É com uma abordagem mais preventiva e um menor papel da Autoridade Tributária (AT) e Segurança Social, credores permanentes em todas as empresas, que alguns especialistas ouvidos pelo Jornal Económico (JE) perspetivam os processos de insolvência e mecanismos de pré-insolvência.
Na conferência do JE Advisory dedicada ao tema, que se realizou na segunda-feira, os oradores apresentaram ainda sugestões para a melhoria da competitividade de Portugal, após a divulgação de um estudo preliminar sobre insolvências e pré-insolvências [Processo Especial de Revitalização (PER) e Processo Especial para Acordo de Pagamento (PEAP)].
O docente académico João Pedro Pinto-Ferreira, investigador de Direito da Insolvência, explicou que, no âmbito do projeto IN-SOLVENS, as empresas foram desafiadas a avaliar o papel dos diversos intervenientes e concluíram que os advogados, o juiz e os credores merecem nota mais positiva, enquanto a banca, o fisco e a Segurança Social ficaram no fim da tabela.
Questionadas sobre o processo de insolvência, as empresas inquiridas valiam pior a rapidez e o potencial de recuperação de crédito (entre 1,7 e 1,8 numa escala de zero a seis). No PER, destaca-se positivamente a manutenção dos postos de trabalho nos processos de reestruturação. “Em mais de metade dos casos (53%), o encerramento do processo deveu-se à insuficiência da massa insolvência”, afirmou João Pedro Pinto-Ferreira, um dos coordenadores desta investigação do CEDIS (Nova).
O presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Judiciais (APAJ) aproveitou o momento de debate, que se seguiu à apresentação das principais ideias do estudo, para criticar a indisponibilidade dos créditos do Estado prevista na lei, o que significa que, quando uma empresa entra em PER, tem de saber que não há flexibilidade nos pagamentos ao Estado para lá do que define a lei. Isto é, a AT recebe tudo - incluindo juros - em 150 prestações. No que toca à Segurança Social, existe alguma flexibilização nos juros, reconheceu.
“Quando uma empresa pensa em ir para PER tem de saber que não pode contar com os credores AT e Segurança Social”, referiu António Emílio Pires, acrescentando que “não há margem para negociar com o credor Estado”. A Lei Geral Tributária prevê que “o crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária”, sintetizou. Para o presidente da APAJ, o facto de o Estado e a Segurança Social serem, de facto, o credor principal da grande maioria dos PER, às vezes constitui um grande fator de insucesso dos planos.
O advogado Francisco Patrício, sócio e membro do conselho de administração da Abreu, deixou o alerta de que as pequenas e médias empresas (PME) têm poucos mecanismos inovadores de apoio em Portugal, nomeadamente um mercado secundário, como existe noutros países da Europa. Nesse sentido, chamou a atenção para o facto de não existirem essas alternativas, como emissões de obrigações com PME, às quais possam recorrer para tentar recuperar antes de entrar em insolvência. “Estamos atrasados. Não há um mercado secundário como noutros países”, declarou, durante a sessão no Hotel Intercontinental, em Lisboa.
Na mesma linha de pensamento, o vice-presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE) defendeu que os incentivos em Portugal “não estão alinhados” para o país se tornar mais forte e competitivo no cenário internacional. “Estamos a promover projetos empresariais iguais ao que já existiam, em que não há grande risco, e a filtrar, por meio de um conjunto de incentivos errados, um conjunto de projetos que não são os mais inovadores e mais competitivos. Seguramente, seria o futuro em que este país devia estar a apostar. Não há inovação nem novos modelos sem risco, sem contratação de risco”, justificou Gonçalo Simões de Almeida.
Na opinião do vice-presidente da ANJE e sócio da KGSA, há que começar por uma mudança de mentalidade. “A forma como os bancos tratam a dívida e calculam os juros do financiamento, por exemplo. Começar pela dívida em vez de começar pelo devedor”, exemplificou.