A ilha da Madeira ficou ligada a um dos casais reais mais conhecidos e tristemente célebres do século XIX: o arquiduque Maximiliano de Habsburgo, irmão mais novo do imperador Francisco José, e a sua mulher, Carlota da Bélgica, filha do rei Leopoldo. Maximiliano, nascido em Viena, em 1832, é o paradigma do homem de cultura do século XIX. Cultiva uma paixão pela botânica e faz transportar para o seu parque plantas de todo o mundo, enche a sua biblioteca com os melhores livros do seu tempo, planifica uma viagem científica de circum-navegação, toca órgão, dedica-se ao estudo e à escrita e orienta ele próprio a construção do seu castelo de Miramar, em Trieste. A sua índole romântica foi particularmente tocada pela paisagem madeirense, que descreve de forma tão entusiasmada que terá levado a sua cunhada Sissi a partir para lá, em 1860, sem a companhia do marido e à revelia da corte austríaca.
Ao casar com Maximiliano, a princesa belga Carlota de Saxe-Coburgo e Gota não só se tornou arquiduquesa da Áustria como teve de partilhar as inúmeras vicissitudes do destino do seu marido, da perda do Reino da Lombardia-Venécia aquando da integração no Reino de Itália, à aceitação da coroa imperial mexicana, por insistência de Napoleão III, e que haveria de levar à morte prematura e violenta de Maximiliano, às mãos dos republicanos mexicanos, apoiados pelos Estados Unidos da América. Carlota acabaria por enlouquecer e viver uma longa e penosa vida de alienação.
“Memórias da Minha Vida – Um Inverno na Madeira”, editado pela Sopa de Letras, reúne textos em registo diarístico, de cada um dos membros do casal. A primeira estadia de Maximiliano na Madeira dá-se aos 20 anos quando, ainda solteiro, se deixa deslumbrar pela paisagem da ilha: “(…) a cada passo, nesta bela ilha, conhecem-se novas riquezas da Natureza e fica-se arrebatado pelos extraordinários charmes deste paraíso rodeado de mar” ou “à tarde, fui no meu trenó de quatro lugares à cidade para fazer várias compras: os famosos embutidos, os pontiagudos barretes madeirenses com pára-raios, e cadeiras de braços feitas de vime para as nossas varandas”. Regressaria sete anos mais tarde, em 1859, a caminho do Brasil.
Por razões de saúde, Carlota, que já o acompanha nesta segunda viagem, fica retida três meses no Funchal, aguardando o regresso do marido. O retrato que faz da sociedade funchalense oitocentista alterna entre o sarcasmo próprio de um certo sentido de superioridade e a curiosidade genuína pelos costumes da alta burguesia e da aristocracia locais.