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Quando o Natal desce sobre o destino de duas famílias de empresas

A celebração do Natal é um momento especial em qualquer família. Cada uma adapta as tradições à sua maneira e nas famílias donas de empresas subsistem as mesmas diferenças mas mais vincadas, afinal é o negócio que as une. Vamos visitar o Natal de duas dessas famílias, espreitando-as na sua intimidade e perceber melhor essas diferenças através de extremos – que podem não ser o que parecem.

O Natal perfeito da família Albuquerque?
A família Albuquerque está à frente dum grande negócio agrícola que começou há oito gerações atrás. Com vinho, azeitona, amêndoa, cortiça e um grande pomar, o portfolio resiste a oscilações de preço e intempéries. O pai Augusto, com 65 anos, dorme descansado como dormiam os antepassados e a família tira um dividendo substancial da herdade. E chegou o dia de Natal. A casa está engalanada com simplicidade e elegância – o presépio completo com musgo, luzinhas e a cabana e a árvore com os presentes à volta. Na mesa, o peru e todas as iguarias que se podem esperar da época. Começam a chegar os filhos e filhas, netos e netas. São dez adultos e oito crianças, bem-dispostos e excitados com o jantar e o serão.
O pai Augusto abre as hostilidades, trincha o peru e distribui-o por todos. Roda pela mesa uma magnum de reserva da herdade com três anos, 4,7 no Vivino. E depois logo outra e mais uma. A temperatura vai crescendo e a boa disposição também. O filho Diogo pergunta ao pai como está o vinho da vindima deste ano e a filha Lídia quer saber como correram as peras. E de repente a face do pai torna-se austera “hoje não se fala de negócios, é Natal e quero celebrar Jesus. E agora vejam lá esta aguardente que fizemos este ano”.
Augusto tinha há muito a sucessão arrumada. Dos dez filhos tem quatro que querem tratar da herdade, tinha ideia de dividir em talhões e deixar cada um tratar do seu. Todos os filhos, filhas, genros e noras acham muito bem, a sucessão é essencial. A família levanta-se, vai para o salão, o pai Augusto veste-se de Pai Natal, distribui os presentes e as crianças recolhem aos quartos da bicentenária mansão.
Os Albuquerque têm tido a vida perfeitamente arrumada porque Augusto soube preservar, reforçar e usar o legado dos antepassados para criar uma família com amor e educar os filhos. Sim, deu muito trabalho lutar pelo futuro da família. E quase que tinha conseguido...
Por trás dos sorrisos há muito que paira uma sombra sobre o futuro da herdade. “Meus filhos, recebi uma proposta dos nossos vizinhos. Vamos ter anos maus e para vocês terem algo para o futuro o melhor é vender já”. A estupefação atravessa os olhares dos filhos... e a seguir a desilusão. “A casa também vai?”, pergunta Catarina. “Tudo, vai tudo. Por isso, este é o último Natal que passamos juntos, pelo menos aqui”. Diogo e Alexandre baixam a cabeça – sabem que para os irmãos a culpa é deles, sobretudo com a fortuna que perderam na desastrosa política comercial dos vinhos.
A família Albuquerque desceu do Céu ao Inferno numa noite de Natal fria, mas estrelada, como a noite de Belém na Judeia. Augusto sai para o jardim abraçado à sua Constança. Olha para a casa, “oito gerações e tinha de acabar em mim”... Chora. Nunca mais será o mesmo homem.

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