Os jipes da UMM permanecem no imaginário nacional como a última/única marca portuguesa automóvel a circular nas estradas nacionais (mas houve mais antes).
Mas uma empresa portuguesa está a preparar o lançamento de um supercarro, no que será o regresso do país à produção de uma marca nacional, e a estreia lusa no mercado dos desportivos de luxo.
Um dos grandes objetivos da companhia é entrar no mercado dos Emirados Árabes Unidos, onde abundam os petrodólares e a procura por supercarros desportivos.
Para começar, alguns números do Adamastor Furia: vários sócios portugueses juntaram-se para criar a marca com um orçamento de 17 milhões de euros; cada ‘bomba’ vai custar 1,6 milhões de euros mais impostos; a velocidade máxima é de 300 km/h.
A companhia está atualmente a concluir a homologação de estrada para a Europa. Após a certificação, que espera até ao final do ano, a produção deverá arrancar em 2025.
Na versão de competição, a Adamastor está à espera de resposta por parte da Federação Internacional de Automobilismo (FIA), com o sonho a ser participar na prova mítica: 24 horas de Le Mans.
O CEO da empresa é Ricardo Quintas, co-fundador e um dos sócios. Em conversa com o Jornal Económico conta a história por trás da Adamastor, sediada em Perafita, concelho de Matosinhos, distrito do Porto.
Os fundadores começaram por criar vários protótipos, fruto da sua paixão por automóveis, mas em junho de 2019 tiveram de tomar uma decisão: “vamos para o mercado geral para concorrer com as grandes marcas e sem hipótese? Ou vamos apostar num nicho de mercado, nos supercarros?”.
A segunda hipótese vingou e a marca com nome de monstro mitológico avançou. “Estamos agora na fase de desenvolvimento do carro e no processo de homologação para pista e estrada. Assim que estejam concluídas, iniciamos a produção”.
“Temos fábrica montada para produzir 25 unidades por ano em Perafita, Matosinhos”, com mais de 2.200 metros quadrados e com um potencial de expansão até 5.000 m2.
“O valor orçamental está estimado em 17 milhões de euros, parte investido, parte por investir. Só a homologação envolve vários milhões. O valor é 100% dos acionistas: sou eu, o Nuno Faria, o Frederico Ribeiro, a Nataline Sousa, e a Elisa Quintas”, explicou Ricardo Quintas.
“Mantivemos o projeto em segredo até recentemente, cinco anos quase às escondidas. Assim que descobriram, tivemos o contacto de interessados tanto nacionais como estrangeiros”, acrescentou.
“Esperamos clientes de todo o lado, incluindo Portugal. Tivemos consultas de clientes portugueses e europeus. “O mercado-alvo é o dos Emirados Árabes Unidos”, mas “ainda não tivemos nenhum contacto”, afirmou, na conversa com o JE.
O promotor lamenta a falta de apoio ao projeto. “Os apoios ao Portugal 2020 e demais projetos foram todos negociados. Gastámos muito dinheiro em consultores, submetemos candidaturas: uns disseram que era um projeto sem mérito. desculpas, todas e mais algumas… recebemos zero”.
Atualmente, a companhia conta com 14 profissionais diretos, esperando estar a operar na capacidade plena no final de 2025/primeiro semestre de 2026, prevendo contratar então 108 trabalhadores.
Entre os concorrentes identificados, encontram-se marcas como a Aston Martin (Valkyrie), Pagani, a Koenigsegg, a Rimac, e os supercarros das marcas Mercedes-Benz, Audi, Porsche e Ferrari.
E qual o maior desafio encontrado? “Que acreditassem em nós nas feiras internacionais. Era o descrédito por sermos portugueses. Tivemos sorte, um parceiro acreditou em nós, um fornecedor de matéria-prima e no desenvolvimento de soluções”.
Já em termos de engenharia, o maior desafio foi o “valor dos softwares que tivemos de adquirir e licenciar. São softwares para determinados cálculos, todo o processo de aprendizagem foi difícil, foi preciso fazer tudo de raiz. As soluções para os moldes das peças… todos os processos foram complicados e com um orçamento extremamente limitado e com capitais próprios dos sócios. Desenhámos o carro em realidade virtual para não termos de investir dinheiro, pois se tivéssemos algum erro, o dinheiro seria perdido”.
A companhia também conta com outra empresa: a Adamastor Advanced Technologies que trabalha “no desenvolvimento de soluções para a mobilidade elétrica, outros projetos com energias renováveis, na área de aerodinâmica, o desenvolvimento de materiais compósitos com uma pegada carbónica mais baixa, e o desenvolvimento de combustíveis carbono neutro. É tentar abraçar a maior área possível de valências, e o maior número de oportunidades possíveis”.
A sua relação com os automóveis começou desde tenra idade, em 1973, quando o seu pai ofereceu-lhe um carrinho de pedais. Então, fez uma promessa a um amigo de que um dia iria construir o seu próprio ‘carrinho’. “A promessa demorou 50 anos…”. No entanto, recorda com carinho o seu primeiro automóvel, um Volkswagen Golf.
Ricardo Quintas pertence à família que detém o grupo Quintas com investimentos no imobiliário, ambiente ou seguros, empresa sediada no Porto. A génese do negócio de família tem origem em 1924 em Póvoa de Varzim.
Um dos processos mais complicados é o de homologação do veículo, com a empresa a esperar que o processo esteja resolvido “até ao final deste ano” para ter “todos os trâmites ultrapassados”, reconhecendo que uma das maiores dificuldades de um automóvel são as “questões burocráticas”. “Imagine se tivéssemos mais orçamento e menos burocracia”.
Para já, o objetivo é homologar a viatura na Europa, para depois realizar a homologação de acordo com as “regras americanas”, possibilitando a entrada nos mercados das Américas do Norte, Central e do Sul e depois da Ásia e da Oceânia.
O empresário espera obter ‘luz verde’ o “mais rapidamente possível”, pois o tempo urge: “daqui a dois anos o nosso plano é apresentar ao mercado um projeto novo”, pois “este é um mercado de nicho, mas que exige inovação constante”.
A meta é produzir 60 unidades de cada projeto na versão de estrada, mas que na “vertente de competição” não existe essa limitação. “Na versão homologável é preciso agraciar o mercado com novos projetos, estar na crista da onda tecnológica”.
Em termos de competição, a empresa está a fazer testes com a versão de competição, mas que ainda aguarda pela homologação da FIA, a Federação Internacional de Automobilismo.
No futuro, o sonho é participar nas 24 Horas de Le Mans e que a marca está a fazer “todos os esforços” para participar nos “campeonatos europeus na categoria de resistência”.
O responsável elogia a sua equipa constituída em grande parte por profissionais portugueses que se formaram cá, mas que foram trabalhar para fora, inclusive na Fórmula Um.
“O nosso responsável de aerodinâmica, o carro foi desenhado a partir dele. Tem experiência da Red Bull Advanced Engineering, e da Aston Martin, e participou no desenvolvimento de vários Fórmula Um”.
O responsável também destaca vários engenheiros que “trabalharam em equipas de competição da Porsche, Aston Martins, Mercedes ou BMW”, e engenheiros que foram “pilotos de alta competição” e mecânicos que trabalharam no Campeonato do Mundo de Ralis.
Já os parceiros são também fornecedores de equipas de F1, e “validaram todos os nossos números”. Já o “monocoque é semelhante ao de um F1 em termos estruturais, dando garantias ao nível de segurança, semelhante ao de um F1”.
Ficha técnica – Adamastor Furia
Chassis: Fibra de carbono
Dimensões exteriores
Comprimento: 4.560 mm
Largura: 2.212 mm
Altura: 1.098 mm
Peso: 1.100 kg (dry na versão Race)
Largura de vias
Dianteira: 1.755 mm
Traseira: 1.705 mm
Distância entre eixos: 2.800 mm
Suspensão
Geometria: triângulos duplos desacoplados, mola helicoidal sobre amortecedor
Afinações possíveis: toe, camber, caster, altura ao solo, roll s ffness, bump s ffness
Motor
Arquitetura: 6 cilindros em V, biturbo, de origem Ford Performance
Cilindrada: 3.5 litros
Potência máxima: + 650 cavalos
Binário máximo: + 571 Nm
Combustível: Gasolina; compatível com combustíveis sintéticos
Velocidade máxima: superior a 300 km/h na versão de estrada
Aceleração de 0 a 100 km/h: cerca de 3,5 segundos
Aceleração de 0 a 200 km/h: cerca de 10,2 segundos
Downforce máximo
Race: 250 km/h – 1.800 kg
Road: 250 km/h – 1.000 kg
Travões
Discos de 378 mm à frente e de 356 mm atrás. Pinças de 6 êmbolos à frente e de 4 êmbolos atrás.
Variação da força de travagem disponível na versão Race.
Equipamento de série
ABS e TC
Opções de personalização:
A Adamastor permite uma grande liberdade de personalização do Furia, inclusivamente no design interior.
Produção prevista:
Série limitada de 60 unidades
Preço da versão de estrada (road legal):
Estimado em 1,6 milhões de euros + impostos