Paris não se resume ao Eliseu, às intrigas da ‘corte’ e sucessivas crises políticas. Também simboliza o que de melhor há na expressão “à grande e à francesa”. É precisamente o que se espera do encontro entre o arrojo de Jean Nouvel e o legado de Haussmann, a mais recente provocação criativa da Fundação Cartier, no nº 2 da Place du Palais-Royal – et oui!, mesmo junto ao Louvre. A inauguração, com pompa e merecida circunstância, tem lugar a 25 e 26 de outubro.
Falamos na nova casa da Fondation Cartier pour l’Art Contemporain. Uma explosão de ousadia arquitetónica. A fachada, de 1855, projetada pelo barão Georges-Eugène Haussmann, no âmbito de um radical projeto de reforma urbana, lançado pelo imperador Napoleão III, mantém o seu esplendor.
O arquiteto Jean Nouvel – desafiado pela Fundação a reimaginar esta pérola haussmanniana – entendeu, no exterior, preservar património e história. Aqui se instalou o primeiro hotel de luxo parisiense, inaugurado a tempo da Exposição Universal de 1855. A popularidade das lojas de luxo no piso térreo e mezzanine foi tal que o hotel acabou por mudar de morada para ali nascerem os Grands Magasins du Louvre. Os tais que não escaparam ao radar do escritor Émile Zola, que neles se inspirou para ambientar a obra “Au Bonheur des Dames”.
Nova vida, novo capítulo. Isto para dizer que Nouvel deixou a fachada do edifício intacta e esvaziou o interior, libertando 8.500 m² para espaços públicos, incluindo 6.500 m² para exposições. Objetivo? Explorar todas as possibilidades dentro da estrutura existente. Como? Através de cinco plataformas móveis gigantes em aço reciclado, que ocupam quase todo o ‘miolo’ do edifício. Suportam obras grandes e pesadas, e permitem múltiplas combinações, soluções expositivas quase infinitas. Plasticidade é a palavra chave. O céu, esse, não é o limite. Ou, como realçou Nouvel, assim se revela “o potencial de transformação, adaptação, reconfiguração e mudança” do edifício.
Jean Nouvel já havia sido o arquiteto convidado a imaginar o primeiro espaço da Fondation Cartier em Paris, inaugurado em 1994, no Boulevard Raspail. Ali, o arquiteto – Prémio Pritzker 2008 – queria “apagar as fronteiras entre o museu e a cidade”. No novo espaço, com enormes janelas salientes na Rue de Rivoli e na Rue Saint-Honoré, o desejo de criar porosidade mantém-se, ligando a intimidade do espaço com a vida da cidade.
Não é um museu, é um lugar para o inesperado
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A arte contemporânea tem um novo templo no coração de Paris, mesmo junto ao Louvre. Jean Nouvel reinventa a noção de espaço, Haussmann brilha na fachada e a Fondation Cartier pour l’Art Contemporain desafia a gravidade. E enriquece a oferta cultura na capital francesa.