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"Descida do IRC é positiva, mas Governo deve adotar uma abordagem mais ousada", pedem jovens empresários

O presidente da ANJE, Carlos Carvalho, considera que medidas como o IRS Jovem ou a descida do IRC são benéficas, mas pede mais ambição, agilidade e incentivos à inovação, sobretudo no atual ambiente de tensão no comércio internacional - que, embora desafiante, cria oportunidades de valorizar outros mercados emergentes.

A discussão orçamental está na fase final, depois de longas e complicadas negociações, com duas medidas emblemáticas à cabeça: uma com impacto direto sobre as empresas e os empreendedores, e outra focada no apoio aos mais jovens. Com o Governo a afirmar querer apostar forte no apoio ao tecido empresarial e na retenção do talento nacional, o JE falou com o presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE) de Portugal, com a assinatura do protocolo de cooperação com a associação homónima angolana como pano de fundo.

O Governo tem vindo a pedir que não se "descaracterize" o OE2025, mas a reação dos partidos da oposição à proposta não foi a mais positiva, com críticas de vários quadrantes. Qual a expectativa para a discussão do OE na especialidade?

A ANJE reconhece a importância de um debate construtivo na especialidade para aprimorar o Orçamento de Estado, principalmente no que se refere ao apoio ao empreendedorismo jovem e à competitividade das empresas. Se, por um lado, o Governo pede que o OE não seja “descaracterizado”, por outro, é fundamental que haja uma abertura para incorporar as sugestões que possam robustecer o crescimento económico e o apoio às PME’s e startups. Esperamos que, na discussão na especialidade, sejam considerados mecanismos que favoreçam a internacionalização, o investimento e o desagravamento fiscal, medidas que a ANJE defende e que são cruciais para atrair e reter talento, bem como para estimular a inovação e a criação de valor no tecido empresarial jovem.

Quais os riscos para os jovens associados a uma crise política, sobretudo tendo em conta que 2025 deverá ver uma aceleração considerável da execução do PRR?

Uma crise política pode gerar instabilidade e incertezas, especialmente para os jovens empresários que dependem da confiança dos investidores e da execução de projetos financiados pelo PRR. A ANJE vê com preocupação o risco de atrasos na implementação das medidas previstas no PRR, que são cruciais para a modernização da economia e o apoio a projetos inovadores. Para os jovens, esta instabilidade pode comprometer o acesso a financiamento e oportunidades de crescimento, travando o potencial de inovação e de internacionalização que é necessário para assegurar a competitividade da economia portuguesa a longo prazo.

Como veem a proposta que acabou por vigorar para o IRS Jovem? Partilham da visão do FMI sobre os possíveis problemas de equidade e eficiência da proposta inicial?

A ANJE vê o IRS Jovem como uma medida importante para estimular a retenção e atração de talento jovem qualificado em Portugal, algo que consideramos vital para a inovação e o desenvolvimento do país. Acresce que esta medida pode também resultar na atração para o país de talento, ou seja, conduzir a uma imigração qualificada, dotando o país de mais recursos humanos, essenciais para as empresas. O desagravamento fiscal é uma das nossas principais bandeiras, e acreditamos que o IRS Jovem pode ser uma ferramenta eficaz nesse sentido, apesar das preocupações levantadas pelo FMI.

Compreendemos que o FMI considera a medida cara e potencialmente ineficiente em termos de equidade, apontando que pode beneficiar de forma desproporcional jovens de setores ou regiões mais favorecidas. No entanto, a ANJE acredita que o impacto positivo a longo prazo, ao dinamizar o empreendedorismo jovem e incentivar o investimento em novos setores, justifica a sua implementação. Além disso, vemos esta medida como parte de uma estratégia mais ampla, que deve ser acompanhada por incentivos adicionais à inovação e à internacionalização de negócios, permitindo que os jovens usem este alívio fiscal para investir em empresas e tecnologia.

Que avaliação fazem da proposta para o IRC? A descida proposta corresponde ao alívio fiscal projetado pelo Governo?

A ANJE considera a descida do IRC positiva, mas insuficiente face às necessidades das empresas, especialmente startups e PMEs inovadoras. O desagravamento fiscal é uma prioridade para a ANJE, e acreditamos que o Governo deve adotar uma abordagem mais ousada para reduzir a carga fiscal sobre as empresas, permitindo-lhes reinvestir em inovação, criar empregos e expandir para mercados internacionais. A proposta atual, embora seja um passo na direção certa, está aquém das expectativas, especialmente num contexto económico em que a competitividade das empresas portuguesas depende de medidas mais eficazes.

Que medidas ficam a faltar com foco nos mais jovens?

Faltam medidas que facilitem o acesso ao financiamento para jovens empreendedores e a eliminação de barreiras burocráticas que muitas vezes travam a criação e o crescimento de startups. A ANJE defende um sistema mais simples e ágil para a criação de negócios, acompanhado de incentivos fiscais específicos para as startups tecnológicas e inovadoras. Além disso, seria fundamental reforçar a educação e a formação em competências digitais e de gestão empresarial desde cedo, para que os jovens possam desenvolver as competências necessárias para competir num mercado global.

Que medidas seriam fundamentais para promover o empreendedorismo jovem?

Para promover o empreendedorismo jovem, a ANJE defende um pacote de incentivos fiscais robusto e direcionado, com foco nas startups inovadoras, que lhes permita reinvestir em tecnologia e internacionalização. Além disso, é essencial aumentar o acesso a capital de risco e criar redes de apoio e mentoria que acelerem o crescimento de empresas lideradas por jovens. O Governo também deve apoiar programas de incubação e aceleração, especialmente em áreas estratégicas como a tecnologia, energias renováveis e biotecnologia, para que os jovens empreendedores possam escalar os seus negócios com sucesso.

E a retenção de talento?

Para reter talento, é imprescindível criar um ambiente empresarial atrativo, com incentivos à inovação e à criação de novas oportunidades profissionais. A ANJE vê o desagravamento fiscal, como o IRS Jovem, como uma componente essencial, mas defendemos que deve ser complementado com políticas que incentivem as empresas a investir em inovação, formação contínua e a oferecer condições competitivas de trabalho. Um ambiente empresarial inovador, aliado a oportunidades reais de desenvolvimento profissional, é a chave para manter o talento jovem em Portugal.

As exportações fraquejaram na primeira metade do ano, criando dúvidas sobre o seu impacto no crescimento no final de 2024. Que papel podem ter os jovens empresários na promoção das vendas ao exterior e internacionalização das marcas portuguesas e como pode o Governo facilitar esta evolução?

Os jovens empresários têm um papel central na promoção das exportações e na internacionalização das marcas portuguesas, especialmente porque são mais propensos a adotar novas tecnologias e a explorar mercados emergentes. A ANJE acredita que o Governo pode facilitar este processo através de incentivos à exportação, como a redução de custos associados à internacionalização, a promoção de missões empresariais no exterior e o apoio à criação de parcerias estratégicas. Além disso, é crucial que os jovens empresários tenham acesso facilitado a financiamento para a expansão internacional e que sejam criados programas de apoio para ajudar as startups a expandir as suas operações para fora de Portugal.

A reeleição de Trump deve ver um acréscimo do protecionismo americano, incluindo contra a Europa, sendo que o antigo presidente falou na campanha de tarifas de 10% sobre os produtos não americanos. Sendo os EUA um mercado cada vez mais importante para as empresas nacionais, como veem os jovens empreendedores esta forte possibilidade de custos acrescidos e barreiras à entrada?

Os jovens empreendedores portugueses acompanham com atenção a evolução do mercado americano, pois representa um importante destino para a internacionalização de negócios. Um eventual aumento de tarifas e barreiras à entrada para produtos europeus seria, naturalmente, um entrave significativo. Para as startups e PME’s que operam em setores como tecnologia, saúde e produção industrial, este cenário exige adaptação estratégica. Uma resposta a este desafio poderia passar pelo fortalecimento da competitividade e inovação dos produtos nacionais e pela diversificação de mercados-alvo, reduzindo a dependência do mercado norte-americano. Contudo, isso não impede o esforço em explorar oportunidades que se mantêm robustas, nomeadamente em nichos de mercado onde as empresas portuguesas têm diferenciais competitivos.

No médio/longo prazo, como percepcionam os jovens empresários esta nova dinâmica na política e comércio internacional de menos cooperação e mais entraves à livre circulação e comércio de bens e mercadorias? O que significa para os jovens esta reversão da globalização?

Para os jovens empresários, a atual reversão da globalização significa um contexto de maior imprevisibilidade e custos de entrada em alguns dos principais mercados globais. Este ambiente implica, por um lado, a necessidade de resiliência e criatividade para ultrapassar obstáculos e, por outro, de políticas nacionais que apoiem a internacionalização e a competitividade. Embora a tendência atual aponte para uma globalização “menos fluida”, há também uma oportunidade de valorizar o mercado interno europeu e de fortalecer a cooperação com outras regiões em crescimento, como África e América Latina. O desafio, portanto, é manter-se relevante e competitivo num cenário global mais fragmentado e dinâmico.

Qual a importância de Angola para os jovens empreendedores portugueses, tanto enquanto mercado como enquanto parceiro de negócios? Com a economia angolana numa rota de diversificação com vista a uma menor dependência dos combustíveis fósseis, em que sectores existirão mais oportunidades para os jovens empresários portugueses?

Angola representa um mercado estratégico para os jovens empreendedores portugueses, não apenas pela língua e afinidade cultural, mas também pela crescente diversificação económica. À medida que Angola procura reduzir a dependência do setor petrolífero, surgem oportunidades em áreas como as tecnologias da informação, saúde, energia renovável e agricultura sustentável, onde o conhecimento e a experiência portuguesa podem fazer a diferença. A ANJE acredita que esta diversificação representa um potencial de sinergias e parcerias que vão além do comércio, proporcionando um contexto propício à transferência de know-how e ao desenvolvimento de projetos que beneficiem ambas as economias.