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Gigante do jogo online Betano leva à SIBS o "problema" dos pagamentos a operadores ilegais

Alta tributação, regulação algo lenta e incapacidade de bloquear pagamentos a operadores ilegais são motivos de preocupação para a Kaizen Gaming (Betano) em Portugal. Mas o grupo grego quer levar "o problema" à dona do MBWay, a SIBS, para encontrarem uma forma de resolver o problema. "É uma questão de tempo", diz responsável ao JE.

Portugal é um dos mercados mais rentáveis do grupo de apostas online Kaizen Gaming, que opera em território nacional com a marca Betano. O grupo, que já investiu entre 40 e 50 milhões de euros no nosso país, planeia reforçar a equipa e chegar ao final do ano de 2023 com cerca de 600 trabalhadores no mercado português. Mas há nuvens a pairar no horizonte, algumas vindas já de longe.

Para começar, os impostos em Portugal sobre o jogo online são anormalmente altos – quando comparados com outros países europeus. Em Portugal a tributação das apostas desportivas assenta nas vendas brutas (um caso quase único entre os outros países europeus, que costumam tributar as receitas brutas).

Depois, o regulador em Portugal até é relativamente rápido a bloquear os IPs (as moradas online) dos operadores de jogo online sem licença (portanto, ilegais), mas a SIBS – a dona do MBWay – tem-se mostrado sido incapaz de bloquear os pagamentos feitos a estas empresas, muitas delas baseadas em paraísos fiscais, comentam vários responsáveis da Kaizen.

E isso significa que Portugal é um mercado cada vez menos atraente? Na Kaizen Gaming diz-se que não, que estão em Portugal para o longo-prazo, com patrocínios nas camisolas dos principais clubes – Benfica, FC Porto e Sporting – iniciativas de responsabilidade social e até uma futura Fundação Kaizen.

Quem o diz é Panos Konstantopoulos, vice-presidente da Stoiximan (marca operada pela Kaizen Gaming na Grécia e no Chipre) e chefe da comunicação corporativa, em conversa com o Jornal Económico em Atenas, no campus do grupo. A empresa, sublinha, não vê grandes obstáculos ao negócio em Portugal, mas há lutas a travar.

“Não vemos nenhum obstáculo. A única coisa em que temos de trabalhar – todos juntos, porque nos afeta a todos, regulador, governo e operadores licenciados – é o mercado negro. Precisamos de proteger o cliente final, temos que proteger o país e o governo, porque estão a perder impostos, estão a perder receita por parte de jogadores que preferem um operador não licenciado. E, claro, esses jogadores estão a pôr em risco seu próprio dinheiro, porque para eles não há regulador, não há ninguém a supervisionar. Ninguém garante que se você ganhar 1.000 euros receberá seu dinheiro. Isso não acontece com o operador licenciado. Esse é o único desafio que todos temos que enfrentar. E até vocês, os meios de comunicação, os jornalistas,  têm que torná-lo público, porque isso afeta-nos a todos”, salienta o responsável.

É claro que o jogo em operadores ilegais pode ser um fenómeno agravado pelos impostos altos sobre o jogo online em Portugal, já que os operadores licenciados refletem sobre o jogador ou os 8% que o Fisco aplica sobre as vendas brutas das apostas desportivas ou os 25% tributados sobre as receitas brutas no caso dos jogos de casino.

“Esta é uma decisão que [a Kaizen] toma quando entra num mercado. É um risco calculado. Há uma tributação alta sobre os operadores de gaming em Portugal? Claro que há. Você geralmente encontra nos mercados europeus a tributação baseada no GGR (receitas brutas do jogo). E Portugal é uma exceção, juntamente com a Polónia, em que os impostos são aplicados sobre as vendas brutas (no caso das apostas desportivas). Isso torna o mercado menos atraente? Sim, talvez. Mas se você quiser ser uma empresa que opera em ambientes licenciados, isso é algo que é um pré-requisito”, explica o vice-presidente. A Betano em Portugal paga – tal como os outros operadores – 8% sobre as vendas brutas no caso das apostas desportivas e 25% sobre as receitas brutas no caso de casino.

É uma questão, sublinha Panos Konstantopoulos, de identificar os números e decidir se estes fazem sentido para o investimento. “Tens de construir a marca, tens a pagar os impostos e, claro, tens de construir um negócio sustentável. Se és bom – e nós somos bons – então conseguimos ter lucros no mercado português”, conclui.

Os lucros em Portugal são números que a Kaizen Gaming se recusa a revelar – a empresa alega que não tem obrigação de o fazer por não estar cotada em bolsa e por não ter emissões obrigacionistas. Também não revela as receitas nem o volume de prémios pagos aos jogadores em Portugal, remetendo a divulgação oficial desses indicadores para o regulador. Mas o ambiente no campus da Kaizen Gaming em Atenas face a Portugal é de grande otimismo.

O espanhol Julio Iglesias Hernando, chief commercial officer (máximo responsável da área comercial) da Kaizen Gaming, está convencido que a empresa vai ser o principal operador do mercado português em pouco tempo, destronando a BWin. “Não tenho dúvidas que seremos líderes de mercado nos próximos anos”, afirmou o CCO, num inglês com um forte sotaque castelhano. Como? “Temos a mesma filosofia em todos os mercados, proporcionar um melhor produto. No fim do dia, é isso que conta: uma plataforma rápida, fácil de entender por parte do apostados, que aceita a tua aposta rapidamente, que te paga rapidamente, sem muita complexidade”. E isso resulta de um investimento, que em Portugal tem sido de dezenas de milhões de euros por ano.

Face à mesma pergunta sobre a liderança no mercado, Panos Konstantopoulos brinca: “Como é que pretendo chegar a líder de mercado em Portugal? Quero dizer… Se é que não somos já neste momento”, diz, entre risos. “Agora a sério, devia perguntar isso ao regulador. Mas de acordo com nossos cálculos e números, estamos nos dois principais operadores, sim”.

“Na minha opinião é uma questão de tempo, já que acredito que não vamos mudar a forma como servimos o cliente final. Vamos continuar a melhorar os nossos produtos. Em combinação com o plano de marketing que o Julio Hernando e a sua equipa têm para o mercado, com os ativos que nós temos, os clubes de futebol, com o extenso plano de CSR (responsabilidade social) e a Fundação Kaizen que vamos implantar nos próximos meses. Tudo isto, todos estes são fatores muito, muito importantes para o sucesso da empresa. Acredito fortemente que é uma questão de tempo. E estamos a chegar lá”, remata o vice-presidente.

E no combate ao jogo ilegal? Em Espanha, por exemplo, é bastante fácil bloquear pagamentos ilegais [a operadores não licenciados] porque o Bizum, o equivalente ao MBWay em Portugal, não aceita pagamentos para essas empresas. Mas o MBWay aceita.

A Kaizen Gaming diz que tem estado em diálogo com várias entidades – sobretudo através da Associação Portuguesa de Apostas e Jogos Online (APAJO) – e admite trabalhar com a SIBS, a detentora do MBWay, para encontrar uma forma de ajudar a resolver o problema.

“Acredito que eles estão a trabalhar nisso. E esta é uma opinião pessoal, você não pode adiar esse tipo de medidas que protegerão os jogadores. É preciso proteger o jogador e, já agora, proteger a receita fiscal do Estado” [português]. Panos Konstantopoulos diz que já houve contactos do grupo com a SIBS e sublinha que esse alinhamento com as melhores práticas noutros mercados europeus "é uma questão de tempo".

A Kaizen Gaming já falou ou não com a SIBS sobre este problema? “Sim, sim. Claro. Eles têm uma equipa muito competente. É uma questão de tempo”, revela. O Jornal Económico, entretanto, apurou que está marcada para breve uma reunião entre representantes da Kaizen Gaming (Betano) junto da SIBS para sensibilizar para o problema. Qualquer trabalho conjunto nesse sentido não terá, por isso mesmo, ainda começado.

O jogo online ilegal em Portugal não é uma preocupação exclusiva da Kaizen Gaming. Na verdade, todos os operadores que estão licenciados (e que, portanto, pagam impostos pelas receitas obtidas). Em entrevista recente ao Jornal de Negócios, o diretor da Solverde.pt, Américo Loureiro, manifestou a sua preocupação em relação a esta prática, realçando que as autoridades têm de fazer mais para combater um fenómeno que deixa os jogadores desprotegidos e "rouba" receita fiscal ao Estado.