Maria Tolentino, country director da Too Good To Go Portugal, empresa que criou uma aplicação de mercado com o objetivo de combater o desperdício alimentar, considera que é "imperativo fazer mais" no quadro do combate ao desperdício alimentar, nomeadamente ao nível legislativo. A "introdução de incentivos fiscais para as empresas" são, neste sentido, uma opção.
Em entrevista ao Jornal Económico, Maria Tolentino defende que a questão do desperdício deve "estar na agenda política" e "ser tratada com a devida importância", apontando para Itália, França e Espanha como exemplos de países que olham para o tema como premente. Desde 2022 que nos restaurantes do país vizinho é obrigatório avisar os clientes que podem levar os restos. Ainda segundo a legislação espanhola, as multas por deitar comida fora podem chegar aos 60 mil euros.
"Portugal também tem que assumir este tema como prioritário. Por exemplo, adotar uma lei com objetivos de redução do desperdício alimentar em cada fase da cadeia alimentar e um sistema de medição contínuo, enquanto introduz incentivos fiscais para as organizações e empresas que apliquem medidas estratégicas contra o desperdício alimentar", diz ao JE a mesma responsável.
Recordando a "estratégia de combate, num esforço concertado" da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (CNCDA) criada em 2016, Maria Tolentino defende que "é imperativo fazer mais, sobretudo num contexto onde ainda há muito espaço de melhoria".
A Too Good To Go tem, nesse campo, um papel de influência, ao assumir "uma posição muito ativa no esforço de colocar este tema na agenda política dos partidos políticos portugueses".
"Ajudamo-los a encontrar soluções legislativas, que permitam a Portugal responder aos desafios atuais, à necessidade de encontrarmos resposta a um problema, que não se cinge à componente económica, mas também a uma estratégia de sustentabilidade o mais transversal possível", explica.
A country director da Too Good To Go Portugal espera que a lei contra o desperdício alimentar, que se encontrava em agenda no Parlamento, volte a estar em discussão.
"Na Too Good To Go, acreditamos que é necessária uma lei que dê prioridade a este problema por toda a comunidade, e que apoie novos hábitos de consumo, aspetos essenciais para cumprir a Agenda 2030 e o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 12.3 [Até 2030, reduzir para metade, à escala global, o desperdício de alimentos per capita, tanto a nível de retalhistas como de consumidores, e reduzir os desperdícios de alimentos ao longo das cadeias de produção e abastecimento, incluindo os que ocorrem pós-colheita]", reforça.
Passando à atividade da Too Good To Go, a responsável nota "um grande crescimento quanto à adesão dos portugueses à iniciativa, refletido no aumento em mais de 29% dos utilizadores em 2023, relativamente ao ano anterior".
No ano passado, a plataforma registou mais de 1,5 milhões de 'Surprise Bags' salvas em Portugal, uma subida homóloga de 32%.
"Acreditamos que este crescimento é um reflexo de uma maior consciência da sociedade para aquilo que representa o desperdício alimentar", analisa.
Em termos de parceiros, a Too Good To Go registou em 2023 uma subida de 20,8% no número de lojas que aderiram à iniciativa face ao ano anterior.
"Em apenas sete anos, a nossa aplicação Too Good To Go evoluiu, de uma solução digital, para se tornar num parceiro na estratégia de gestão da operação e de sustentabilidade de grandes empresas alimentares. Esta evolução reflete-se na dimensão que alcançamos. Ao dia de hoje colaboramos com 155.000 parceiros de negócios e 85 milhões de utilizadores registados nos 17 países onde estamos a lutar contra o desperdício alimentar. Tudo isto resulta em mais de 300 milhões de 'Surprise Bags' salvas, à escala global", explica Maria Tolentino.
De acordo com números da Too Good To Go, o desperdício alimentar tem um custo de 3,36 mil milhões de euros por ano para a população em Portugal. Em causa está uma perda mensal de 28 euros, em média, um valor que sobe para 33 euros junto dos jovens entre os 18 e 24 anos. O estudo da plataforma reporta "uma média anual de 336 euros perdidos em más práticas de gestão alimentar".