Quase seis meses depois do lançamento do Pacto Social – que serviu de mote ao posicionamento de Armindo Monteiro quando ascendeu à liderança da CIP e que foi também um momento de rutura – e a poucos dias do início da campanha eleitoral para as legislativas de 10 de março, um balanço do seu impacto já é possível. Em entrevista ao JE, Armindo Monteiro diz que muito do que foi dito em setembro está a fazer um caminho virtuoso.
Que feedback teve do lançamento do Pacto Social há meio ano atrás?
Um dos principais é que vemos muitas medidas do Pacto Social nos vários programas de governo de diversos partidos. O 15º mês, isenção de IRS para os mais jovens, um tema em que ninguém falava – o crédito fiscal para o investimento, um instrumento de internacionalização e não apenas de exportação – é diferente enviar um contentor ou ter uma presença externa. E, claro, a questão do IRC: ninguém se atrevia a falar do IRC nem da sua redução – vários programas o mencionam. Como acontece com o IRS: uma redução assinalada por todos os partidos. Eu diria que muitas das 30 medidas do Pacto Social estão dispersas por vários programas. E todos eles reconhecem que foram de facto inspiradas no Pacto Social.
Estava à espera disso?
Podia ter sido diferente. Quando preparávamos as negociações com o Governo, se nessa altura todos tivessem convergido – se não tivesse havido aquela coisa muito portuguesa sobre quem é que fica na fotografia, a pequena vaidade – se todos os parceiros sociais tivessem aderido a estas medidas, teria sido diferente.
Compreendeu as reticências de alguns dos parceiros?
A parte sindical não ter apoiado com veemência um 15º mês sem tributação – que não tinha a ver com o aumento salarial, que já estava negociado, estamos a falar de um bónus que as empresas poderiam distribuir junto dos trabalhadores até aos 7,2%, o 15º mês – não se percebe. Uma outra medida, a distribuição de dividendos, também não vimos adesão da parte dos sindicatos. Porquê? Porque eram medidas que, apesar de boas, estavam a vir do ‘lado negro da força’ que é a posição que se atribui à confederação patronal, aos empresários, como se os sindicatos tivessem o exclusivo do bem-estar dos trabalhadores. Não é verdade: nos nas empresas percebemos que é fundamental haver um equilíbrio – aquilo que dizemos sempre. Queremos uma economia competitiva e a crescer, mas sem ignorar que é necessário um Estado social. O que não queremos é como ouvimos um membro do atual Governo dizer, com uma certa vaidade, que o assistencialismo do Estado já chegava a 61% dos portugueses.
Se chegasse só a 10% era, em princípio, melhor.
Eu gostaria que chegasse àqueles que é necessário, que esses fossem intensamente apoiados, mas que não houvesse o objetivo de chegar a 100%. Quase parece um desígnio nacional que o assistencialismo do Estado chegue aos 100%. Não: deve chegar onde for necessário e apoiar que precisa. Esta ideia de criação desta dependência, de subsídio-dependência, seja de pessoas seja de empresas, não estamos de acordo.
Que impacto teve o Pacto Social nos empresários?
Também despertámos consciências. Estamos a transformar a nossa economia em mais empresários e gestores e em menos patrões. E este ponto é absolutamente importante: a transformação da economia também acontece por aí: por uma consciência social, por um sentido de exigência para fazerem crescer os seus projetos empresariais. Para que possam pagar bons salários e sobretudo apresentar projetos de vida. A centralidade do trabalho já vinha mudando, mas aconteceu principalmente com a pandemia e tem de ser conquistada: as pessoas precisam de mais que o salário, precisam do salário emocional, de projetos que as incentivem, que as motive, que as estimule. E isso é também uma obrigação do líder empresarial, que não pode pagar apenas com os euros. Tem também que pagar com um projeto de vida – desde logo para os mais novos. Porque é que os mais novos saem do país? Não é pela perspetiva de terem um salário, é pela perspetiva de não deixarem de ter um salário.
Tem alguma esperança que até final de 2024 seja possível implementar tudo o que passou do Pacto Social para os programas dos partidos?
Tenho uma séria esperança que, em função daquilo que aconteça nas eleições de março, que possa haver um compromisso sério de colocar na agenda económica muitos dos desafios que nós construímos no Pacto Social. Tenho uma firme esperança, diria mesmo a convicção, que o novo governo vai reconhecer estas valias, coisa que infelizmente o Governo atual não fez.
Já tem uma carta escrita ao próximo ministro da Economia, só lhe faltando saber a quem a endereçar?
Absolutamente. A carta está escrita, chama-se Pacto Social e tão depressa seja conhecido o nome do ministro, a CIP apresentar-se-á de novo com firmeza, porque achamos que é um desígnio. Esta geração tem obrigação de fazer isto pelo país: falta completar o terceiro D, de desenvolvimento – fizemos a democratização, fizemos a descolonização, mas o desenvolvimento económico não está a acontecer. Fazemos parte da Europa, uma economia de primeira divisão, mas não podemos pertencer a uma União Europeia apenas por um critério geográfico. Temos de estar na União Europeia por termos um crescimento e uma sustentação económica que nos permita estar na Europa.