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Regulamentação do lobby é “essencial à democracia”

Melhoria da qualidade da participação, transparência e responsabilização públicas, canalização adequada dos interesses público-privados. São estes, segundo Maria Rosa Rotondo, presidente da PACE, os objetivos que tornam a regulamentação do lobbying uma emergência.

Em cima de uma crise política que tem muito a ver com o assunto, a regulamentação do lobbying – um tema que está na ordem do dia há décadas mas que em Portugal não mereceu nunca a devida atenção – ou a atenção suficiente para sobre ele surgir legislação – é um instrumento que aumenta a estrutura de balanço dos poderes nas democracias. É essa a posição de Maria Rosa Rotondo, presidente da Public Affairs Communiti of Europe (PACE) – uma federação de associações ou outros membros que trabalha no sentido de dar a entender a urgência e a necessidade de enquadrar dentro de regras bem definidas um tipo de atuação que, sem elas, resvala demasiadas vezes para a opacidade. O caso da vice-presidente do Parlamento Europeu Eva Kaili (de dezembro de 2022) mas principalmente o de Diogo Lacerda Machado, o amigo do primeiro-ministro que cada vez os conta em menor número, voltou a colocar o assunto no topo da agenda política.

São estes assuntos que estarão em debate esta quarta-feira, na FLAD, a partir de meio da tarde, com a participação de Rita Sarrabulho, Cecília Meireles, João Maria Condeixa (num debate moderado pelo diretor do JE, Filipe Alves) e António Martins da Costa, para além da própria Maria Rosa Rotondo.

 

Qual é a sua posição sobre a regulamentação do lobbying?

Maria Rosa Rotondo: Na PACE apoiamos ativamente todas as associações nacionais que exortam os seus governos a regulamentar o lobby porque acreditamos que é um elemento essencial do processo de participação democrática. Apoiamos também o trabalho de organizações internacionais (OCDE, Conselho da Europa) que seguem esta linha. A regulamentação do lobbying, ou por outras palavras, a regulamentação da participação da sociedade civil nos assuntos públicos, é uma questão cada vez mais relevante em todos os países democráticos. Se bem feito, pode por si só trazer enormes vantagens: melhoria da qualidade da participação, transparência e responsabilização dos poderes públicos, canalização adequada dos interesses público-privados, entre outros. Estes são elementos cada vez mais valorizados tanto pelas instituições europeias (Relatórios sobre o Estado de Direito, GRECO) como pelos investidores privados.

 

A regulamentação europeia é eficaz? Ou a dos Estados Unidos é mais eficaz?

No PACE, somos a favor da regulamentação europeia (UE) porque, apesar das diferenças, está mais próxima dos modelos políticos dos Estados-membros, enquanto nos Estados Unidos o sistema político contém elementos (democracia direta, sistema bipartidário, política de financiamento) que torna tudo muito diferente. Nos Estados Unidos, prevalece um modelo declarativo, com amplas exceções, que pessoalmente considero demasiado frouxa. Na UE, a regulamentação estabelece um equilíbrio entre as obrigações e os direitos dos lobistas que, sem ser perfeito, ajuda a promover a participação e a identificar problemas quando estes existem. Contudo, a organização cujo trabalho para mim é mais extenso e sério é a da OCDE.

 

 Quais são os perigos para um país como Portugal, onde não há regulamentação?

Pois bem, como se viu, o principal risco é o da corrupção, que na ausência de transparência, permite que condutas que se desenvolvem na opacidade acabem nos tribunais de justiça. Mas não só isso, pode prejudicar o país na hora de receber recursos e as empresas nacionais de se financiarem nos mercados internacionais. Não há correlação direta, mas como sabemos, os investidores colocaram uma lupa nos critérios ESG [Governança ambiental, social e corporativa] e a regulamentação de lobbies ou códigos de conduta privados (em termos de regulação) fazem parte do G (Governança) que requer atenção especial.

 

É adequado regular durante uma crise, como pode vir a acontecer em Portugal?

Bem, não é o melhor. O mais importante é que a regulamentação dos lobbies seja coerente com o seu objetivo, que é fazer leis melhores, tornar mais transparente a relação entre os poderes públicos e a sociedade civil. Uma regulamentação destinada a prevenir a corrupção (cujo âmbito de regulação é o Código Penal) não alcançará esse objetivo, mas criará um quadro baseado na perceção negativa e não servirá os propósitos acima mencionados.