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Cooperativa de farmácias quer chegar a um volume de negócios de 470 milhões este ano

O presidente da Cooprofar, a maior cooperativa nacional, Hélder Mesquita, revela ao Jornal Económico os planos até ao fim do seu mandato: crescer 10% já este ano, para um volume de negócios de 470 milhões. Quanto a investimentos, prevê investir 10 milhões de euros na modernização da plataforma de Alcochete, uma das cinco do grupo.

O que faz a Cooprofar? Sei que o faz há bastante tempo, há quase 50 anos.
Somos um elo da cadeia do medicamento, que é constituída essencialmente por três partes: tem a indústria; tem as farmácias que estão junto dos utentes; e os distribuidores têm um papel de assegurar um abastecimento contínuo às farmácias. Este é a nossa função.

São um nicho super especializado de logística, digamos assim, de logística farmacêutica.
Exatamente, super especializada em logística. Eu faço este pergunta: se todos os laboratórios que existem no país, a indústria farmacêutica, tivessem que entregar os seus medicamentos às farmácias, como é que seria?

Que frota é que essas entidades todas teriam de ter, não é?
Eu dou um número do sector. Nós, o sector, percorremos 46 milhões de quilómetros por ano. Mas se fossem as farmacêuticas a fazer isto, a estimativa era que seria bastante superior o número de carros a andar na rua a fazerem esta distribuição. E com outra desvantagem, é que não o conseguiriam fazer com a cadência que nós fazemos. A rede de farmácias é uma rede que está instalada e é muito capilar. Está por toda a geografia portuguesa. Está espalhada por todo o país. E para garantir que o produto chega também, por exemplo, a Alfândega da Fé é preciso ter um sistema a funcionar como um relógio.

Portanto, é uma cooperativa especializada a fazer esse trabalho.
É uma cooperativa. Como há empresas privadas a fazê-lo também. E multinacionais que o fazem. Esta cooperativa em particular nasceu em 1975, portanto vai fazer 50 anos para o ano. Teve a capacidade de conseguir estar neste negócio, aportar valor para as farmácias e e ao mesmo tempo resistir estes anos todos.

Vocês são regulados pelo Infarmed?
Sim, sim. Fazemos parte da cadeia do medicamento. Temos regras específicas.

Que regras específicas é que tem uma distribuidora? O que vos pede o Infarmed?
Porque é que os CTT não podem fazer a distribuição de medicamentos? Porque é um conjunto de práticas que nós temos que assegurar para garantir que os medicamentos chegam com segurança e qualidade às farmácias. Estamos a falar de controlo de temperaturas, por exemplo. Até há uns dois anos, até a humidade no transporte era necessário ser controlada. Hoje já não.  Se eu produzo um medicamento, tenho que garantir que ele é seguro para as pessoas, isto no lado da indústria. Do lado da farmácia, também, na hora da dispensa. Mas entre vir do armazém da indústria até chegar a uma farmácia, um conjunto de condições têm que ser salvaguardadas para garantir que o medicamento não é adulterado, que preserva as suas características. Para isso, há um conjunto de guidelines que regulamentam a nossa atividade e que vão até ao nível europeu. Neste momento estão em discussão na própria Comissão Europeia as alterações a normativa, que é uma diretiva que está a revista. E nós temos que obedecer a uma boa prática de distribuição. São escritas e regulamentadas pelo Infarmed, que é o nosso regulador e que tem de nos dar uma autorização para podermos armazenar e distribuir. Portanto, o Infarmed tem o dever de nos regular da mesma maneira que regula uma farmácia.

Deixe-me passar para os números concretos. Em 2023, um volume de negócios de 438 milhões de euros um EBITDA entre oito e nove. Explique-me esses dois números.
Em Portugal, o preço dos medicamentos e a margem são reguladas. As duas coisas. Há aqui uma distribuição muito clara. Eu vou falar em números redondos: do lado da indústria fica cerca de 72%, à volta disso, do lado da distribuição ficam os outros 28. Mas com distribuição estou a dizer farmácias mais retalhistas. A margem legal de um distribuidor anda à volta dos sete ou 8%, mas depois a competitividade do sector faz com que nós tenhamos que ter práticas. É dessa margem que sai tudo o que é preciso para manter uma estrutura como a nossa, que é completamente automatizada. Nós temos cinco plataformas logísticas no país todo. A maior delas é em Gondomar; uma secundária é em Alcochete e depois ainda temos mais duas, uma em Aveiro e outra Macedo de Cavaleiros.

E está previsto algum novo investimento nessa área? É novidade, certo?
Sim, isso não está no Relatório e Contas, mas está no orçamento, no plano de investimentos que apresentamos. Contamos alargar a unidade de Lisboa, de Alcochete. Neste momento, vamos fazer um investimento de cerca de 10 milhões de euros em dois anos. É esse o valor que está estimado.

Não faz sentido ter um pólo mais para Sul? Este serve?
Neste momento, dentro daquilo que é a nossa estratégia, será suficiente. Nós dependemos da rede viária e prometemos entregar uma encomenda – desde aquilo que chamamos a hora da corte, ou a hora da última encomenda, até à farmácia em quatro horas –  e isto é possível perfeitamente a partir de Alcochete para o Sul. Nós, apesar de termos esta distribuição em termos de plataformas, temos clientes pelo país todo. Exato. Até ao Algarve mais distante, Vila Real de Santo António.

Como é que está o ambiente de negócios do vosso sector, especificamente da vossa área, em Portugal? Nós tivemos uns anos um bocado conturbados. Temos ainda temos ainda algum resquício disso, dos problemas da pandemia? Ou nada disso vos afecta neste momento?
Em termos económicos? Se calhar até puxo um bocadinho atrás. Na troika, ali naquela altura, foi a altura mais penalizadora para o sector, mas não só para a distribuição. Distribuição e farmácias. Falamos de cortes no preço do medicamento que rondaram nessa altura, os 250 milhões de euros, se não me engano. E que desgastaram o sector para os investimentos e para a estrutura que estava mantida. Portanto, o sector estava a vender o mesmo volume com mesmo preço. E isto degradou até 2014 ou 2015. Temos vindo a recuperar, como mercado, desde essa altura até agora, mas ainda não conseguimos recuperar os números de 2008.

Se fosse o Helder a determinar as medidas políticas, qual é que seria a medida política que punha em cima da mesa que pudesse aproximar o vosso negócio daquilo que existia em 2008.
Houve duas medidas nos dois últimos anos que contribuíram para uma normalização. O preço é regulado e, claro, vem vindo a sofrer actualizações anuais. Normalmente no sentido da descida. Os últimos dois anos foram os primeiros anos em que houve, para além de descidas, subidas no preço de medicamentos, principalmente nos mais baixos. Portanto, isto contribui para equilibrar o sector. Mas pergunta em termos de medidas de Estado?

Por exemplo. Imagino que o preço dos combustíveis para vocês não tem descontos.
O preço de combustíveis é sem dúvida uma das rubricas de maior peso.

Mas ao ao contrário da distribuição terrestre em pesados não tem acesso a essa medidas nesse sentido.
Neste momento não.

Há pouco falávamos da concorrência. Este mercado tem seis grandes operadores, é isso?
Seis operadores, sim, que representam 94% do mercado todo de distribuição farmacêutica. É uma indústria muito competitiva, pela sua dimensão e pelas forças – quer da indústria, quer da farmácia. Conquistar mercado aqui é tentar conquistar um cliente farmácia. Neste caso, no nosso lado, esforçamo-nos por criar cooperadores farmácias. Nós procuramos ajudar a indústria também a fazer o seu negócio. Somos um elo da cadeia, portanto, temos que encará-los dessa forma também.

Como é que vê o negócio das farmácias? Falou-se há tempos no movimento de aglomeração de farmácias grupos maiores, em detrimento das farmácias familiares.
A lei assim o permite. A legislação hoje permite que uma entidade seja proprietária de até quatro farmácias. É o enquadramento. E esse é um fenómeno que eu acho que também tem vindo a ser aproveitado.

E facilita-vos a vida à vocês, à distribuição?
Médio.

Em termos práticos, isso significa o quê?
Para nós, a unidade de abastecimento é a farmácia. Em termos práticos, em termos de operação, do meu ponto de vista, não nos vai trazer nenhuma dificuldade. Aquele trabalho que nós fazemos, iremos continuar a fazer. Agora, em termos negociais, poderá haver sempre um acréscimo de poder por parte da farmácia.

Porque pode jogar com o número de farmácias que tem.
Eu tenho um princípio. E puxando àquilo que nós somos como cooperativa: nós temos uma obrigação muito maior do que é esta negociação. Nós, como administração, estamos a trabalhar há três anos na Cooprofar. E, nesse sentido, aquilo que mais quisemos fazer foi que a Cooprofar fosse mais do que apenas a distribuição do seu medicamento. Acho que é um dos pilares daquilo que nós temos vindo a conseguir nestes últimos três anos, apesar das dificuldades. Queremos ser mais do que um parceiro. A farmácia, como cooperadora, na prática é minha acionista. Nós temos um modelo democrático, temos cerca de 711 cooperadores neste momento, que representam cerca de 750 farmácias, porque um cooperador pode ter mais do que uma. A nossa génese está no auto-governo por parte das farmácias. Portanto, aquilo que temos vindo a fazer é tentar acrescentar àquilo que é a nossa oferta de serviço coisas que ajudem a farmácia a ser melhor naquilo que faz no seu dia a dia.

Nomeadamente? Tecnologia?
Tecnologia, mas não só. Na gestão das quantidades certas. Eu costumo dizer que quero que todas as farmácias tenham o medicamento certo, na hora certa, no local certo. Não me interessa que ele esteja no armazém da Cooprofar. Tem que estar no local da farmácia quando é preciso. E, nesse sentido, construímos soluções para além daquilo que é o serviço de entrega de medicamentos a farmácia. Hoje, já ajudamos farmácias a gerir o seu stock, num serviço que chamamos "Inteligência de Gestão de Inventário". De certa forma, vai ajudar a farmácia a despreocupar-se com a atividade de aprovisionamento e a preocupar-se com a atividade de atendimento ao público. Este é o nosso caminho. E com esta outras, o princípio de uma cooperativa e garantir a sustentabilidade de cada um dos seus cooperadores.

O número de cooperadores da Cooprofar tem flutuado ou tem-se mantido estável?
Tem crescido. Ou seja, quando entrámos existiam cerca de 600, hoje são 711. Temos uma abordagem que nos permite também dar a opção de escolha à farmácia se não quiser ser cooperador. Há farmácias [na Cooprofar] que não são cooperadoras, são só clientes. Mas a nossa ambição é que 100% das nossas farmácias sejam cooperadores.

Qual é que é a perspetiva de volume de negócios para 2024? Qual é a previsão de crescimento?
Por acaso o orçamento é um instrumento obrigatório numa cooperativa, não numa empresa. Nós votamo-lo. O objetivo é chegar aos 470 milhões de euros. Crescer a dois dígitos.