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Tensão no Mar Vermelho aumenta, mas preços do petróleo resistem. Porquê?

Excesso de petróleo no mercado, aliado à falta de procura, ajudam a explicar, em parte, a razão pela qual os preços do crude não dispararam. Mas o cenário vai mudar rapidamente se os houthis decidirem atacar o estreito de Ormuz.

A tensão no Mar Vermelho continua a aumentar, mas os preços do petróleo dão mostras de estabilidade, apesar dos ataques dos rebeldes Houthis do Iémen manterem-se, em protesto contra a ofensiva militar de Israel na Faixa de Gaza.

Companhias de navegação e petrolíferas estão a cancelar esta rota e preferem ir pela rota de Vasco da Gama, via África do Sul, com os dias de viagem a aumentarem entre 10 a 15 dias.

O grande foco está no estreito Bab al-Mandab entre a Península Arábica (Iémen) e África (Djibouti), com cerca de 26 km no ponto mais estreito a separar os dois continentes, África e Ásia.

"Até à data, os ataques apenas levaram os petroleiros a serem desviados. O impacto nos fluxos comerciais de energia e a ameaça de um conflito mais alargado no Médio Oriente está a pesar no prémio de risco do preço atual do crude", segundo a DBRS.

Para já, a DBRS não mudou a sua previsão para este ano, esperando que o Brent atinja os 68 dólares por barril, mas "se o conflito aumentar e causar disrupção material na produção de petróleo, o preço do crude pode disparar significativamente".

Para a Allianz Global Investors (GI), "o maior catalista para os preços do petróleo - e para as ações de energia - viria se os rebeldes virassem o seu foco para o estreito de Ormuz, o canal entre Oman e o Irão", por onde passa diariamente um quinto do petróleo consumido em todo o mundo.

Estes ataques "representam uma grave ameaça ao comércio global", com cerca de um terço do comércio global de contentores a passar pelo canal do Suez, em navegação entre a Europa e a Ásia, segundo a casa de investimento alemã.

Já o líder de uma das maiores petrolíferas mundiais confessou estar surpreendido por os preços não subirem. "É uma situação muito série e parece estar a ficar pior", disse o CEO da Chevron em Davos, citado pela "CNBC".

"Os riscos são muito reais. Muito do fluxo mundial de petróleo passa naquela região e se houvesse um corte, penso que as coisas mudariam muito rapidamente. Temos de ficar atentos", afirmou Michael Wirth.

Para o analista Filipe Garcia, esta crise "acontece num momento relativamente bom. Temos os stocks de quase tudo bastante preenchidos, temos uma certa abundância de navios, o facto de haver uma travessia mais longa e um pouco mais dispendiosa acaba por não estar nem a perturbar nem as cadeias de abastecimento, nem os custos. Não é uma situação desejável, mas tendo em conta  a evolução dos preços do petróleo e da generalidade das commodities e relatos de escassez de bens o que vemos é que o impacto até ao momento não é significativo".
 
"Não está a ter nem impactos nos preços nem nas quantidades. Para já não vejo que esteja aí um problema tão grave, como faria prever. Com esta tensão no Médio Oriente, seria de esperar ter preços acima de 100 dólares, se não estamos a ter, é porque não há procura para isso", acrescentou o presidente da IMF - Informação de Mercados Financeiros, no podcast 'Mercados em Ação' do Jornal Económico.

A petrolífera britânica Shell anunciou esta semana que iria suspender a navegação através do Mar Vermelho. Há um mês, a BP tinha feito o mesmo.

Várias das maiores empresas mundiais de transporte marítimo de petróleo anunciaram a suspensão de rotas por esta região, como a Hafnia, Torm e Stena Bulk.

Pelo Mar Vermelho, passa 12% do comércio mundial de petróleo. Cerca de sete milhões de barris de crude e produtos petrolíferos passam por esta zona diariamente. Pelo estreito de Ormuz, passam 18 milhões de barris diários.

O Goldman Sachs já avisou que uma disrupção prolongada no estreito de Ormuz pode dobrar os preços do petróleo, mas considera este cenário improvável.

O CEO da companhia de navegação Maersk, Vincent Clerc, citado pela "Reuters", apontou, em Davos, que esta é uma "das mais importantes artérias de comércio global e da cadeia de abastecimento e está agora com problemas".

A própria Arábia Saudita, um dos maiores produtores mundiais de petróleo, já mostrou estar preocupada com o tema. "Se durar pouco, há petroleiros disponíveis, se durar muito, pode tornar-se num problema", disse o CEO da petrolífera estatal saudita Aramco, Amin Nasser.