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Cancelamentos de licenças de AL duplicam em 2023 para evitar contribuição extraordinária

Associação do sector critica contribuição extraordinária e revela que os últimos dois meses do ano registaram um disparo no pedido de cancelamento de licenças, com os proprietários a evitarem a taxa. A média dos últimos anos era entre três e quatro mil cancelamentos. Só em novembro e dezembro do ano passado registaram-se mais do dobro dos pedidos médios de iguais meses em anos anteriores.

Sete mil licenças de alojamento local foram canceladas no ano passado. Um número bastante acima da média histórica e que disparou a partir de novembro e dezembro, após o pacote Mais Habitação ter sido aprovado. Tudo devido à contribuição extraordinária sobre o alojamento local (CEAL), com os proprietários a cancelarem registos para evitarem o pagamento desta taxa. A revelação foi feita ao Jornal Económico pelo presidente da Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP).

"Não há dúvida que foi efeito da CEAL", explica Eduardo Miranda ao JE. E realça: "a média de cancelamentos em novembro dos outros anos andava entre 200 e 500, mas este novembro passou os 1.100. Em dezembro foi ainda mais claro: a média era entre 250 e 400 nos anos anteriores e neste ultrapassou os 2.000".

O responsável diz que a evolução do número de cancelamentos ficou em linha com as médias de anos passados até outubro, sendo que o disparo se começou a sentir em novembro. Nos anos anteriores, havia-se registado em média entre três e quatro mil cancelamentos, pelo que o número verificado em 2023 quase chega ao dobro. Ainda assim, comparando com o número de alojamentos locais (AL) para os quais não foram entregues comprovativos, a associação identifica um problema claro.

“Tudo isto não foi bem pensado”, continua. “Não se pode pensar que a maior parte das pessoas não envia comprovativo, não quer continuar, mas quer pagar uma taxa”, critica o presidente da ALEP, apontando a estes números como “um exemplo claro que foi tudo mal feito”.

45 mil não enviaram

A ALEP havia já alertado para o mau desenho das medidas do pacote Mais Habitação para o sector dos AL, antecipando dificuldades e constrangimentos resultantes da sua aplicação. De um universo de 120 mil alojamentos, 45 mil não enviaram o comprovativo pedido, um número que contrasta bastante com os pedidos de cancelamento que deram entrada até ao final do ano.

“A maior prova é que, destes 40 e poucos mil [registos que não entregaram comprovativo], mesmo admitindo que alguns não enviaram porque não conseguiram por questões técnicas, é impensável que só sete mil tenham feito cancelamento”, argumenta Eduardo Miranda.

Esta era uma oportunidade para fazer, de facto, um levantamento das licenças fantasma, uma realidade que a ALEP reconhece e quer ver resolvida, segundo Eduardo Miranda. Pelo contrário, com o desenho ineficiente da medida, o Governo “em vez de resolver um problema, criou outro”.

“Em vez de se resolver um problema real - o dos AL fantasma, sobretudo em Lisboa […] por causa das suspensões e picos de registos, era algo com importância e utilidade - criou-se outro. Muita da discussão em Lisboa é baseada em números não reais”, ilustra.

Outro problema prende-se com a isenção de alguns proprietários de comprovativo, dado um período de exploração inferior a 120 dias por ano. O mecanismo para provar esta situação estava previsto no próprio comprovativo de que os proprietários ficam isentos, uma situação difícil de compreender para a ALEP e para os empresários do sector.

“É natural que quem acha que está isento de enviar o comprovativo não imagine que tem de enviar o comprovativo para provar que está isento de o enviar. Uma parte que não enviou pode não o ter feito por estar isento. As câmaras, portanto, não têm forma de saber quem não enviou porque estava isento, quem não conseguiu enviar por questões técnicas e quem efetivamente não enviou por não estar ativo”, resume.

Confessando que a comunicação com o Ministério das Finanças tem sido difícil, visto que a tutela não respondeu aos pedidos de reunião enviados pela ALEP logo aquando do anúncio das alterações, em outubro, Eduardo Miranda teme que o tratamento dado ao sector não seja coincidência.

“É um desrespeito enorme a um sector que representa 40% da atividade [turística em Portugal]. A não ser que o objetivo fosse mesmo criar um obstáculo grande ao sector”, afirma. Recorde-se que 2023 voltou a bater recordes na indústria do turismo, com o país a registar 30 milhões de dormidas.