contratos públicos é uma das maiores aberrações que conheço", diz ex-bastonário dos engenheiros

Fernando Santo considera que é preciso haver um movimento que assuma que este código não serve os empreiteiros e apenas serve os juristas que o produziram e considera que neste momento o Estado e as autarquias não estão minimamente preparadas para ser donos de obra.

É mais uma crítica a juntar a outras sobre os vários problemas apontados pelos responsáveis do sector da construção em Portugal. Para o ex-Bastonário da Ordem dos Engenheiros, Fernando Santo, o atual código dos contratos públicos não beneficia nenhum dos players ligados ao mercado da construção e somente serve aqueles que o produziram, os juristas.

"O código dos contratos públicos é uma das maiores aberrações que conheço. Não me canso de dizer isto, já quando estava como Bastonário assisti à produção do código feito por juristas e para juristas à revelia de técnicos do sector, que ainda hoje se mantém. Tem que haver um movimento que diga que este código não serve os donos de obra, não serve os empreiteiros e não serve quem quer gerir obras e ter obras. Serve os juristas e principalmente os que o produziram", afirmou na conferência 'Forma Futura - uma reflexão sobre a construção', organizada pelo Jornal Ecónomico e a Transfor que decorreu no Teatro Miguel Franco, em Leiria na terça-feira.

De resto, Fernando Santo recuou no tempo para abordar o tema da crise da habitação em Portugal e que atingiu o sector da construção, que acabou por ser posto de parte por uma agenda política e da troika. "Além da crise do subprime em 2008 tivemos a falência do Estado português e chegou uma troika com um programa tecnocrata que não percebeu a dimensão política deste sector e como não perceberam isso o investimento publico ficou a meio, a habitação parou. Passamos de 125 mil fogos em 2002, para um mínimo de sete mil em 2014" sublinhou.

Como tal, a pergunta do ex-Bastonário da Ordem dos Engenheiros é óbvia: "Qual é o sector que resiste a isto?", acrescentando que foram poucas as empresas que resistiram, tendo sido perdidos 300 mil trabalhadores. "Alguns emigraram, outros reformaram-se e muitos foram para o desemprego. O poder político e a troika não quiseram saber porque a agenda era outra", realçou.

Por outro lado, Fernando Santo considera mesmo que o Estado e as autarquias salvo raras exceções não estão minimamente preparadas para ser donos de obra, dado que não existem interlocutores. "Isto é mau para as empresas, porque elas funcionam bem quando têm bons projetos e interlocutores. Quando não têm estão com um interlocutor que não sabe lançar concursos, não sabe avaliar propostas e não sabe dirigir uma empreitada", referiu.

Outra questão que continua a gerar preocupação no sector da construção face a toda a burocracia que é exigida ao nível das autarquias e do próprio país são os licenciamentos. "Enquanto não conseguirmos resolver isto os investidores estrangeiros desistem, a não ser que a intenção seja mesmo correr com eles", destacou Fernando Santo.

Para o ex-Bastonário não é possível fazer uma visão de futuro sem perceber como funciona este sector. "Quando olhamos para a construção é mais um conjunto de empresas que produz obras, é uma atividade de interesse nacional ao mais alto nível. Infelizmente, nem sempre foi assim", afirmou.

De resto, Fernando Santo vai mais longe e assume que se não conseguirmos olhar para a construção como uma atividade que tem como primeira missão servir a população ficamos muito mal na fotografia.

O tema da habitação foi outro dos pontos abordados, recordando que nos anos 70 esse problema já existia tal como temos hoje. "Na altura faltavam 500 mil fogos, produziamos 30 mil fogos por ano. Produzimos em média por ano 94 mil fogos entre 1996 e 2005. Nos últimos dez anos foram 13 mil fogos, apenas 14%", salientou.

Já nas obras públicas destacou que o país tem outro problema para resolver além do licenciamento, realçando que o Estado e as autarquias não estão preparados para responder às necessidades do sector. "Nos últimos 20 anos não ofereceram condições mínimas aos engenheiros. Perdemos uma área importante que era saber ensinar os mais novos com a experiência dos mais velhos".

Para o ex-Bastonário os portugueses não têm dinheiro para pagar as exigências que fazem às empresas de construção. "O sector está refém do poder político. O sector precisa de um plano com o Governo seja ele qual for", sublinhou.