O projeto do PS, que baixa as taxas do IRS entre 0,25 pontos e 1,5 pontos até ao sexto escalão, teve luz verde do Parlamento na votação final global realizada nesta quarta-feira, 12 de junho, com os votos a favor do PS, PCP, BE, PAN, Livre e Iniciativa Liberal e abstenção do Chega, confirmando a votação, realizada na semana passada, na especialidade ao diploma, que deixa de fora o alívio fiscal para os sétimo e oitavos escalões de rendimento.
O figurino do alívio do IRS, que foi aprovado no Parlamento e contou também com o apoio da Iniciativa Liberal, vai contra a vontade do Governo e inviabiliza o corte de taxas do imposto nos sétimo e oitavo escalões (salários entre 3.100 e 6.000 euros brutos), numa proposta que voltou a ser chumbada na votação final com os votos contra da esquerda e do PS e a abstenção do Chega.
Das propostas do Bloco de Esquerda, foi aprovada, nesta quarta-feira, a que preconiza a atualização da dedução específica (que está há vários anos 'congelada' nos 4.104 euros) dos rendimentos de trabalho e pensões à taxa de atualização do Indexante de Apoios Sociais (IAS).
Também a proposta da AD de atualização dos escalões de IRS à inflação e produtividade, de 2025 em diante, teve luz verde dos deputados.
O braço de ferro entre a AD e PS
O braço de ferro entre AD e PS esteve na abrangência do alívio fiscal, após os partidos que suportam o Governo se terem aproximado aos socialistas e ao Chega, com maiores reduções nos escalões mais baixos e igualando as taxas do terceiro e quarto escalões: 22% e 25%, respetivamente (menos 0,5 pontos percentuais em cada escalão, face à proposta inicial do Governo). A AD não abdicou, no entanto, da descida nos rendimentos mais altos, rejeitada pelos socialistas nos sétimo e oitavo escalões (entre 3.100 e 6.000 euros).
Indo ao encontro do PS, no sexto escalão, para retribuições entre 27.146 e 39.791 euros brutos anuais, os partidos que suportam o Governo fizeram também uma redução menor para acomodar a margem orçamental, mas ficaram ainda com a taxa do imposto ligeiramente abaixo do pretendido pelos socialistas: em vez de baixar 3 p.p., de 37% para 34%, ajustaram parar uma redução menor, de apenas 1 p.p., para 35%, contra os 35,5% propostos pelo PS, que reduziram também em 0,5 pp a sua proposta inicial de 36%, igualmente numa tentativa de se aproximar do PSD.
A diferença entre as propostas do PS e da AD reside, assim, em quatro escalões de IRS, com os socialistas a proporem descida do IRS até ao sexto escalão, que abrange salários brutos mensais até 3.100 euros, com um recuo maior no segundo escalão (16,50%) face à AD (17,50%) e no sexto patamar com uma taxa de 35,50%, enquanto PSD e CDS queriam descer esta taxa até 35%.
O PS acabou ainda por deixar cair a proposta do PCP de transformação do Adicional de Solidariedade num novo e 10º escalão permanente, com uma taxa que iria até 53% sobre o rendimento coletável. E passou a prever uma alteração nos tetos dos 7º, 8º e 9º patamares de tributação para corrigir uma alteração introduzida pelo OE2024 e que iria fazer com que os trabalhadores do penúltimo escalão pagassem mais 2,5% de imposto, o correspondente ao Adicional de Solidariedade, além das taxas normais do IRS.
Ainda que tenha sinalizado a intransigência quanto ao corte de taxas no sétimo e oitavo escalões, como proposto pelo PSD e CDS, o PS acabou por apresenta uma solução que, diz, vai proporcionar um alívio fiscal para o 7º nível de rendimentos. Isto porque encurtou o intervalo dos ganhos sujeito àquela taxa mais alta (43,5% e 45%), ao passar, no sétimo escalão, de um intervalo de rendimentos entre 39.791 e 51.997 euros para uma fasquia entre 39.791 e 43.000 euros. Mas o atual oitavo escalão (entre 51.997 até 81.199 euros) passa a abarcar um maior intervalo de rendimentos (de 43.000 até 80.000 euros), o que poderá agravar o imposto dos contribuintes afetados por esta alteração de intervalos de rendimentos.
Os próximos passos
Concluído o processo legislativo com a aprovação dos novos escalões do IRS, os serviços da Assembleia da República têm agora de enviar a lei para Belém, tendo o Presidente da República 20 dias para promulgar ou vetar, devolvendo, neste caso, a iniciativa ao Parlamento. Só depois do diploma promulgado é que o Governo poderá atualizar as tabelas de retenção para que os contribuintes sintam o efeito no rendimento disponível ainda este ano.
Marcelo Rebelo de Sousa poderá requerer ainda a fiscalização preventiva da constitucionalidade, tendo, para o efeito, oito dias a contar da data da receção do diploma.
Esta iniciativa levaria a lei a não entrar em vigor antes de o Tribunal Constitucional se pronunciar no prazo de 25 dias, mas só será desencadeada se o projeto dos socialistas para redução do IRS violar a norma-travão, ou seja, provocar um aumento das despesas ou diminuição das receitas previstas no Orçamento do Estado para este ano.
Norma-travão não terá sido violada
Tal parece, porém, estar afastado, dado que já conta com o respaldo dos serviços do Parlamento, pelo despacho de admissibilidade da proposta, assinado pelo presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco. Isto porque o projeto de lei do PS não implica uma diminuição do IRS no ano económico de 2024, pois a liquidação dos rendimentos de 2024 só é feita em 2025, pelo que o impacto só se irá sentir no próximo ano.
A líder do grupo parlamentar do PS admitiu, na semana passada, após a aprovação do projeto socialista para o IRS na especialidade, que poderá violar a norma-travão, ao referir que “é uma questão constitucional complexa”. Alexandra Leitão explicou, no entanto, que “os serviços da Assembleia da República aceitaram todos estes projetos, considerando que não violavam a lei travão” e assegurou que “estamos na margem dos 348 milhões de euros que o Governo deu na sua proposta”.
Isto porque a descida de IRS, que teve ‘luz verde’, resulta de uma iniciativa legislativa da oposição e é nesse sentido que pode estar em causa a lei travão, que impede os deputados de aprovarem leis que promovam o aumento de despesa ou a redução de receitas, enquanto está em vigor um Orçamento do Estado. Já a proposta do Governo, que acabou por não ser votada na generalidade, baixando à comissão, foi chumbado o texto de substituição que o PSD e o CDS apresentaram na parte relativa à nova tabela.
Bola do lado do executivo
A bola estará agora no lado do executivo de Montenegro, dado que, para fazer chegar este ano o alívio nos descontos que os trabalhadores fazem todos os meses para o IRS, terá de alterar as tabelas de retenção na fonte, uma competência do Ministério das Finanças.
Com a redução do IRS a ir à votação final global a 12 de junho, quando o governo pretendia fechar este dossiê até final de maio, resta agora saber se as famílias podem contar com tabelas de retenção na fonte ajustadas a 1 de julho ou só com uma entrada em vigor em agosto ou mais tarde, pois essa é uma decisão tomada por despacho pelo membro do Governo responsável pela área das Finanças.
Proposta do PS supera em quase 90 milhões de euros a do PSD
Segundo fonte do grupo parlamentar do PSD, o alívio fiscal agora aprovado representa um impacto orçamental de 550 milhões de euros, entre 2024 e 2025. A maior fatia de 348 milhões de euros deverá ocorrer este ano com a descida das tabelas de retenção na fonte, em linha com a margem orçamental prevista pelo Governo para a redução intercalar do IRS. A restante fatia (202 milhões) chegará ao bolso dos contribuintes com o aumento dos reembolsos, em 2025.
O impacto orçamental da redução do imposto nos moldes do PS supera, em 87 milhões de euros, a proposta do Governo de Luís Montenegro para a redução do IRS, que sinalizou um custo de 463 milhões de euros, entre a descida das tabelas de retenção na fonte (impacto de 348 milhões já este ano) e o aumento dos reembolsos em 2025, que implicaria uma despesa adicional de, pelo menos, 115 milhões.