A Bairro surgiu em plena pandemia de 2020 com o intuito de ser uma plataforma de quick grocery delivery, ou seja, um retalhista online para entregas ultra-rápidas com dark stores. Agora, existe a Bairro Direct, uma vertical que ataca um problema completamente diferente mas que se agrega à logística.
A fundadora de ambas as plataformas, Milana Dovzhenko, explica ao Jornal Económico, que tudo mudou em 2022. "O mercado de B2C (Business 2 Client) entrou em bear market com a guerra e a inflação, e os investidores deixaram de financiar projetos".
"Decidimos olhar para a tecnologia que construímos e pensar o que podíamos fazer com isto. Se não vamos receber investimento... Nós somos um retalhista e todas as lojas demoram um tempo a entrar em confiabilidade e depois não há dinheiro e forma de manter as operações físicas. Foi aí que decidimos cortar o laço e deixámos de ter estafetas".
No entanto, Milana nota que o Bairro ainda existe e tem utilizadores ativos. "Apenas já não é a estratégia de negócio. Deixámos por existência e focámo-nos na tecnologia do fullfilment que identificámos".
E que tecnologia é esta? "Identifica os centros urbanos, têm hardware e software dedicado ao processamento eficaz e rápido de pedidos, mas com uma abordagem multicanal. Significa isto que gerimos vários canais online, todos de um único sítio e a preparação é centralizada", adianta a empreendedora de uma das scale-ups destacadas este ano pela BGI - Building Global Innovators.
Trocando por palavras simples: existe tecnologia para concentrar toda a atividade de um retalhista/empresa num único sítio e gerir toda a operação.
Ainda assim, a empresária e a sua equipa notaram que apenas 13% do retalhistas europeus estão preparados para entregar os pedidos no próprio dia da encomenda, enquanto os consumidores já se mostram aptos para pagar por esse mesmo serviço. "A razão de não conseguirem propor same day delivery é não a conseguirem assegurar com a cadeia de abastecimento".
"A cadeia de abastecimento já está construída no offline, mas no online ainda é um mercado manual e fragmentado. Todos querem ter multicanal, ter omnipresença mas não têm tecnologia para assegurar eficácia e satisfação", explica.
No mesmo estudo aprofundado, a equipa da Bairro Direct percebeu, entre os grandes retalhistas portugueses e europeus, "que 40% a 60% dos pedidos são problemático. Isso significa que chegou fora de horas, houve um artigo em falta ou um artigo que veio errado".
Isto, adianta Milana, é importante para o compromisso a que os grupos retalhistas se propõem: triplicar o negócio no digital até 2030. "Grande parte vai ser no digital, mas depois há a cadeia de abastecimento online que não está automatizada e otimizada".
Foi com isto em mente que a equipa da Bairro começou a falar com produtores e marcas. "Pedimos para nos darem os seus inventários e abrimos, em nome deles, lojas em todos os marketplaces locais, Amazon e onde eles se quisessem promover. Isto tudo permitindo que eles consigam gerar vendas online desde o primeiro dia".
Por exemplo: "Há produtores que mandam para o Bairro. Do Bairro vai para a Amazon, e-commerce, para a Uber Eats, para o Pingo Doce e para as grandes superfícies". Ou seja, com uma única plataforma logística, a Bairro Direct, as marcas conseguem expandir a sua presença no mercado, tanto online quanto offline.
"Nós queremos empoderar a economia local. Temos muitas marcas a contar com a nossa logística integrada. Nós fazemos toda a logística integrada, multicanal à marca e marca reduz os custos que tem".
Milana dá outro exemplo ao JE. "As marcas focam-se na produção, marketing e consumidor na abertura de um armazém. A maior parte não sabe o que é logística, não percebe a operação. O mercado é fragmentado e complexo, e os custos são muito grandes".
"Nós propomos a diminuição destes riscos. Para os retalhistas, a nossa plataforma multicanal permite-lhes minimizar a margem de erro até 0,4%. Também garantimos 98% de pedidos perfeitos, ou seja, entregues no tempo correto e na totalidade".
"Conseguimos uma retenção de 65% aos retalhistas que trabalham connosco. É uma retenção muito positiva, porque quando o cliente encomenda produtos e um deles não vem, o cliente não volta a encomendar porque teve uma má experiência. O cliente hoje em dia é muito exigente com a experiência", adianta.
A reação dos clientes da Bairro Direct também é positiva. "Neste momento, temos um pipeline maior do que aquela que conseguimos processar. São boas dores de crescimento".
Milana Dovzhenko evidencia que há marcas que nunca entrariam em Lisboa devido à falta de estrutura, e que agora já fazem negócios na capital. "A nossa audiência tem entre os 25 e 45 anos, procuram conveniência, e nós abrimos a porta a milhões de novos consumidores a quem as marcas antes não chegavam".
"Paralelamente, temos marcas que nunca olharam para o mercado espanhol e nunca se internacionalizaram. Nós explicamos que o mercado em Espanha é o décimo maior mercado de e-commerce e que, tendo em conta o produto, vale a pena explorar e que podemos aproveitar a oportunidade. Há marcas que estão, neste momento, a entrar em Espanha através de marketplaces connosco e que antes nunca o teriam feito".
Como funciona a criação do marketplace da Amazon? A Bairro Direct cria uma 'vitrine' na Amazon com o inventário de uma marca e fazem entregas em Portugal e Espanha dentro de um a dois dias úteis.
Mas a oportunidade da plataforma de e-commerce é também uma clara aposta das marcas na internacionalização através dos canais digitais, o que lhes permite salvar algum dinheiro.
A Bairro Direct consegue ainda reduzir os custos da operação dos retalhistas e produtores em até 30%, simplesmente ao focar toda a gestão da sua atividade numa plataforma multicanal. Com esta ajuda, a equipa de Milana consegue aumentar as vendas dos seus clientes em 40% no digital.
E quem são os clientes da Bairro Direct?
O exemplo mais notável está talvez na Tarwi, marca nacional que reinventou os tremoços de forma saudável e com três fundadores portugueses.
"A Tarwi faz logística integrada connosco em tudo. Nós fazemos a distribuição para as grandes superfícies. A Tarwi está em todos os Pingo Doce do país porque nós fazemos essa distribuição de forma eficaz".
De facto, depois de muita publicidade gratuita nas redes de Alice Trewinnard, influenciadora digital e uma das fundadoras da marca, a marca dos tremoços saudável ganhou popularidade junto do público.
"Também existe uma Tarwi store na Uber Eats. Isto porque os consumidores procuravam comprar e não sabiam onde e como. E na Amazon também".
Mas não só a Tarwi compõe a lista de clientes da equipa de Milana. Também a Mars, dona de chocolates como Mars, Snickers e M&Ms, abriu o primeiro canal B2C em Portugal na Uber Eats com a ajuda da Bairro Direct.
A scale-up trabalha ainda com a Makro através de um serviço para entregas noturnas até às 4 horas na Grande Lisboa. "Iniciámos com alguns produtos que têm maior rotação, principalmente noturna e ao fim de semana, mas vamos adicionando uma variedade de produtos".
Outro exemplo de sucesso, dentro da lista de clientes, é a Swee, marca de gelados portuguesa. "Crescemos as vendas no digital em quatro vezes". Milana fala da marca que recebeu, recentemente, um investimento da Delta Ventures.
"Começou connosco em 2020 e acreditámos. O Diogo é um fundador com muita ambição. Ele vinha com a caixa de gelados, há três anos, com dois sabores, a defender que acreditava no que tinha criado. Passou meses atrás de mim". No fundo, a primeira criação de Milana - Bairro - nasceu ao mesmo tempo que a Swee.
"Ajudámos a Swee a crescer e neste momento já está gigante. Está a entrar nos Estados Unido com os gelados saudáveis", conta-nos com orgulho.
Missão é encurtar o caminho e ter sucesso
"É tão bom ver as marcas crescer. Acredito que este sentimento de comunidade, apoio e brainstorming que criamos e a expertise que partilhamos, tem sido uma alavanca muito grande para todos nós".
"Sentimos mesmo que estamos a mexer na economia real do país e nas empresas e que estamos a fazer a diferença. Tem sido um caminho muito valioso".
No fundo, o Bairro Direct é um volta de 360º graus ao Bairro fundado em plena pandemia. "A nossa missão sempre foi encurtar o caminho, cortar os intermediários ineficazes e fizemo-lo para nós em primeiro lugar".
Com a tecnologia pronta a uso, o passo seguinte foi falar com os retalhistas e mostrar-lhes as vantagens da sua plataforma.
"Temos de garantir que temos os pés muito assentes. A logística é um sector muito desinvestido desde 2014, após a crise, e muitas empresas saíram do sector e tem havido pouco investimento desde então e isso espelha-se no pouco desenvolvimento dos últimos anos".
"Estamos aqui a inovar, melhorar e a otimizar processos e serviços. Hoje, estamos a construir a cadeia de abastecimento online digital multicanal".
"As empresas querem triplicar os seus negócios e estar no digital e serem eficientes mas tem de existir tecnologia presente. É aí que entramos. Como temos tecnologia de fullfilment, fazemos gestão de inventários e o reabastecimento".
A plataforma da Bairro Direct faz toda a gestão e, quando vê que determinados produtos estão a esgotar, faz o pedido de reabastecimento de forma automática.