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Argentina: extremista Javier Milei é o inesperado melhor candidato às presidenciais de outubro

A vitória do candidato populista é um duro castigo para os peronistas, mas também para os conservadores, que não conseguiram capitalizar o descontentamento face à dupla Alberto Fernández e Cristina Kirchner.

Javier Milei, um candidato populista de extrema-direita abalou a Argentina depois de ter conseguido a maior percentagem de votos, mais de 30%, nas eleições primárias para escolha dos candidatos às presidenciais de outubro. Os 3,5%% conseguidos por Javier Milei são uma fatia muito maior que o previsto pelas sondagens e servem principalmente para castigar o peronismo e as suas lutas intestinas – que têm abalado a estabilidade no país nos últimos anos.

O principal bloco de oposição conservadora conseguiu apenas 28% dos votos e a coligação peronista no governo ficou em terceiro lugar, com 27%. Os resultados acabam também por ser, segundo os analistas, um ‘cartão vermelho’ ao ‘establichment’: é que, se o castigo à coligação entre o atual presidente Alberto Fernández e a sua ‘detestada’ vice-presidente Cristina Kirchner não é de admirar, já o facto de a oposição conservadora não ter conseguido capitalizar o descontentamento dos argentinos é algo que ninguém antecipou.

Javier Milei é, por outro lado, a mais recente ‘criação’ da ‘fábrica de Trupms’ em que alguns analistas dizem ter-se transformado a América do Sul. De facto, Milei surge na ‘tradição’ iniciada pelo ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro e prosseguida por aquele que chegou a ser apontado como o ‘Trump do Chile’, José Antonio Kast, que por pouco não foi eleito nas presidenciais de dezembro de 2021.

"Somos a verdadeira oposição", disse Milei num discurso otimista citado pelos jornais após os resultados serem conhecidos. "Uma Argentina diferente é impossível com as mesmas coisas antigas que sempre falharam", disse.

O voto nas primárias é obrigatório para a maioria dos adultos, tornando-se na verdade um ensaio geral para as eleições de 22 de outubro e dando uma indicação clara de quem é o favorito para ganhar a presidência.

O descontentamento é generalizado na Argentina, com a crise económica a deixar muitos argentinos desiludidos com os principais partidos políticos e abrindo as portas para propostas de extrema-direita. Com uma inflação anual da ordem dos 116%, as estatísticas apontam para que 40% dos argentinos estão neste momento a viver no limiar da pobreza e sem perpetivas de grandes mudanças.

Talvez por isso, até a inesperada proposta de Milei de substituir o peso argentino pelo dólar dos Estados Unidos como moeda corrente tenha sido olhada como aceitável – num país conhecido pelo seu forte pendor nacionalista, de que o peronismo é a sua face mais visível desde o fim da II Grande Guerra. Confesso admirador do ex-presidente Donald Trump, Milei disse que o Banco Central da Argentina deveria ser extinto.

Com 52 anos, o extremista conseguiu passar as (cada vez mais) tradicionais da extrema-direita, segundo as quais as mudanças climáticas não passam de uma mentira dos poderes mundiais organizados, a educação sexual nas escolas são uma manobra para destruir a família e a posse de armas deve ser incentivada.

Segundo os analistas, a vitória de Milei pode alavancar as propostas extremistas e gerar um movimento para afastar os políticos tradicionais do poder central.

Na principal coligação da oposição conservadora, o Juntos pela Mudança, os eleitores também deram, a vitória à fação mais à direita, protagonizada pela ex-ministra da Segurança Patricia Bullrich, venceu com facilidade o candidato mais centrista, o presidente da câmara de Buenos Aires, Horacio Rodríguez Larreta.

Na coligação do governo, a União pela Pátria, e como era esperado, o ministro da Economia, Sergio Massa, tornou-se o candidato presidencial, derrotando facilmente o mais esquerdista Juan Grabois. “Temos 60 dias para virar as eleições", disse Massa, citado pelos jornais.

A participação nas primárias do passado domingo ficou abaixo de 70%, a mais baixa desde que começaram a ser realizadas, há mais de uma década.

Quem vencer em 22 de outubro (ou mais provavelmente na segunda volta em novembro, terá grandes decisões a tomar sobre a reconstrução das reservas internacionais esgotadas, o aumento das exportações de cereais, o controlo da inflação e a política cambial.