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Fiscalistas defendem redução dos impostos do PSD e abrem porta a reforma fiscal

As propostas do PSD para aliviar a carga fiscal dos portugueses são hoje debatidas no parlamento. Sociais-democratas dizem que será o "teste do algodão" ao alívio do IRS prometido pelo ministro das Finanças. Fiscalistas ouvidos pelo JE aplaudem medidas de redução da carga fiscal, mas defendem que são insuficientes e falam na necessidade de uma nova reforma fiscal dos impostos que recaem sobre as famílias e também sobre as empresas.

As cinco iniciativas sobre redução fiscal que o PSD anunciou a meio de agosto são discutidas no Parlamento nesta quarta-feira, 20 de setembro. Os sociais-democratas já sinalizaram que o PS terá o seu "teste de algodão" na votação das suas propostas de redução impostos, pedindo um "abalo de consciência" para aprovar o desagravamento da carga fiscal "prudente, mas significativo", que representa um corte de 1.200 milhões no IRS, cuja receita, nas contas do partido, deverá atingir um excesso entre 1.300 e 1.800 milhões de euros. O Jornal Económico entrou em contacto com fiscalistas que aplaudem as medidas, que passam por um desagravamento de impostos já este ano através de uma mexida nos escalões, mas consideram insuficientes, abrindo a porta à necessidade de se fazer uma reforma fiscal.

O fiscalista João Espanha aponta que "tem algumas medidas interessantes, mas não é uma medida fiscal de todo. O que basicamente temos são a proposta de alívio de IRS e a questão do IRS jovem".

"Aquilo que o PSD propõe não me parece mau, parece bem melhor do que o PS anda a fazer. Temos um confronto entre dois modelos de sociedade, uma sociedade em que tiramos tudo às pessoas para devolver sobre a forma de subsídios ou uma sociedade em que deixamos a economia funcionar e as coisas correrem de forma natural ", defende o especialista.

Já Samuel Fernandes de Almeida, sócio da área de fiscal da VdA,  considera que "são meras orientações para uma reforma fiscal futura".

Avaliando cada proposta, o especialista refere que, por exemplo, "a redução em 1,2bi a aplicar em 2023 dos escalões de IRS é obviamente uma medida positiva, pois reduz a taxa de esforço fiscal para boa parte dos portugueses, exceto os do último escalão".

Quanto à obrigatoriedade de atualização dos escalões indexado à inflação, Samuel Fernandes de Almeida diz que é uma "excelente medida, pois só aí o Estado teve um ganho “injustificado” de 500 milhões de euros em 2022". No que diz respeito ao desagravamento fiscal dos bónus de produtividade, o fiscalista afirma que "é um incentivo positivo, mas talvez fosse de implementar taxas fixas reduzidas em função dos valores (por exemplo 10% até X e 20% acima de um determinado teto)".

Em suma, conclui o fiscalista da VdA, tratam-se de medidas na boa direção, mas claramente insuficientes. Falta saber qual a verdadeira dimensão da reforma fiscal do PSD, embora tenha tido o enorme mérito de forçar o debate público sobre a tributação excessiva em Portugal".

O fiscalista Rogério Fernandes Ferreira aponta ao JE que "as medidas de reforma fiscal recentemente propostas por um dos partidos da oposição, abriram a discussão acerca da viabilidade, da coerência e do resultado efetivo que as mesmas podem promover no dia-a-dia das pessoas e nas contas do Estado".

"As reformas fiscais dignas desse nome, enquanto alterações estruturais, têm surgido de 30 em 30 anos, tendo a última sido introduzida pelo Professor Pitta e Cunha em 1989, no âmbito da tributação direta e ao nível do IRC e do IRS. Estamos, portanto, em tempo adequado para novas alterações", considera o ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

Segundo Rogério Fernandes Ferreira, "todas as medidas se destinam a aliviar carga tributária sobre os contribuintes individuais sem provocar impacto orçamental e em função de um alegado excesso da receita fiscal cobrada pelo Estado em face da inicialmente prevista no Orçamento de Estado para este ano".

No que diz respeito ao desempenho e à produtividade, este fiscalista remata: "existirão certamente outras medidas (não fiscais) a ponderar e a preocupação de a isenção fiscal proposta sobre os prémios poder levar à substituição de remuneração base por meros para evitar a tributação".

Recorde-se que o Governo já prometeu  levar a avante a estratégia de desagravamento fiscal em sede de IRS, tendo o ministro das Finanças,  durante a apresentação do Programa de Estabilidade (PE), em abril, se comprometido com um alívio do IRS acumulado superior a dois mil milhões de euros até 2027.

O que propõe o PSD?

O PSD insiste na já conhecida medida de redução de 1.200 milhões no IRS. Uma proposta que se justifica, segundo o deputado social-democrata Hugo Carneiro, pelas condições que Portugal tem hoje que "não tinha há um ano" e que geram a necessidade de "fazer justiça com os portugueses e com a classe média, que no fundo suportou a cobrança de impostos para lá daquilo que estava previsto no Orçamento do Estado".

O PSD recomenda, pois, ao Governo que reveja as tabelas do IRS em quinze dias, diminuindo as taxas marginais em todos os escalões menos o último, e recusa que a sua proposta viole a chamada “norma-travão” que impede o aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento. Segundo Hugo Carneiro, este alívio de 1.200 milhões de euros é para manter em 2024 e não fazer pontualmente em 2023.

No projeto de resolução relativo a 2023, o PSD refere que esta redução no IRS “é compensada e inferior tanto ao excesso da receita fiscal total (2.150 a 2.500 milhões de euros), como ao excesso da componente de receita de IRS (1.300 milhões a 1.800 milhões de euros), face ao previsto aos crescimentos de receita já previstos no OE para 2023”.

Tal como já tinha sido detalhado, a proposta do PSD passa por uma redução das taxas marginais em todos os escalões, à exceção do último, com um corte mais significativo (de 3 pontos percentuais) entre o terceiro e o sexto escalões, que abrange rendimentos anuais entre os 11.284 e 38.632 euros. A redução da taxa marginal no primeiro escalão seria de 1,5 pontos percentuais (passando de 14,5 para 13%), de 2 pontos no segundo (baixando de 21 para 19%), com descidas menores nos escalões mais altos (0,5 pontos percentuais no sétimo e 0,25 no oitavo), mantendo-se inalteradas as taxas do nono e último escalão e das contribuições de solidariedade.

Para responder à necessidade de manter os jovens no país, o PSD propõe que "um terço das taxas marginais atuais do IRS sejam cobradas aos jovens, apenas um terço, com esse limite, atingindo no penúltimo escalão o máximo de 15%". De acordo com os cálculos do partido liderado por Luís Montenegro, considerando que três em cada quatro jovens ganham menos do que 1.000 euros, significa que nesses patamares de escalões de rendimento, entre o terceiro e o quarto escalão,  as taxas médias são na ordem dos 6%-7%.

O PSD apresentou também uma proposta que visa a criação de um "mecanismo automático de atualização dos escalões do IRS, considerando o PIB por trabalhador" para responder ao que dizem ser, citando o Conselho de Finanças Públicas (CFP), uma cobrança excessiva por "não atualizar com base na inflação". De acordo com o CFP, a não atualização dos escalões do IRS deverá ter dado às Finanças um bónus fiscal de cerca de 513 milhões de euros.

Em matéria de produtividade, o PSD propõe uma isenção de IRS e TSU para prémios de produtividade que correspondam a um valor igual ou menor a 6% do valor médio das remunerações dos últimos 12 meses "com uma cláusula de salvaguarda para evitar abusos caso eles viessem a ocorrer". Em causa está uma limitação à utilização abusiva deste incentivo ao aumento da produtividade. O montante a recebido pelo trabalhador na qualidade de remunerações regulares com carácter de retribuição nos últimos 12 meses não pode ser inferior ao valor médio dessas mesmas remunerações auferidas nos últimos 36 meses.

Os sociais-democratas defendem ainda no âmbito da Lei de Enquadramento Orçamental, "que sejam reforçados os mecanismos de transparência face aos excessos de receita fiscal que é cobrada pelo Estado".