Um alto responsável do Governo norte-americano visitou Portugal e deixou alertas sobre o que considera ser o impacto negativo da atuação do Governo chinês no mercado global de lítio, prejudicando os projetos em Portugal.
De visita a Portugal, Jose Fernandez, vice-secretário para o Crescimento, Energia e Ambiente do ministério dos Negócios Estrangeiros, também revelou que os EUA estão dispostos a ajudar o sector português da fileira do lítio, fazendo a ponte entre as companhias nacionais e investidores norte-americanos.
Este responsável começou por deixar críticas à influência chinesa no mercado global, onde os preços da tonelada recuaram de 80 mil para 10 mil dólares, depois de a China, o maior produtor global, inundar o mercado de lítio. "A atual situação de excesso de oferta no mercado está a prejudicar a capacidade das empresas portuguesas de desenvolverem minerais críticos. A China está a produzir muito mais lítio do que o mundo precisa hoje. Isto é para desencorajar o investimento, para inibir a capacidade de diversificar a cadeia de abastecimento e para prejudicar os países de desenvolverem estas indústrias".
No encontro, defendeu a necessidade de explorar mais lítio para fazer a transição energética, apontando que até 2050 a procura deste mineral vai disparar mais de 40 vezes.
"Vamos partilhar informação com parceiros e investir em conjunto. Reunimos com duas empresas portuguesas. Estão à procura de financiamento e de clientes. Pensamos que podemos ajudá-los. Podemos facilitar relacionamentos e encontros [entre as empresas portuguesas e investidores norte-americanos]. Vai haver um mercado. É do nosso interesse que empresas portuguesas participem", afirmou, não revelando quais.
"As empresas com quem falei hoje, estão muito encorajadas com as perspetivas. Tem de haver uma resposta internacional à República Popular da China", defendeu.
O responsável está de visita a Portugal e Espanha até 9 de outubro. Esteve reunido com responsáveis do ministério da Economia e da Presidência, assim como com empresas privadas portuguesas e norte-americanas, incluindo do sector energético e do sector mineiro, não tendo revelado quais.
Questionado sobre se a presença da China Three Gorges (CTG) no capital da EDP era um problema para as autoridades norte-americanas, preferiu dar as "boas-vindas aos investidores portugueses no sector da energia". Durante a mesa-redonda com vários media nacionais e internacionais, evitou criticar diretamente este investimento, ao contrário de outros enviados por Donald Trump que fizeram críticas abertas, preferindo deixar alertas mais genéricos.
"A China é o nosso terceiro maior parceiro comercial. Mas as empresas chinesas não pagam impostos. Contam com o apoio do Governo chinês. As empresas privadas não têm hipótese de competir. Quando perdem dinheiro, o Governo dá mais. É preciso equilibrar o terreno de jogo", afirmou. "Não nos estamos a afastar da China, mas estamos a reduzir o risco" face a Pequim.
O responsável destacou que nos EUA existe o Comité para o Investimento Estrangeiro nos EUA (CFIUS) e que esta agência tem capacidade para chumbar investimentos em sectores críticos da economia para a segurança nacional, defendendo que os "países europeus também deviam ter". "Todos temos a necessidade de pré-avaliar investimentos".
Na conferência de imprensa também destacou a presença de empresas portuguesas em projetos eólicos offshore nos EUA, como a EDP Renováveis e a Endiprev. "Vemos a oportunidade para continuar a atrair empresas portuguesas e estrangeiras".
Nascido em Cuba (1955), Jose Fernandez foi viver para os Estados Unidos em 1967 para o estado de Nova Jersey. Advogado de profissão, especializou-se em M&A (fusões e aquisições). Durante o executivo de Barack Obama foi Assistant Secretary of State for Economic and Business Affairs, do ministério dos Negócios Estrangeiros entre 2009 e 2013.
Sobre o fornecimento de gás natural liquefeito (GNL) a Portugal e à Europa, que aumentou após a invasão russa da Ucrânia, sinalizou que a "produção está a aumentar, atingiu recordes" e que "deverá dobrar nos próximos 10 anos", e que os EUA irão continuar a ser um parceiro de confiança.
Questionado se a Casa Branca ainda estava reticente sobre o envolvimento da China na rede 5G em Portugal, elogiou o papel do país. "Portugal foi um líder na resposta regulatória da União Europeia ao 5G. Aplaudimos os esforços de Portugal que estabeleceu um exemplo para o resto da UE".
Apontou que Washington não está a tentar alavancar as suas empresas neste sector, pois não existem, mas que existem preocupações. "A vossa segurança impacta a nossa segurança", defendendo a aposta em fornecedores de confiança".
O responsável sublinhou que os EUA são o maior parceiro comercial de Portugal fora da UE (15 mil milhões no total), e que a relação comercial tem vindo a aumentar, tendo subido 25% este ano.
"As relações económicas entre Portugal e os EUA estão numa trajetória ascendente, mas há um sentido de urgência. Existem várias oportunidades em diferentes áreas. É preciso reforçar a parceira e intensificar as relações económicas", afirmou Jose Fernandez.