As sociedades de advogados têm de fazer o seu caminho na sustentabilidade social, ambiental e de governação (critérios ESG) sob pena de não conseguirem ser boas assessoras para as empresas neste processo e de ficarem com a credibilidade posta em causa. Esta foi uma das posições defendidas pelos oradores da conferência online “Digitalização, sustentabilidade e talento: três desafios da advocacia para 2022”, organizada pelo Jornal Económico (JE), no âmbito da publicação do mais recente anuário “Quem é Quem na Advocacia de Negócios em Portugal”.
O trabalho dos escritórios em prol das sociedades e do combate às alterações climáticas pode ser feito com o cálculo da pegada carbónica, a eletrificação dos transportes que os advogados usam diariamente, a redução do papel, entre outras medidas, conforme sugeriram os advogados neste debate que contou com a moderação de Filipe Alves, diretor do JE.
Paulo Câmara, managing partner da Sérvulo & Associados, considera que as empresas verdes “têm de estar” consciencializadas para a importância das finanças verdes, até porque este tema é civilizacional e obrigará os privados a chegarem-se à frente. “Em termos do grau de preparação há boas e más notícias. As más notícias é que ainda há o tema da literacia ESG. Se virmos em termos globais, é muito importante que o grau de literacia seja simétrico. Às vezes certas transformações mais estruturais são adiadas para outro mandado ou sente-se uma grande clivagem entre as empresas que estão pressionadas pelos investidores e stakeholders e as PME. As boas notícias é que há bons exemplos com efeito de contágio”, explicou.
A associada sénior da Miranda & Associados Catarina Santinha destacou que a sustentabilidade nas organizações também envolve a responsabilidade social corporativa ou a promoção do equilíbrio entre a vida pessoal e profissional dos trabalhadores, que são temas estruturais. “Não é nada uma coisa para inglês ver. Há uns anos, a London School of Economics fez um estudo para perceber como as empresas no Reino Unido se adaptavam a políticas de sustentabilidade. As conclusões foram engraçadíssimas, porque chegaram a um lugar-comum: era um dever moral e ético de quem as liderava”, exemplificou a advogada nesta sessão que foi emitida na JE TV a 3 de dezembro.
Maria Figueiredo, da CMS Rui Pena & Arnaut (CMS RPA), avançou que 15% das receitas globais desta sociedade global deverão advir de matérias ESG (Environmental, Social & Governance) nos próximos anos. “É uma área com um grande potencial de crescimento”, assegurou, salvaguardando que este também tem de ser um processo interno, através do diagnóstico de certificação B Corp, por exemplo. “Temos feito um percurso de sustentabilidade do qual eu destacaria dois projetos de 2021, que fizemos em parceria com startups, com o uso de bicicletas e motas elétricas com trabalhadores e a inauguração do Green Lounge, um rooftop verde. A diversidade de experiências que uma rede internacional nos oferece é muito rica”, detalhou sobre a CMS RPA.
Segundo João Quintela Cavaleiro, sócio fundador da Cavaleiro & Associados, já não é só às grandes empresas que o tema da sustentabilidade chega. A seu ver, a situação pandémica impeliu a mudança de mentalidades neste campo, o que se reflete também nas operações de fusões e aquisições, uma vez que o comprador está atento à inovação e à preocupação ambiental quando fecha negócios. “Se o líder vir a empresa numa visão clássica, em que é puramente para obtenção de rendimento de capital, estas matérias vão ser os últimos investimentos. Naqueles que acreditam no seu negócio há a visão de que este é um vetor no qual têm de apostar”, alertou o jurista, sublinhando que os critérios ESG estão no ADN desta boutique do Porto, uma vez que nasceu com foco na energia, no ambiente e nos recursos naturais nas regiões do Norte e Centro.
A transformação digital foi outro dos temas abordados nesta sessão. Para Mónica Duque, assistente convidada da Faculdade Direito da Universidade Católica do Porto, a tecnologia vai mudar “radicalmente” quer o próprio Direito quer o exercício da profissão, pelo que se deveria introduzir como obrigatórios conteúdos tecnológicos nas licenciaturas, como conhecimento geral de base e não de especialização. “Nas maiores sociedades de advogados de Portugal já se trabalha com ferramentas tecnológicas muito avançadas e algoritmos de inteligência artificial”, advertiu, explicando que na formação de juristas que vão exercer advocacia ou envergar pela carreira de juízes ou consultoria legal normalmente não há matérias técnicas desta natureza. “É verdade que os conteúdos relativos à proteção de dados e privacidade, cibersegurança e cibercrime, geoestratégica e guerras assimétricas e atípicas ou inteligência artificial são considerados de especialização e é assim que são tratados nas nossas ofertas formativas”, defendeu a professora académica.