Portugal registou o segundo maior excedente da zona euro no terceiro trimestre de 2023, fechando com um saldo orçamental positivo de 2,5% do PIB e ficando em boa posição para terminar o ano passado com um excedente acima do previsto pelo Governo. Já a zona euro encerrou o trimestre com um rácio de 89,9% de dívida pública, também uma melhoria em relação ao período anterior, mas muito longe dos 60% de limite imposto aos Estados-membros.
Os dados do Eurostat mostram que o saldo orçamental do bloco euro melhorou ligeiramente em relação ao segundo trimestre, vendo o défice recuar de 3,0% para 2,8%, enquanto a dívida pública caiu de 90,3% para 89,9%. Em ambos os casos, são reduções perto de insignificantes, mas com um detalhe no caso do défice: o valor apurado para o terceiro trimestre fica abaixo de 3%, o limite imposto pelo tratado de Maastricht para este indicador.
As regras orçamentais europeias encontram-se suspensas desde a Covid-19 e só se aplicam aos Estados-membros individualmente, pelo que a zona euro estaria, de qualquer das formas, isenta de procedimentos por défice excessivo. Ainda assim, Pedro Brinca, economista e professor universitário, elogia este aspeto, classificando-o como uma “boa notícia”, até porque “a inflação ainda não está sob controlo” e “o princípio do ano pode ser complicado por causa dos mecanismos de indexação”.
Por outro lado, a dívida sofreu um grande disparo aquando da pandemia e por duas vias, lembra Pedro Braz Teixeira, diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade: o aumento do endividamento e a redução do PIB. Apesar de estar muito acima dos 60%, há outra questão que preocupa mais o economista no atual ambiente de juros elevados, a sustentabilidade.
Olhando para a condição de sustentabilidade da dívida, esta relaciona o crescimento do PIB com o crescimento dos juros reais, o que, no ambiente ultra acomodatício de taxas perto de zero, não tinha grande relevância, mas levanta agora problemas adicionais.
“Com as taxas perto de zero, desde que o défice no saldo primário não fosse muito elevado, estava garantida a sustentabilidade, mesmo para níveis de dívida bastante elevados. Agora, a primeira questão é qual vai ser a nova taxa de juro de longo prazo, […] que pode ser suficientemente elevada para tornar esta questão mais difícil”, explica.
O 'bom aluno' português
Portugal registou também a terceira redução mais expressiva da dívida, embora mantendo-se como um dos países mais endividados do bloco euro, com 107,5% do PIB. Por outro lado, e com três excedentes seguidos acima de 2,0% (2,2% nos dois trimestres anteriores), o objetivo do Governo para este indicador no final do ano, de 0,9%, parece agora demasiado conservador.
“Pode ser que tenhamos aí uma surpresa”, antecipa Pedro Braz Teixeira, projetando valores mais elevados para o saldo orçamental de 2023. Recorde-se que o comentador Luís Marques Mendes antecipou este domingo que 2023 teria fechado com um excedente de 1,1% do PIB, o que confirmaria este cenário.
Em sentido inverso, Pedro Brinca lembra os vários riscos que pesarão sobre a economia nacional este ano. Por um lado, espera-se uma quebra da atividade, o que irá levar a menor receita e mais despesa – uma realidade ainda mais provável em Portugal, onde “a inflação tem baixado bastante, abaixo da média da zona euro, o que significa que a economia pode estar a abrandar mais do que noutros países”.
Por outro, o período eleitoral levará a promessas eleitorais que, “mesmo que apenas sejam cumpridas um décimo delas, irão trazer mais despesa”.
De recordar que Portugal fechou o ano com uma operação especial do Ministério das Finanças para retornar o indicador de dívida abaixo de 100%, um objetivo que havia sido antecipado em um ano na mais recente proposta de Orçamento do Estado para 2024. Esta operação terá também impacto no saldo orçamental com que o país fechará 2023, ao representar uma despesa considerável no último trimestre.
Fernando Medina abandonou o cargo de ministro das Finanças com um programa de pagamentos a fornecedores externos e recompra de títulos de dívida detidos por bancos e seguradoras que visou colocar a dívida a 99,5% do PIB a fechar o ano passado, de acordo com a notícia do ‘Expresso’, uma operação que deverá ter ultrapassado os 4 mil milhões de euros.